Até pouco tempo atrás, a cidade de Pedreiras, no interior do Maranhão, Nordeste do Brasil, não tinha jornal, emissora de rádio ou site de notícias local.
Conhecida como a terra natal do saudoso sambista João do Vale, Pedreiras também era um “deserto de notícias” — um lugar sem a presença do jornalismo local.
Isso mudou em 2020, quando quatro jornalistas locais criaram o site de notícias O Pedreirense, que publica reportagens investigativas, colunas de opinião e entrevistas em vídeo. Eles são um dos veículos digitais no Brasil que estão transformando suas regiões de desertos de notícias em oásis de informação.
“Nós tentamos dar maior destaque às populações locais em nossas reportagens”, disse Joaquim Cantanhêde, editor-executivo de O Pedreirense, à LatAm Journalism Review (LJR).
Jornalista Mayrla Frazão entrevista Diocina Lopes dos Reis para O Pedreirense. (Foto: Cortesia O Pedreirense)
O Nordeste é a região do país com o maior número de desertos de notícias, segundo o censo do jornalismo Atlas da Notícia, divulgado em julho. Nove a cada 20 municípios são desertos de notícias, o que significa que quase 21 milhões de pessoas no Brasil não têm acesso a informações sobre sua região que tenham sido verificadas jornalisticamente.
A maioria dos veículos que estão enfrentando essa realidade são pequenos e exclusivamente online. O Pedreirense opera com apenas três profissionais que se sustentam por meio de bolsas e contratos de prestação de serviços, segundo Cantanhêde.
“Quando começamos, queríamos fazer uma produção mais baseada em fatos, o que exige um volume alto de trabalho”, afirmou. “Hoje, decidimos o que vamos cobrir de forma mais estratégica.”
Os desafios do jornalismo em cidades pequenas
A cidade de Angicos, no estado nordestino do Rio Grande do Norte, ficou conhecida em todo o Brasil em 1963, quando o educador Paulo Freire realizou um experimento ensinando 300 pessoas a ler em apenas 40 horas. Mas Angicos, com seus 12 mil habitantes, era considerado um deserto de notícias até este ano.
Leonardo Ribeiro, que coordena o portal Angicos Notícias, explica que conseguiu ampliar a distribuição de conteúdo por meio de parcerias com redes de rádio locais. “Começamos pequenos e nos consolidamos como a maior iniciativa de notícias na região central do estado, que abrange 11 municípios,” disse. Hoje, a equipe conta com oito funcionários, incluindo cinco colunistas.
Além de encontrar maneiras de alcançar o público potencial, o jornalismo local precisa de um bom conteúdo para se tornar relevante. E boas histórias podem ser encontradas em qualquer lugar, segundo Ribeiro.
“Cabe ao jornalista ter um instinto aguçado para identificar oportunidades de pauta,” afirmou. “É preciso ter vontade de descobrir. Em toda cidade há furos de reportagem, seja por conta de obras públicas importantes, ações ruins do governo ou a ausência de ações que prejudicam a população.”
Uma antiga estação ferroviária em Angicos, cidade do Rio Grande do Norte, que, até pouco tempo, era considerada um deserto de notícias. (GLandovsky, CC BY-SA 4.0, via Wikimedia Commons)
Embora os grandes conglomerados de mídia brasileiros estejam localizados nas capitais do Sudeste, essa região tem a maior proporção de desertos de notícias em relação ao número de municípios (49,76%), segundo o Atlas da Notícia. No estado de São Paulo, o jornalista Eduardo Fálico administra o Portal da Cidade, na cidade de Bady Bassit, que também saiu da lista de desertos de notícias este ano.
Quando chegou à cidade, há quase dois anos, os cerca de 27 mil habitantes não tinham um veículo de notícias local há quase uma década. Hoje, a equipe do site — três pessoas, incluindo Fálico, um estagiário e um vendedor — trabalha duro para oferecer cobertura diária sobre política, saúde e serviços públicos.
“O maior desafio é existir como veículo de notícias em um lugar onde as pessoas e as autoridades não estão acostumadas com a presença do jornalismo,” disse Fálico.
“Conhecer seu público é fundamental”
Produzir jornalismo não é suficiente para manter um veículo de notícias vivo. É necessário encontrar fontes de financiamento que permitam manter as operações e também crescer.
Uma pesquisa do projeto Mais pelo Jornalismo revelou em março de 2025 que mais de 2.000 veículos de notícias fecharam no Brasil desde 2014. O censo do Atlas da Notícia também mostrou que, embora a mídia digital esteja crescendo, ela não está imune à crise que afeta o jornalismo globalmente. Pelo menos 651 veículos online registrados no estudo já fecharam, incluindo 334 entre 2023 e 2025.
“Fazemos um trabalho útil para a comunidade. O principal desafio é a monetização,” disse Fálico, do Portal da Cidade. “Tivemos que fazer um grande trabalho de educação junto aos anunciantes locais sobre a importância do jornalismo para conseguir apoio. Claro, o sonho de todo jornalista é não depender de dinheiro público, mas acaba sendo um caminho para a estabilidade.”
Cantanhêde afirmou que foi necessário oferecer serviços de consultoria, como assessoria de imprensa, como forma de garantir a sustentabilidade financeira do veículo. “Sempre fazemos isso com o maior cuidado para que isso não interfira na independência editorial do nosso jornalismo,” disse.
Em termos de distribuição de conteúdo, as redes sociais ajudam a engajar o público, mas Cantanhêde, de O Pedreirense, acredita que é importante ir além dos algoritmos.“Para fazer jornalismo local, você precisa conhecer muito bem seu público", explicou. “É um público ávido e dinâmico. É necessário manter um envolvimento real com a comunidade e participar dos eventos e programas da sua cidade.”
Mariama Correia é jornalista e coordena a pesquisa do Atlas da Notícia no Nordeste do Brasil.