Quase um terço das redações na Argentina estão usando ferramentas de inteligência artificial para executar tarefas rotineiras, de acordo com um estudo publicado este mês pela Associação de Entidades Jornalísticas Argentinas, conhecida como Adepa.
O relatório, com base em 20 entrevistas com profissionais da mídia, constatou que 29% dos veículos participantes usam IA para ajudar a escrever e editar matérias, criar manchetes e traduzir textos. Cerca de 38% a utilizam para transcrever entrevistas e 40% para produzir versões em áudio ou resumos de matérias, em alguns casos com uma voz que imita a do autor.
O estudo descobriu que a maioria dos entrevistados raramente usa ferramentas de geração de imagens com tecnologia de IA devido a questões éticas e de propriedade intelectual.
A equipe de pesquisa comparou suas descobertas com diretrizes e princípios de organizações como The New York Times, The Guardian, O Globo, a Sociedade Interamericana de Imprensa e a UNESCO.
"Os meios de comunicação argentinos estão na vanguarda, pelo menos na região, em termos de adoção e inclusão de ferramentas de inteligência artificial em seus processos de trabalho e produção de notícias", disse Agustina Ordoñez, uma das autoras do relatório, à LatAm Journalism Review (LJR).
Entre os exemplos mais inovadores de adoção tecnológica estão Clarín, Infobae, La Nación e Todo Jujuy, segundo o relatório.
O Clarín desenvolveu UalterAI, um assistente virtual que resume matérias e identifica dados e números importantes. A Infobae criou ScribNews, projetado para ajudar sua equipe a automatizar partes do processo de coleta e produção de notícias. O La Nación lançou o Voces, que permite ouvir matérias nas vozes geradas por IA de seus próprios jornalistas.
O veículo de verificação Chequeado desenvolveu Desgrabador, uma ferramenta de transcrição gratuita.
E o veículo local Todo Jujuy está usando IA para automatizar matérias sobre trânsito, clima e esportes.
"São veículos de comunicação que, tanto em nível nacional quanto regional, estão apresentando ferramentas inovadoras", disse Ordoñez. "Eles estão adotando tecnologias existentes para aprimorar suas rotinas de trabalho e os canais de produção de conteúdo de qualidade."
De acordo com o estudo, o governo argentino não regulamenta como as plataformas de inteligência artificial utilizam o conteúdo produzido pelos veículos de comunicação. Também não há acordos independentes entre os veículos de comunicação argentinos e as plataformas de IA, ao contrário de diversas organizações jornalísticas nos Estados Unidos e na Europa, que já começaram a negociar licenças.
Os pesquisadores alertaram que essa falta de regulamentação pode dificultar a monetização do trabalho dos meios de comunicação argentinos e aumentar o desequilíbrio de poder entre a mídia local e as grandes empresas de tecnologia.
Andrés D'Alessandro, diretor executivo da Adepa, disse à LJR que a organização acredita que as empresas de IA devem reconhecer e compensar os veículos de comunicação por seu conteúdo.
"Tanto nas etapas de treinamento das ferramentas quanto no seu uso diário, quando a IA fornece aos usuários respostas baseadas em conteúdo jornalístico, deve haver um mecanismo de reconhecimento e compensação", afirmou.
Segundo D'Alessandro, conteúdo de qualidade exige investimento em jornalistas, equipamentos e infraestrutura. "Se as ferramentas de inteligência artificial se alimentam desse trabalho, é justo que haja um sistema de compensação financeira e transparência no uso desses materiais", disse ele.
Padrões que colocam as pessoas em primeiro lugar
No relatório, a Adepa pede que os meios de comunicação argentinos desenvolvam seus próprios protocolos para uso de inteligência artificial em redações, semelhantes aos manuais de estilo tradicionais.
O relatório enfatiza princípios-chave como garantir a supervisão humana no trabalho assistido por IA, proteger a propriedade intelectual, manter a transparência com o público e promover treinamento contínuo para jornalistas.
O relatório também destaca que a IA deve aprimorar, não substituir, as capacidades humanas.
"O objetivo principal da IA deve ser ampliar a inteligência humana e melhorar a vida das pessoas", afirma. "As empresas devem desenvolver e implementar a IA onde os benefícios superem os riscos previsíveis. A IA deve ser usada para resolver problemas do mundo real, impulsionar o progresso econômico e fomentar a inovação."