Por Larissa Manescu
A Corte Interamericana de Direitos Humanos, entidade judiciária autônoma da Organização de Estados Americanos, decidiu pela primeira vez que uma condenação penal por difamação não afeta a liberdade de expressão, em um julgamento sem precedentes que o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) qualificou como um sério retrocesso para a região.
O caso da controversa decisão teve origem em 1990, quando Carlos e Pablo Mémoli, diretores do pequeno diário La Libertad, denunciaram irregularidades na venda de jazigos públicos no cemitério da cidade por parte de uma sociedade mutuária.
A mutuária denunciou penalmente Carlos e Pablo Mémoli por difamação, que foram considerados culpados e receberam em 1994 penas de prisão suspensas por cinco e um mês, respectivamente.
Pai e filho levaram o caso à Corte Interamericana após esgotar todas as instâncias judiciais de seu país. Contudo, duas semanas atrás, em um julgamento dividido por 4 a 3, a Corte decidiu que a sentença dos Mémoli não havia violado a liberdade de expressão. Além disso, decidiu que de agora em diante as opiniões podem estar sujeitas a sanções ulteriores e que as irregularidades no uso de bens públicos - jazigos de um cemitério público, no caso dos Mémoli - não representam um tema de interesse público.
CPJ lamentou a decisão, argumentando que anteriormente "a mesma Corte havia estabelecido que as leis de difamação argentinas utilizadas para condenar os diretores eram incompatíveis com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos".
A polêmica desta decisão é que a Corte emitiu um julgamento distinto em 2008, quando anulou a condenação penal por difamação que o jornalista argentino Eduardo Kimel recebeu em 1999. O caso de Kimel começou a partir da publicação de seu livro Masacre en San Patricio, no qual questionou a investigação da morte de cinco sacerdotes em 1976, durante a ditadura militar.
José Miguel Vivanco, diretor-executivo da divisão para as Américas de Human Rights Watch, também condenou o julgamento da Corte contra os Mémoli em um artigo de opinião publicado no La Nación.
"Em uma região onde a debilidade institucional é a norma, este gravíssimo retrocesso não só vulnera direitos e liberdades fundamentais, como também dificulta a luta contra a corrupção", sustentou Vivanco.
Apesar da decisão da Corte, CPJ disse não acreditar que o julgamento seja um precedente capaz de afetar as decisões de outros casos das Américas relacionados a questionamentos a funcionários públicos.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog Jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.