Uma plataforma recém-lançada busca conectar profissionais da comunicação e especialistas da Amazônia brasileira a jornalistas e meios de outras regiões. Com um banco de fontes e um banco de comunicadores freelancers baseados nos nove estados amazônicos, Amazônia Vox possibilita que histórias sobre a floresta e a região sejam contadas a partir do território, gerando visibilidade e oportunidade para profissionais e perspectivas amazônidas.
Daniel Nardin, jornalista e fundador da Amazônia Vox, disse à LatAm Journalism Review (LJR) que sempre se colocou como fonte de contatos na Amazônia para jornalistas de outras regiões. Nardin se formou, trabalha e vive em Belém, no estado amazônico do Pará, mas viveu um período em Brasília, onde trabalhou como assessor parlamentar.
“Nós, jornalistas, somos sobretudo colegas, então sempre me coloquei à disposição dos jornalistas com quem tinha contato em Brasília dizendo ‘se precisar de qualquer coisa daqui do Pará, me avisa que eu te passo’. Eu sempre quebrava um galho e passava os contatos quando algum colega precisava de alguém que falasse sobre determinado assunto, ou quando alguém me dizia ‘Daniel, preciso de um fotógrafo em Alter do Chão’ [distrito de Santarém, no Pará], por exemplo”, contou ele.
A rede de contatos cultivada ao longo de sua carreira e o atual foco global na Amazônia foram algumas das motivações para Nardin desenvolver a Amazônia Vox, a partir de um desejo de fazer algo “propositivo”, disse ele.
“Acredito que existe uma boa fé e uma intenção de jornalistas de fora da Amazônia em conhecer mais pesquisadores e fontes daqui, só que o contato não é tão simples, são pessoas que não são tão conhecidas. Então pensei ‘e se tiver um lugar que consiga reunir essas pessoas, essa base de conhecimento, com certa facilidade, para que jornalistas consigam acessar?’ Sabemos que a agenda do jornalista é tudo, só que nem todo mundo tem essa agenda”, observou.
A versão beta do site da plataforma está no ar desde o fim de junho, com formulários abertos para que profissionais de comunicação e especialistas de áreas diversas do conhecimento se cadastrem para figurar no banco de freelancers e fontes.
Até o momento, há 332 comunicadores freelancers e 598 fontes cadastradas, de todos os estados da Amazônia brasileira, disse Nardin. Ele explicou que, além do autocadastro, cerca de 60% das fontes foram cadastradas pela equipe da Amazônia Vox. Eles realizaram uma busca ativa em sites de universidades e outras instituições da região para encontrar especialistas sobre diversos temas e incluir seus dados, que já estavam públicos em outros sites, no banco de dados da plataforma.
Nardin convidou jornalistas de nove estados da Amazônia para serem “embaixadores” da Amazônia Vox em cada estado. Eles têm trabalhado na divulgação da plataforma para que mais profissionais e especialistas conheçam o projeto e se cadastrem. E também para que mais jornalistas e meios de comunicação conheçam a plataforma e encontrem fontes e profissionais freelancers na Amazônia.
O lançamento oficial da Amazônia Vox aconteceu durante os Diálogos Amazônicos, evento que antecedeu a Cúpula da Amazônia, que aconteceu em Belém no começo de agosto. Durante a Cúpula, Nardin soube de pessoas que indicaram a plataforma para colegas que buscavam freelancers na região e também de profissionais que foram contratados após seu contato ter sido encontrado na Amazônia Vox.
“Tem um grupo no WhatsApp de jornalistas que foram para a COP [Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 27, que aconteceu no Egito] no ano passado, um grupo de jornalistas que trabalham na área ambiental. Uma pessoa escreveu ‘gente, tô precisando urgente de um fotógrafo em Belém’. Outra pessoa, que também não conheço, respondeu ‘olha, eu entrei nesse site aqui [da Amazônia Vox] e encontrei’. Quando vi isso acontecer, pensei ‘pronto, tá dando certo’. E vários colegas falaram comigo lá, durante a Cúpula: ‘obrigado, Daniel, pela indicação’. Respondi ‘ué, eu indiquei?’ ‘É que a pessoa pegou meu contato na Amazônia Vox’”, contou ele.
Para além do Brasil, a Amazônia abrange outros sete países: Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Venezuela e Suriname. Nardin disse que gostaria de tornar Amazônia Vox uma plataforma panamazônica, mas que primeiro pretende consolidá-la entre os amazônidas brasileiros. Ele também pretende traduzir a plataforma para inglês até o fim deste ano, ampliando o alcance do projeto para atender ao interesse global na Amazônia.
Além dos bancos de fontes e de freelancers, Amazônia Vox também vai produzir e publicar conteúdo jornalístico a partir da e sobre a Amazônia. Nardin realizou recentemente uma formação em jornalismo de soluções com a Solutions Journalism Network (SJN) e se tornou professor certificado pela SJN. Ele pretende aplicar essa abordagem nas reportagens produzidas pela Amazônia Vox e destacar como as populações amazônicas têm desenvolvido soluções para os problemas que enfrentam.
A intenção é tornar a Amazônia Vox “uma referência no Brasil sobre jornalismo de soluções a partir da Amazônia”, disse Nardin. A primeira reportagem, que será publicada ainda neste mês, será sobre o combate à desinformação sobre mudanças climáticas na Amazônia. Em outubro, será publicada uma investigação sobre a assistência pré-natal na região, e em novembro, um especial sobre bioeconomia.
As reportagens serão produzidas por profissionais freelancers cujos contatos estão disponíveis na plataforma, para que sejam também uma vitrine do trabalho dos comunicadores, explicou Nardin.
Essas reportagens foram financiadas por grants de fundações internacionais, e essa é uma das estratégias de financiamento do projeto. O Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, na sigla em inglês) é um dos parceiros institucionais no desenvolvimento da Amazônia Vox, por meio do Fórum Pamela Howard para Cobertura de Crises Globais.
Nardin salientou a importância do jornalismo de denúncia sobre os problemas que afetam a região amazônica, mas observou que essa é “uma parte da história”.
“Tem muita iniciativa local respondendo aos desafios locais. Ao dar visibilidade para isso, podemos mostrar que tem outras histórias aqui, que precisam de mais apoio para ganhar escala”, disse ele. “Aí começamos a trabalhar e defender a ideia de que sim, há uma série de problemas aqui, mas também tem uma série de soluções sendo desenvolvidas. Não dá para vir de fora com a ideia de ‘vamos resolver os problemas da Amazônia’. É melhor conhecer primeiro o que está sendo feito aqui e ver como melhorar”.
Imagem do banner: Bastidores de reportagem sobre pré-natal na Amazônia. (Daniel Nardin / Amazônia Vox)