A Comissão Permanente do Congresso peruano está avaliando um novo projeto de lei que tenta restringir a publicidade estatal somente para meios de comunicação nacionais e redes sociais. A mídia privada já não receberia publicidade estatal.
O projeto de lei 2133, apresentado pelo congressista Mauricio Mulder, da Aliança Revolucionária Popular Americana (APRA), pretende controlar os gastos do Poder Executivo em relação à publicidade estatal, a fim de otimizar o gasto de recursos. O propósito da norma, segundo seu autor, é que os gastos do Estado sempre sejam para o benefício do país e não para servir interesses políticos particulares, publicou El Comercio.
"Somos representantes do povo e devemos defender o dinheiro dos peruanos. Temos de exigir que este governo assegure que o dinheiro dos peruanos (...) seja para a saúde, a educação e os elementos de desenvolvimento, e não para esse tipo de coisa", disse Mulder, de acordo com El Comercio, referindo-se aos gastos de publicidade estatal realizados sob o atual governo do presidente Pedro Pablo Kuczynski diante de seus baixos índices de aprovação.
O projeto legislativo que deveria ter sido previamente avaliado por especialistas da comissão parlamentar do Ministério de Transportes e Comunicações não obteve nenhuma opinião dessa comissão porque o projeto foi exonerado de tal avaliação. O Conselho de Porta-vozes do Congresso aprovou que o projeto vá diretamente a ser avaliado pela Comissão Permanente do parlamento, e com isso sua aprovação poderia ser iminente, segundo um editorial de Peru21.
Várias organizações que defendem as liberdades da imprensa e de expressão, bem como representantes do governo, se pronunciaram contra o controverso projeto de lei do partido APRA.
O Conselho de Imprensa peruana (CPP), através de um comunicado de imprensa de 15 de janeiro dirigido ao presidente do Congresso, solicitou que o projeto de lei fosse arquivado por considerá-lo inadequado e desnecessário porque já existe uma lei que regula a publicidade estatal e que respeita os padrões internacionais. Em vez disso, o Conselho propôs a regulamentação da lei existente com base em "um debate aberto e transparente".
O CPP também criticou que o projeto de lei não tenha sido debatido na comissão habitual do Ministério de Transportes e Comunicações antes de ser avaliada pela Comissão Permanente do Congresso.
A este respeito, Mulder disse que o projeto não foi visto pela comissão de transportes e comunicações porque esta está bastante ocupada "com outros tipos de questões", informou AméricaTV. Ele afirmou que teria preferido que seu projeto fosse revisado pela Comissão de Orçamento e Economia, já que esse é o principal objetivo de sua proposta, que busca um maior controle sobre as despesas do Estado em relação à publicidade estatal.
A legislação vigente que regula a publicidade estatal, a Lei 28874, foi promulgada em 2006 pelo então presidente Alan García, fundador e líder do partido político a que Mulder pertence.
Para o Instituto de Imprensa e Sociedade (Ipys, na sigla em espanhol) do Peru, o projeto de lei ameaça o direito dos cidadãos à informação e à expressão ao propor o uso de proibições estatais que violam o Artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
O artigo 13 da Convenção estabelece que o direito à liberdade de pensamento e expressão não pode ser restringido por meio do abuso de controles oficiais sobre a mídia, que serve para divulgar informações, circular idéias e opiniões. Esses direitos, de acordo com o artigo, não podem estar sujeitos a censura prévia.
As entidades estatais, o comunicado de imprensa do IPYS enfatizou, devem usar os meios de comunicação que melhor atendem suas necessidades de comunicação, considerando o tipo de público e a diversidade que precisam alcançar. "Limitar essa publicidade aos meios de comunicação estatais e às redes sociais leva ao colapso e à violação dessa obrigação", que, segundo a Ipys, poderia criar um clima de desinformação "insustentável".
Em meados de novembro de 2017, após a apresentação do projeto de lei em questão, várias instituições do Estado expressaram seu desacordo com a proposta.
A este respeito, o titular da Defensoria do Povo, Walter Gutiérrez, disse que o projeto de lei estava mal proposto e que deveria ser reformulado, publicou El Comercio.
Gutiérrez afirmou que a legislação proposta implica sérias restrições ao direito de informação dos cidadãos, pois em grande parte do país, principalmente em áreas rurais e populares, eles continuam a usar o rádio e os jornais locais como único meio para se informar.
"Proibir que se utilize a mídia privada é um erro, e pretender que apenas se utilizem as redes sociais significa ignorar o que o INEI estabelece, que cerca de 40% da população não acessa a internet diariamente", disse Gutiérrez a El Comercio.
O presidente do Poder Judiciário, Duberlí Rodríguez, também não concordou com a norma que proíbe a publicidade estatal em meios de comunicação privados, porque não deveria haver restrições a esse respeito, publicou La República.
"Parece-me que isso não reflete a tradição do Peru, nem de nenhum país do mundo. (...) Se o Judiciário publicar comunicados de imprensa sobre o que estamos fazendo, não deve haver nenhum mecanismo que limite essa possibilidade", Disse Rodríguez, de acordo com La República.
Da mesma forma, quando o projeto de lei questionado foi apresentado no final de 2017, a Associação Interamericana de Imprensa (SIP) também rejeitou a iniciativa.
Roberto Rock, presidente do Comitê de Liberdade de Imprensa e Informação da SIP, disse que "com a aparente intenção de regular as despesas do Estado, essa proposta absurda prejudica o direito à livre concorrência". "O Estado deve oferecer aos meios de comunicação as condições para desenvolver seu trabalho sob leis que dão transparência aos critérios de alocação de publicidade", disse Rock.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.