A correspondente do jornal O Estado de S. Paulo em Washington, Cláudia Trevisan, foi detida na última quinta-feira, 26 de setembro, após tentar localizar o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, que fazia uma conferência na Universidade Yale, uma das mais prestigiadas dos Estados Unidos.
A jornalista foi algemada e mantida incomunicável por quase cinco horas, inicialmente dentro de um carro policial e depois em uma cela do distrito policial de New Haven, cidade onde fica a universidade, segundo o Terra. Sua liberação ocorreu apenas depois de sua autuação por "invasão de propriedade privada".
Em uma entrevista ao britânico The Guardian, Trevisan acusou a polícia universitária de agir de forma "extremamente violenta e desproporcional". Ela também reafirmou que não entrou escondido e não forçou a entrada ao local.
"Fui algemada tratada como uma criminosa, foi totalmente chocante. Para mim foi difícil de compreender e totalmente desnecessário. Isso é violência contra um jornalista tentando fazer seu trabalho", disse ao Guardian.
Trevisan é correspondente do Estadão em Washington desde o final de agosto e nos últimos cinco anos trabalhou na China. Ela conta que foi cobrir a visita do ministro à Universidade, onde participaria do Seminário Constitucionalismo Global 2013, e trocou e-mails com a assessora de imprensa da Escola de Direito da universidade, Janet Conroy, que a alertou que a imprensa não teria acesso ao evento.
Ela também havia conversado previamente, por telefone celular, com o próprio ministro Barbosa, a quem solicitou uma entrevista. Barbosa disse que não estava disposto a falar com a imprensa. A jornalista, então, informou o presidente do STF que o aguardaria e o abordaria do lado de fora do prédio, de acordo com o Estadão.
Barbosa tem se destacado por suas posições no julgamento do Mensalão, escândalo de corrupção envolvendo figuras públicas no Brasil e um dos tópicos mais comentados pela imprensa do país nos últimos meses. Sua presença no evento de Yale não foi divulgada no programa oficial. pr Ao ser informado sobre o incidente com a correspondente, o ministro lamentou a prisão já que a jornalista estava lá “apenas fazendo seu trabalho”.
Após a repercussão internacional que o caso ganhou, a Universidade publicou uma nota no último sábado, 28 de setembro, na qual argumenta que a prisão da jornalista foi "justificada” e afirma que não "planeja acionar a promotoria local" para pedir a abertura de uma ação penal contra Trevisan.
Assinado pelo secretário de imprensa, Tom Conroy, o comunicado alega que Yale reafirma o motivo da prisão e diz que "a polícia seguiu os procedimentos normais, sem que a sra. Trevisan fosse maltratada".
Jornalistas se manifestam sobre o caso
Entidades ligadas ao jornalismo criticaram a postura da polícia americana no episódio. "Os abusos policiais contra a imprensa sempre constituem impedimentos para os jornalistas cumprirem com suas obrigações", disse o diretor-executivo da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa), Julio Muñoz. O presidente da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), Marcelo Moreira, ressaltou que a repórter estava apenas tentando cumprir com a sua missão de informar.
Em seu blog, o jornalista e autor Laurentino Gomes questionou: "O tratamento seria o mesmo caso se tratasse de uma repórter dos jornais 'The New York Times' ou 'Washington Post', da rede de televisão 'CNN' ou qualquer outros dos grandes veículos de comunicação dos Estados Unidos?". Segundo ele, "não existe “evento fechado para a imprensa” se lá dentro existir um assunto de interesse público ou um personagem que deva ser entrevistado em nome do interesse público".
Para a jornalista do Estadão Lúcia Guimarães, "além de absurda e ultrajante, a prisão de Claudia Trevisan no campus de Yale - universidade multada em maio pelo governo Obama por falha em denunciar casos de estupro e violência sexual - é reflexo de uma tendência sinistra, um pacto faustiano da sociedade americana com o aparato de segurança", escreveu em sua coluna.
Nas redes sociais, Trevisan recebeu apoio de colegas do Brasil e dos EUA. Veja no Storify a seguir.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.