De um lado, repórteres ávidos por destrinchar dados disponíveis e deles extrair notícias valiosas, quem sabe até furos, sobre a administração pública. De outro, aficionados por tecnologia que buscam construir ferramentas para mapear e visualizar a informação que circula na rede mundial. O que acontece ao unirmos os dois grupos? Em busca da resposta, o jornal O Estado de S. Paulo promoverá a primeira maratona hacker, ou "Hackathon", organizada por um veículo de comunicação no Brasil.
O encontro reunirá repórteres, editores, designers, diagramadores, ilustradores, programadores e estudantes de jornalismo por 24 horas, a partir de 0h de sábado, 23 de junho, para analisar bases de dados públicos e criar soluções e aplicações digitais e práticas para estes dados, segundo o próprio Estadão. Interessados em participar podem se inscrever neste link.
A iniciativa surgiu do interesse de diferentes áreas do grupo Estado, em parceria com a Casa de Cultura Digital, e é mais uma amostra do pioneirismo do grupo Estado no campo do jornalismo de dados. Em conversa com o Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, Daniel Bramatti, repórter do núcleo Estadão Dados e um dos responsáveis pelo encontro, explicou como surgiu a ideia da maratona de programação e por que o jornal paulista tem investido tanto em projetos sobre dados públicos.
Centro Knight: O que motivou este primeiro 'hackathon'?
Daniel Bramatti: Foi uma ideia que surgiu em diversas áreas do jornal e se transformou em uma iniciativa conjunta do portal Estadao.com.br, do núcleo Estadão Dados, do Estadao.edu e do Link. Nosso objetivo é integrar jornalistas e hackers/programadores voltados para projetos de interesse público.
CK: Qual a expectativa do jornal para o encontro?
DB: Esperamos que a maratona propicie um mútuo aprendizado, e que dessa reunião surjam novos métodos e ferramentas para trabalhar com os dados que os governos vêm colocando à disposição do público.
CK: É possível conciliar os interesses comerciais do jornal com a crescente cultura de dados abertos?
DB: Sem dúvida. Nossa experiência com o Basômetro - ferramenta online para medir a base do governo no Congresso - já mostra isso: tanto o código quanto os dados foram tornados públicos. Essa iniciativa gerou uma excelente repercussão, e esperamos que em breve surjam "filhotes" do Basômetro.
CK: O Estadão é um dos veículos que mais investem no jornalismo de dados no Brasil. A que se deve esse interesse?
DB: Deve-se à percepção, tanto por parte de jornalistas quanto da direção do jornal, de que é preciso usar novas técnicas e ferramentas para extrair informações relevantes da avalanche de dados disponíveis em inúmeras bases públicas na internet. Acreditamos que, em breve, outros veículos vão despertar para essa realidade.
CK: Como tem sido a resposta da audiência aos novos aplicativos, como o Basômetro?
DB: As respostas são muito positivas. A ferramenta nos possibilitou escrever reportagens com análises inéditas sobre o comportamento dos parlamentares e dos partidos. Pesquisadores já chamaram o Basômetro de "parque de diversões do cientista político" e produziram uma série de dez artigos analíticos sobre as relações entre governo e Congresso.
CK: A Escola de Jornalismo de Columbia, uma das mais conceituadas do mundo, criou em 2010 um curso de mestrado que mescla disciplinas de ciência da computação com outras de jornalismo. A fronteira entre jornalismo e desenvolvimento de softwares está diminuindo?
DB: Não tenho dúvida disso. Eu mesmo gostaria de ter aprendido programação em algum momento - e espero ainda fazê-lo. O trabalho ficará muito melhor se, como repórteres, não nos limitarmos a usar apenas lápis, bloquinho e gravador.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.