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Lula gera críticas com escolha polêmica para trabalhar na EBC

Associações de jornalistas e grupos de direitos humanos no Brasil estão criticando a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de nomear o polêmico apresentador de televisão e político José Luiz Datena para comandar dois programas na mídia pública.

O presidente escolheu Datena — apresentador veterano e ex-candidato à prefeitura de São Paulo — para apresentar um programa semanal de entrevistas na TV Brasil e um programa matinal diário na Rádio Nacional, ambos parte do conglomerado de mídia federal Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

Datena, conhecido por sua personalidade marcante, ganhou notoriedade durante um debate televisionado em 2024, quando arremessou uma cadeira de metal contra um candidato rival à prefeitura que mencionou acusações de má conduta sexual contra ele. Ele também atraiu críticas por muito tempo pelo que muitos consideram o tom sensacionalista do Brasil Urgente, o noticiário que comandou no canal Band São Paulo até 2024.

Lula anunciou a nomeação de Datena em 1 de dezembro em seu gabinete no Palácio do Planalto, em Brasília, segundo a Folha de S.Paulo. “Os dois são amigos há décadas”, relatou a Folha.

Two men shaking hands in front of map and Brazilian flag

O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva convidou o polêmico apresentador de televisão e político José Luiz Datena para comandar dois programas de notícias nas emissoras públicas do governo federal. (Foto: Presidência da República)

 

A decisão provocou uma reação dura. Pedro Rafael Vilela, presidente do Comitê Editorial e de Programação da EBC e presidente do sindicato em Brasília, disse à LatAm Journalism Review (LJR) que Datena é a antítese do que as emissoras públicas deveriam expor.

Sua nomeação, disse Vilela, “revelou uma interferência ilegal e indevida do alto escalão do governo federal na programação das emissoras públicas”.

“A combinação de tudo isso”, acrescentou ele, “marca um episódio humilhante para o projeto de comunicação pública brasileira”.

Grupos de direitos humanos também foram vocais em suas críticas. O Conselho Nacional de Direitos Humanos afirmou que Datena representa um exemplo primordial de sensacionalismo, contribuindo diretamente para “associar a violência a estereótipos raciais e socioeconômicos, e violando direta ou indiretamente a dignidade de grandes segmentos da população brasileira, incluindo pobres, mulheres, indivíduos LGBTQIAPBN+, negros, moradores de favelas e comunidades marginalizadas”.

Eugenio Bucci, ex-presidente da Radiobras (que foi incorporada à EBC), não descarta as críticas, mas disse que a discussão precisa ser aprofundada.

“Se ele for contratado por suas habilidades de comunicação sobre o tema mais amplo da segurança pública e mudar seu estilo, então você pode ter algo potencialmente interessante”, disse Bucci à LJR, ele que é professor do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP).

Outros acadêmicos, no entanto, discordam. Akemi Nitahara, funcionária da EBC e doutoranda na Universidade Federal Fluminense, disse à LJR que para tal contratação funcionar, exigiria “uma mudança completa de perfil [dele], o que não faria sentido para alguém com tal reputação e uma marca profissional distinta”.

Questionado pela LJR sobre a crescente polêmica, Datena disse que está comprometido em ser uma voz independente e que já perdeu empregos por causa disso.

“Sempre defendi o que é constitucional (o povo) e sempre fui contra extremos de qualquer tipo”, disse ele à LJR. “Nunca me curvei a um patrão. Meu patrão é o povo. Tenho o direito de trabalhar onde quiser se for convidado. Nunca quis ser unanimidade, nem Cristo foi.”

Até mesmo pesquisadores que não estudam Comunicação ou Jornalismo, como Bruno Paes Manso, repórter sênior e pesquisador sobre violência na Universidade de São Paulo, tiveram opiniões sobre o impacto de tal figura.

Manso avaliou que Datena representa historicamente uma escola de jornalismo policial sensacionalista que orbita em torno da questão do medo, de maniqueismos entre “bem” e o “mal” e, às vezes, celebrar a violência policial.

“Esse estilo é criticado há muito tempo dentro do debate jornalístico sobre violência urbana e segurança pública”, explicou Manso, acrescentando que isso também representa um contraste marcante com as posições gerais do atual governo que, em teoria, veriam essas questões sob uma luz diferente.

Datena iniciou sua carreira no jornalismo policial, ganhando popularidade nas décadas de 80 e 90. Em 2013, como apresentador do Brasil Urgente, Datena foi duramente criticado por mostrar imagens de vítimas no chão de uma boate que pegou fogo e comparar a cena às câmaras de gás nazistas.

A história do sensacionalismo na TV brasileira foi abordada em um livro de 2024 sobre o apresentador Jacinto Figueira Júnior, conhecido como "O Homem do Sapato Branco", que ganhou audiência ao longo de décadas misturando fatos com farsas. Seu trabalho abriu caminho para figuras como Datena, segundo o autor Mauricio Stycer.

“Uma característica muito clara desses programas é tentar instigar o medo, um sentimento que estimula a audiência”, disse Stycer à LJR no ano passado. “Eles também nem sempre tentam seguir regras básicas do jornalismo, como mostrar todos os lados, não fazer acusações infundadas, não forçar pessoas a dar entrevistas, nem enfiar o microfone na cara de alguém que acabou de ser preso.”

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