Morreu no dia 12 de agosto em São Paulo o jornalista Claudio Weber Abramo, aos 72 anos. Matemático de formação e mestre em filosofia, Abramo tem sido celebrado por seus colegas e amigos como o pioneiro do jornalismo de dados no Brasil e por sua defesa intransigente da transparência e do acesso à informação pública.
“A carreira de Abramo no jornalismo se dedicou principalmente a uma obsessão com a precisão e a uma luta incansável contra a corrupção e em prol da transparência. Ele se tornou um pioneiro e um defensor do acesso à informação pública”, disse Rosental Alves, diretor do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas.
Em junho, Abramo foi um dos quatro instrutores em um curso online que teve mais de 2.000 alunos sobre como cobrir eleições no Brasil.
“Nós do Centro Knight estamos muito tristes e surpresos pela notícia da morte de Claudio. Há poucas semanas, mesmo enquanto passava por uma quimioterapia, Claudio estava trabalhando como instrutor em um curso online do Centro Knight, ensinando como jornalistas podem evitar erros ao cobrir eleições”, disse Alves. “Generosamente, ele ofereceu aos alunos do curso acesso a uma sofisticada base de dados que ele havia criado para seu mais recente projeto de jornalismo de dados, dados.org. Muitos jornalistas de diferentes regiões do Brasil puderam aproveitar este recurso.”
O jornalista Luiz Fernando Toledo, repórter do jornal Estadão e participante do curso ministrado por Abramo, usou o Datascópio, a ferramenta fornecida pelo instrutor, em uma reportagem sobre os gastos de congressistas em serviços de doadores de campanhas.
“Conversei com Abramo pela primeira vez para tirar dúvidas sobre o uso da ferramenta Datascópio, criada por ele, para fazer uma reportagem," disse Toledo. "Quando assisti às aulas dele pelo Centro Knight, logo percebi o enorme potencial de produzir reportagens com as bases que ele havia criado. Ele me respondeu no mesmo dia e, no dia seguinte, o problema já estava resolvido. Me ajudou muito.”
“Também não posso deixar de mencionar que, se hoje eu consigo produzir muitas reportagens com uso da Lei de Acesso à Informação, foi graças à luta dele no jornalismo," acrescentou ele.
Abramo foi editor de Economia da Folha de S. Paulo e secretário-executivo de redação da Gazeta Mercantil, além de ter atuado como jornalista em outras publicações como Valor Econômico, Abril Cultural e IstoÉ, segundo reportou Poder360.
Em 2000, Abramo foi cofundador da Transparência Brasil, organização que se dedica ao acesso à informação e ao combate à corrupção. Ele foi diretor-executivo da ONG até 2015, quando assumiu como vice-presidente de seu Conselho.
“Nós, que tivemos a honra de conviver e trabalhar com o Claudio, como o chamávamos, seremos eternamente gratos pelo privilégio de aprender com uma das figuras mais brilhantes do país”, escreveu a organização em seu blog. “Ele sempre será uma inspiração e referência de trabalho e rigor.”
Abramo foi responsável por vários projetos da organização que buscavam usar dados públicos para monitorar a atuação de autoridades dos Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. Um deles, Excelências, um banco de dados online com informações de processos e do desempenho de parlamentares, ganhou em 2006 o Prêmio Esso de Melhor Contribuição à Imprensa.
“Foi o pioneiro do jornalismo de dados no Brasil. Não um, o”, escreveu José Roberto de Toledo, diretor da Abraji e parceiro de Abramo na dados.org, em seu perfil no Facebook. “Até as vésperas de morrer, trabalhava diariamente para atualizar e melhorar as novas plataformas Cruza.Dados e Datascópio, que, apesar de estarem em fase Beta, alguns jornalistas tiveram oportunidade de experimentar.”
Em nota, a Abraji lamentou a morte de Abramo e afirmou que o jornalista “foi um dos mais importantes articuladores da elaboração e aprovação da Lei de Acesso à Informação, sancionada em 2011”.
A entidade lembrou que em 2015 Abramo recebeu o Prêmio Abraji de Contribuição ao Jornalismo, representando a Transparência Brasil, e destacou um trecho de seu discurso na ocasião: “Quem trabalha com esse tema, informação, tem um compromisso fundamental, e apenas um, que é com o público. Não tem compromisso com patrão, com amigos. É com o público. Quem transmite informação tem o dever de fazer isso da forma mais abrangente e precisa, de forma a — como diz a palavra — informar o público, de maneira adequada, correta, não pintada por opiniões pessoais”.
Leia abaixo homenagens de colegas ao jornalista Claudio Weber Abramo:
“Um rigoroso disseminador dos direitos e da verdade. Honrou como poucos o sobrenome e a profissão. Nós jornalistas e a sociedade como um todo lhe devemos montes. Obrigada, Claudio.”
Dorrit Harazim, jornalista e colunista de O Globo
“Perdemos alguém que o país não sabe calcular o tamanho da perda. Porque nunca fez questão de ser reconhecido. Bastaria ter sido mais flexível, ter mais cintura como se diz, para tanto. Mas jamais aceitou ceder. E fez muito bem!”
"Perdemos um batalhador pelas melhores causas e um amigo do bom jornalismo. Claudio Weber Abramo será sempre uma inspiração para quem luta pela democracia, pela transparência e pela aplicação correta dos recursos públicos. Na Abraji, as bandeiras que ele defendeu continuam erguidas.”
Daniel Bramatti, presidente da Abraji
“Numa época em que estão difundidas a burrice, a falta de empatia, as posições polarizadas e, principalmente, as estultícias sobre integridade e anticorrupção, lembrar do Claudio e ler coisas dele é um bálsamo. Ele não só trouxe racionalidade para a agenda anticorrupção, mas sempre conectava essa agenda ao tema das desigualdades.”
Fabiano Angélico, consultor sênior da ONG Transparência Internacional
“A obstinação de Claudio durante todo o processo foi fundamental para que a lei [de acesso à informação] fosse aprovada. Ele era uma pessoa de inteligência rara, objetivo, direto. Tinha grande paixão pelo jornalismo, sempre disposto a ajudar as boas causas. (...) Foi 1 privilégio conviver com Claudio. Ele fará muita falta, mas seguirá como inspiração para mim e para todos que acreditam no bom jornalismo.”