O sociólogo Eduardo de León é um dos 23 mil assinantes do jornal uruguaio la diaria.
Mas ele não está apenas lendo o jornal — está contribuindo ativamente com seu conteúdo.
Sociologist and La Diaria subscriber Eduardo De León (right) as a guest on “La Mañana de La Diaria,” a program on La Diaria Radio presented by Martin Rodriguez (left).
De León escreve colunas para o la diaria e foi convidado para dois episódios do projeto de rádio "La Mañana de la diaria", financiado pelos leitores, que debate questões políticas ao vivo com especialistas da comunidade e o apresentador Martin Rodríguez.
"Me parece que eles estão cobrindo um espaço que não existia até agora", disse De León à LatAm Journalism Review (LJR). "Um espaço de debate e análise aprofundada de políticas públicas."
De León é um exemplo do tipo de jornalismo que o la diaria pretende produzir: um que promova senso de pertencimento entre os leitores, ao mesmo tempo em que recorre a eles em busca de conhecimento.
Desde sua criação em 2006, o la diaria cresceu com o apoio de seus assinantes. Atualmente, 90% de sua receita vem de assinaturas como a de De León, segundo o jornalista e editor do la diaria Lucas Silva.
A publicação também convida a comunidade a financiar produtos e iniciativas específicas. Recentemente, graças aos leitores, criaram um documentário e uma estação de rádio.
"El Facilitador", documentário inteiramente financiado por 2.416 assinantes, estreou em novembro de 2024 e tem mais de 450 mil visualizações no YouTube. O filme abordou dois escândalos políticos que ocorreram durante o governo do ex-presidente uruguaio Luis Lacalle Pou, relacionados aos casos do ex-chefe de segurança presidencial Alejandro Astesiano e do narcotraficante Sebastián Marset.
De León disse que o Uruguai precisava de jornalismo investigativo que incentivasse os moradores a enfrentar os grandes dilemas do país.
"Teve gente que só entendeu o que aconteceu quando o documentário foi lançado, que não acompanhou o processo", disse De León. "É preciso discutir isso e resolver o que for possível desse pacote todo. O país precisa ser feito pelo povo. Então, o la diaria está construindo uma voz neste momento, nesses lugares. E acredito que isso ajuda outros a fazerem o mesmo sob outras perspectivas."
Da mesma forma, la diaria Radio, lançada em maio deste ano, também conta com o apoio de seus assinantes e foi criada para se conectar com os leitores por meio de um veículo tradicional. A emissora funciona numa cafeteria do próprio jornal.
"É como uma busca por transparência, proximidade, conversa", disse Damian Osta Mattos, diretor do la diaria, à LJR.
O objetivo de ambos os projetos é criar algo novo, único e útil no qual a comunidade tenha interesse em participar e receber.
"Quando você distribui notícias e tem essa conexão, pode acabar sendo simplesmente uma venda de serviço: as pessoas consomem, te pagam, leem a notícia...", disse Silva à LJR. "“Mas você também precisa mostrar, de tempos em tempos, que existem seres humanos do outro lado, ávidos por fazer coisas novas.”
Segundo Silva, o la diaria identifica necessidades e oportunidades para novas iniciativas através de pesquisas e um call center que busca captar novos assinantes ou fazer com que os atuais assinem outros produtos oferecidos pelo jornal.
Em algum momento, a equipe identificou que sua comunidade escutava rádio, e a ideia de que começassem a escutar as notícias do la diaria surgiu como possibilidade. No entanto, antes de lançar qualquer tipo de projeto, a equipe consultou sua comunidade.
"É algo muito importante para ter sucesso no que você propõe: identificar em que momento da rotina das pessoas pode entrar o que você está oferecendo", disse Silva. "Tipo de consumo, se acham uma boa ideia o la diaria criar uma rádio, se estariam dispostas a apoiá-la."
A equipe do la diaria explicou que seu modelo de assinatura estimula a co-criação com a comunidade porque esse é o caminho que desde o início lhe garantiu independência.
Mattos disse que o jornalismo latino-americano nem sempre esteve próximo das pessoas. Os modelos de publicidade tradicionais focavam no poder econômico e até mesmo na classe política, mas Mattos disse que os veículos que vão sobreviver precisam praticar um "jornalismo humano".
"Não é só ir pedir apoio das pessoas", disse Mattos. "[É] tentar entender por que alguém apoiaria o jornalismo que você faz, não é? Essa é a primeira pergunta que você tem que se fazer, e que tem que fazer às pessoas. O jornalismo humano que vai sobreviver é o jornalismo que assume que o conhecimento reside em sua comunidade."
A gerente de assinaturas Paula Falero relatou muitos exemplos de sinergia colaborativa. Para a rádio, uma assinante respondeu que é locutora e gostaria de fazer parte do projeto — agora ela é quem narra os áudios. Para o documentário, há casos em que assinantes deram mais do que a cota proposta, ou até mesmo forneceram algo diferente, como um leitor que disponibilizou vinho da sua própria vinícola para o evento do documentário.
"Todos podem participar de formas diferentes", disse Falero à LJR.
Na mesma linha, Silva disse que o próprio modelo os leva a pensar de maneira ampla e diversa: "Vinte mil pessoas dispostas a pagar num país como o nosso te obriga a ter uma ampla gama de ofertas. Você tem que abrir muitas janelas para que as pessoas entrem."
Cover of the documentary "The Facilitator." Script by Pablo Stoll, research by Lucas Silva, produced by La Diaria and funded by more than 2,000 subscribers. (Courtesy)
Com o documentário, o la diaria consultou os assinantes através de pesquisas para saber se eles estariam interessados em apoiar o projeto. Ao mesmo tempo, a equipe de gestão de comunidade do jornal se encarregou de ligar para os assinantes e contar sobre a importância da iniciativa.
"Eu sempre digo que a chave do sucesso, no nosso caso, foi transformar o jornalismo numa causa coletiva", disse Mattos.
Com a rádio, por exemplo, De León, o assinante e colaborador, expressou um sentimento de "aventura coletiva".
"Essa atmosfera de uma empresa jovem com muita gente envolvida produz muito entusiasmo, muita expectativa", disse ele.
Nesse sentido, para a criação do documentário, o la diaria vendeu "não só a vontade de fazer, mas a necessidade de que alguém fizesse", disse Silva.
De acordo com o Digital News Report 2025 do Instituto Reuters, o jornalismo investigativo tem se mostrado capaz de aumentar a confiança do público nas notícias. Segundo o relatório, há uma demanda por jornalismo que investigue pessoas poderosas e se aprofunde nos temas, ao invés de "perseguir algoritmos para obter cliques".
"Me parece que o vínculo e a sensação de fazer parte são importantes, e é o que de alguma forma te diferencia ou faz com que as pessoas entendam que têm que pagar uma assinatura", disse Falero.
De León disse que valoriza o crescimento do jornalismo investigativo do la diaria desde que começou a ler o jornal há 12 anos.
"Hoje você vê um produto diferente do que era há 6-7 anos", disse. "Hoje conseguiram um equilíbrio muito interessante entre investigação, análise da notícia e opinião. E isso é o que vejo como consumidor."