O prêmio de reportagens Gilberto Velho Mídia e Drogas, que reconheceu, em sua terceira edição, o trabalho de cinco jornalistas brasileiros, tem o objetivo de incentivar e melhorar a qualidade do debate público sobre políticas e legislação de drogas no país. Os ganhadores de 2016 foram divulgados em 2 de dezembro.
Segundo uma das coordenadoras do projeto, a cientista social Julita Lemgruber, o prêmio faz parte de uma campanha, chamada "Da proibição nasce o tráfico", além de uma série de atividades que "pretendem desafiar a lógica da guerra às drogas". A campanha inclui charges, vídeos e comunicação nas redes sociais que tentam estimular o debate sobre o tema.
"O Brasil tem o maior número de homicídios por ano do mundo. Grande parte dessas mortes é resultado da guerra às drogas, que legitima a violência policial. No Brasil, a polícia mata 9 pessoas por dia", ressaltou ela, que também é coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) da Universidade Candido Mendes.
De acordo com Lemgruber, a política de guerra às drogas também impacta o sistema carcerário. "Mais de 600 mil pessoas estão presas no país, formando a quarta maior população de encarcerados do mundo", disse ela, ao Knight Center.
Segundo a jornalista Anabela Paiva, também coordenadora do prêmio, o debate público sobre o assunto está muito focado no medo dos danos que as drogas podem causar. Já a imprensa, para Paiva, não costuma fazer matérias que vão além da dinâmica do tráfico de drogas. Ela acredita que há hoje mais pautas isoladas de jornalistas que conhecem de forma mais aprofundada as políticas e legislações de drogas.
"O papel da imprensa é fundamental no sentido de difundir o conhecimento científico sobre o tema e apresentar o que acontece não só no Brasil mas em outros países. Temos visto alguns jornalistas que tomaram para si o tema, por acreditar na sua importância", disse ela.
Por isso, o prêmio surgiu como uma forma de dar mais visibilidade a trabalhos jornalísticos sobre as drogas e, com o tempo, incentivar a produção de reportagens. Em 2016, 60 jornalistas se inscreveram no prêmio, inclusive de cidades do interior.
"Esperamos que a partir dessa iniciativa de valorização do trabalho da mídia outros veículos e jornalistas coloquem o tema como uma pauta mais frequente e valorizada", aponta Paiva.
Além do prêmio, as coordenadoras organizaram um workshop em 2015, "Drogas em pauta", que ofereceu a jornalistas e estudantes de jornalismo palestras com especialistas sobre aspectos legais, históricos, médicos e éticos da política de drogas.
Premiados
Na terceira edição do Gilberto Velho Mídia e Drogas, a jornalista Débora Melo, da Carta Capital, ganhou o prêmio principal, no valor de R$ 7 mil. Ela foi reconhecida pelas três reportagens que inscreveu: “O Brasil entra no mapa da medicina psicodélica”; “Osmar Terra e o retrocesso na política de drogas” e “A cracolândia no centro da disputa política em São Paulo” (esta, com colaboração do jornalista Tadeu Amaral).
A jornalista Alessandra Mendes ficou em segundo lugar e recebeu R$ 3 mil pela matéria “100% irregulares: vistorias em 42 comunidades terapêuticas apontam violações de regras e direitos”, publicada pelo Jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte.
Pela reportagem “Nosotras: Quem são as bolivianas presas em São Paulo”, publicada pela edição brasileira do Le Monde Diplomatique, a jornalista Ana Luiza Voltolini Uwai ganhou o terceiro lugar, um prêmio de R$ 2 mil.
Além dos três primeiros prêmios, o júri concedeu duas menções honrosas, ambas de R$ 1 mil, para os jornalistas Fernanda Teixeira Ribeiro e Juliano Amengual Tatsch.
Histórico
O Gilberto Velho Mídia e Drogas é considerado o primeiro prêmio jornalístico dedicado ao tema das drogas no Brasil. O projeto tem o apoio da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e homenageia o antropólogo Gilberto Velho (1945-2012) que, segundo os organizadores do prêmio, foi "um dos primeiros a propor a discussão sobre a regulação das drogas no Brasil".
O projeto é uma iniciativa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), da Universidade Candido Mendes, voltado para a "produção de análises e dados relacionados à criminalidade e segurança pública". Além do prêmio, o CESeC desenvolve várias atividades sobre o tema das drogas, em um projeto mais amplo que conta com o financiamento da Open Society Foundations.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.