Com conteúdos relevantes e inovadores, as newsletters podem ser produtos importantes para driblar a dependência das redes sociais na distribuição de materiais jornalísticos e ampliar a relação com o público, além de terem potencial para monetização, diversificando as fontes de receita das organizações. Segundo o relatório anual do Instituto Reuters, o formato é também uma das principais alternativas para 2024 diante da queda de tráfego via redes sociais, especialmente pelo X (antigo Twitter) e pelo Facebook.
Nas previsões jornalísticas do Nieman Lab, Sarah Marshall, que lidera a área de estratégia de desenvolvimento de audiência na Condé Nast, aponta que este ano será o ano do jornalismo se voltar para o contato direto com o público para além das plataformas das big techs e enxerga as newsletters como um desses caminhos, ao lado de aplicativos próprios.
Em entrevista à Ajor, o especialista em jornalismo digital e pesquisador da Universidade de Barcelona, Carlos Lopezosa, explica que oferecer conteúdo personalizado baseado nos interesses da audiência, estimular a interação, com o uso de enquetes e comentários, e manter a transparência na seleção de informações são práticas essenciais para fortalecer a relação entre veículos e público por meio de uma newsletter.
No artigo “Newsletters latinoamericanas de curación: estudio de casos y visión experta” (Newsletters latino-americanas de curadoria: estudo de casos e visão de especialista, em tradução livre), Lopezosa destaca que os boletins de curadoria de conteúdo tiveram um crescimento nos últimos anos e têm sido a saída encontrada por leitores ao contexto de excesso de informação nas mídias sociais.
A Ajor conversou com Filipe Speck, fundador da Matinal, e Joana Suarez, cofundadora da Cajueira, ambas organizações associadas à Ajor que tem a newsletter como carro-chefe ou produto fundador para entender os processos básicos para começar uma iniciativa do tipo.
1 – Entender o objetivo do produto
Para Speck, o processo anterior à decisão de se lançar uma newsletter é o de definir a visão de produto e qual será o papel dela na organização.
“Os emails são extremamente eficientes para qualificar a audiência e aumentar a comunidade de pagantes. Se a sua estratégia for incrementar ou criar esse tipo de receita, newsletters são hoje uma saída quase inevitável. No começo, apostamos em newsletters porque queríamos ter o máximo de domínio sobre a nossa audiência, sem depender majoritariamente de intermediários como redes sociais ou acessos orgânicos.”
2 – Assinar outras newsletters
Durante o planejamento estratégico do produto, também é necessário conhecer o máximo de newsletters na área na qual a organização atua.
“É importante que seja uma coisa nova. Você tem que pensar na pessoa que vai receber. Ela já deve receber um tanto de newsletter. Por que ela assinaria outra? O que você entregaria para essa pessoa de diferencial?”, questiona Suarez.
Speck conta que a equipe da Matinal assinou mais de cem produtos do tipo para entender qual o papel de cada uma nas organizações.
3 – Fazer projetos pilotos e definir público-alvo
Um dos caminhos usados pela Matinal para entregar o produto ideal à audiência foi a elaboração de pilotos para estabelecer a estrutura e a linguagem da newsletter. Segundo Speck, o formato é essencial para se conectar ao público-alvo, além do recorte de temas.
Suarez explica que na Cajueira o público-alvo foi pensado a partir da lacuna do jornalismo brasileiro na distribuição da cobertura independente de direitos humanos olhando para os veículos nordestinos.
“É importante colocar algumas metas à medida que sua proposta ganha aceitação entre os assinantes. A Cajueira tem um crescimento muito orgânico por ser um projeto que não existia igual.”
4 – Garantir a periodicidade
“Depois de começar, a regra de ouro é consistência. Atrasar ou suspender quebra um ciclo de confiança com o leitor”, afirma Speck.
Atualmente, a Matinal possui quatro newsletters – uma gratuita, de segunda a sexta; outras três para apoiadores, cada uma com um disparo semanal. Já a Cajueira atua com periodicidade quinzenal.
É importante que a periodicidade seja definida antes do lançamento como parte do planejamento estratégico da organização e com base no tamanho da equipe envolvida no produto.
A produção de uma de uma newsletter segue etapas diferentes da atividade da atividade jornalística, como curadoria, redação, edição e revisão, e que demandam especialidades e ferramentas específicas. Para iniciar o projeto, é necessário pensar em quantas pessoas estarão dispostas na operação e nos valores das plataformas que serão utilizadas.
Atualmente a Cajueira conta com cinco profissionais – quatro dedicadas à produção da newsletter e uma responsável pelo Cajuzap, a curadoria em áudio, distribuída pelo WhatsApp.
Já na Matinal, para além dos repórteres cujas matérias são enviadas em primeira mão na newsletter, são três profissionais que se envolvem diretamente em quatro momentos de execução do produto: uma editora-chefe que monta o esqueleto e produz conteúdo; um redator que produz parte do conteúdo; um editor de fechamento, que monta a newsletter, atualiza e produz mais conteúdos, se preciso; e a pessoa que envia, que costuma ser a editora-chefe.