texas-moody

Segundo congresso ‘Mais Mulheres, Melhor Jornalismo’ destaca ‘responsabilidade social’ dos jornalistas perante IA e desinformação

O papel dos jornalistas diante dos desafios e oportunidades apresentados pelas novas ferramentas de inteligência artificial (IA) foi o ponto de partida do segundo congresso ibero-americano “Mais Mulheres, Melhor Jornalismo”, realizado pela rede Women In The News Network (WINN) no dia 16 de novembro. O evento online propôs reflexões sobre temas relevantes para o jornalismo atual e destacou a responsabilidade social dos jornalistas perante a desinformação e a polarização política.

“Estamos todos um pouco animados, esperançosos, mas também um pouco assustados”, disse Gabriela Cañas, CEO da agência de notícias espanhola EFE, no painel de abertura do evento, intitulado “Inteligência artificial: um jornalismo mais ou menos inteligente?”.

Daniel Hadad, fundador e presidente do meio argentino Infobae, e Cañas participaram de uma conversa mediada por Sofía Vago, CEO e presidente da Accenture Argentina, sobre o impacto das novas ferramentas de inteligência artificial generativa (GenAI) no jornalismo.

“As redações de todo o mundo estão em estado de choque, o que não acho que seja uma coisa ruim.  De vez em quando, acho que é muito bom refletir sobre nossas táticas, mas, acima de tudo, sobre nossa estratégia”, disse Hadad. Os dois jornalistas compartilharam como os meios que lideram estão lidando com as novas possibilidades apresentadas pela GenAI.

Em Infobae, a equipe de tecnologia desenvolveu uma ferramenta que se baseia em mais de 120 mil imagens de seu próprio arquivo para criar imagens ilustrativas para as matérias do site.

“Nada substitui um bom fotógrafo e uma boa foto tirada em um momento em que algo está acontecendo. Mas, às vezes, para ilustrar algo, a foto gerada por IA também ajuda muito”, disse ele.

A EFE também está desenvolvendo suas ferramentas, disse Cañas, explorando como a GenIA pode auxiliar jornalistas a fazer seu trabalho. Ela acredita que a tecnologia vai “desrobotizar os humanos”, ou seja, liberar os profissionais da comunicação de tarefas repetitivas que podem ser realizadas por sistemas automatizados. No entanto, a última palavra sobre o conteúdo gerado pelas máquinas deve sempre ser de um humano, disse ela.

E perante o risco da desinformação gerada por ferramentas de inteligência artificial, “o que temos de fazer é seguir trabalhando com nossos códigos de ética”, disse Cañas, garantindo aos cidadãos a veracidade das notícias.

“Diante de toda a bagunça que o cidadão está enfrentando neste momento, com inteligência artificial, redes sociais, plataformas, enfim, todo tipo de dispositivos que disseminam qualquer coisa, estamos nós, com a responsabilidade social que nos distingue”, disse ela.

Desinformação e credibilidade

Essa responsabilidade social também deve responder à queda da confiança do público nos meios jornalísticos, disseram as profissionais que participaram do segundo painel do congresso, “Jornalismo, desinformação e credibilidade”.

Claudia Palacios, apresentadora da Blue Radio e colunista do jornal El Tiempo, na Colômbia, comentou sobre o analfabetismo midiático presente entre grande parte do público, especialmente o mais jovem. Enquanto gerações anteriores se formaram com os meios jornalísticos como referência informativa, os mais jovens têm tido as redes sociais como fontes primárias de informação, observou ela.

“Há um grande desafio em como esses públicos estão escolhendo o conteúdo a ser consumido, a que dão credibilidade, se estão desenvolvendo um faro para coisas suspeitas, ou seja, estranhas”, disse Palacios.

Paula Escobar Chavarría, apresentadora da CNN Chile, destacou a importância de explicar ao público o que é e como é feito o trabalho jornalístico para fortalecer a confiança das audiências no conteúdo que lhe está sendo apresentado.

“Temos que explicar que o que fazemos não tem nada a ver com circular informações nas redes sociais”, disse ela. “Acho que, nesse sentido, essa ideia de jornalismo cidadão, que teve um certo eco há alguns anos, de que qualquer pessoa poderia ser jornalista, foi uma ideia muito ruim.”

Isso porque a informação maliciosa, as chamadas “notícias falsas” que circulam em redes sociais, são criadas com o propósito de “transformar mentiras em informações”, disse Chavarría.

“Nossa profissão, com todos os erros que pode cometer e todos os limites que pode ter, é um trabalho profissional e, portanto, é diferente [de circular informações nas redes sociais], e temos que enfatizar muito isso”, afirmou.

Chavarría também destacou como as jornalistas mulheres são as mais afetadas nesse ambiente de descredibilização da profissão. Ela convocou as colegas que são alvo de ataques a resistirem e continuarem fazendo seu trabalho.

“O objetivo [dos ataques] é intimidar, amedrontar e silenciar as vozes das mulheres jornalistas que estão fazendo seu trabalho, seja investigando casos de corrupção, seja revelando realidades que as diferentes facetas do poder não querem que sejam conhecidas ou expressando suas opiniões a respeito”, afirmou.

Outra maneira de restaurar a credibilidade do jornalismo, sugeriu Chavarría, é os jornalistas também resistirem à polarização social e política.

“Algo muito importante é não nos polarizarmos, ou seja, mantermos um tom profissional, um tom apropriado, no qual sejamos capazes de entrevistar pessoas que pensam de forma diferente umas das outras e de nós, e sermos capazes de conduzir nosso trabalho com um tom de profissionalismo e não de polarização. Acho que cair nisso é cair no jogo daqueles que estão minando a democracia, destruindo a esfera pública e minando os próprios fundamentos do jornalismo e da liberdade de expressão”, disse ela.

Rede reúne 4.500 comunicadoras de língua espanhola

Gabriela Olivan, fundadora e presidente da WINN, destacou que a rede, fundada em 2018, conta hoje com 4.500 jornalistas, comunicadoras e criadoras de conteúdo de língua espanhola presentes em diversos países. Segundo ela, o congresso Mais Mulheres, Melhor Jornalismo “é um marco na história recente da WINN de promover o jornalismo livre, inovador e imparcial”.

Olivan observou como os últimos cinco anos apresentaram desafios sem precedentes para o jornalismo global, como a pandemia de COVID-19 e a popularização das ferramentas de IA, além do aumento da violência contra jornalistas.

“É por isso que iniciativas como a WINN são tão relevantes: redes internacionais que reúnem meios de comunicação, jornalistas, empresas e universidades para pensar sobre os fatos, interpretá-los e questioná-los, para assumir nosso papel na reconstrução do tecido social com responsabilidade, coragem e compromisso ético”, disse ela.

Summer Harlow, diretora associada do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, encerrou o encontro recapitulando os temas-chave que surgiram em cada painel do congresso, que também promoveu conversas sobre o papel do jornalismo na alfabetização em saúde, a sustentabilidade na agenda midiática e os podcasts como novo gênero jornalístico.

Harlow destacou a importância de iniciativas como a rede WINN como meio de promover as mulheres no jornalismo, especialmente em postos de liderança.

“As mulheres representam mais de 50% da população global, mas nas redações chegam apenas a 40%, e em postos de liderança esse número não passa de 24%. Portanto, um congresso como este, que dá visibilidade às mulheres no jornalismo, é muito importante, hoje mais do que nunca”, disse Harlow.

O Centro Knight também apoiou o segundo congresso ibero-americano “Mais Mulheres, Melhor Jornalismo”.

A gravação completa do evento está disponível no canal do YouTube da WINN.

Regras para republicação

Artigos Recentes