Por Maira Magro
A cobertura da violência pela mídia brasileira vem sendo enriquecida pelo fenômeno da Twittosfera Policial. Driblando a hierarquia de suas corporações, policiais usam o Twitter para narrar seu dia-a-dia, denunciar corrupção e abusos, opinar sobre as instituições policiais e até sobre o trabalho da imprensa. São acompanhados de perto por repórteres e acadêmicos especializados na área que, juntos, formam um espaço de discussão ativa nas redes sociais, com impactos relevantes no jornalismo.
O blog Abordagem Policial publicou uma lista de perfis na Twittosfera e na Blogosfera Policial.
No Rio de Janeiro, um dos perfis mais populares é o @bocadesabao - um canal de denúncias de corrupção e abusos na Polícia Militar, feito anonimamente por policiais. Outros twitteiros são o capitão Luiz Alexandre @CapLAlexandre e a tenente Júlia Liers (@julialiers) – que ganhou até as páginas das revistas de celebridade ao narrar que havia detido o ator Dado Dolabella com "erva, q lembra maconha".
Acompanhado por milhares de seguidores até a semana passada, o @Bope_RJ chamou a atenção da mídia ao criticar a cobertura da Globo e da Record da operação policial na Vila Cruzeiro, na zona Norte do Rio, quando imagens de helicóptero mostraram, ao vivo, tanques blindados se dirigindo para o local, no dia 25 de novembro. A PM negou que se tratasse de um perfil oficial do Batalhão de Operações Especiais (Bope), como o site anunciava. O blog Jornalismo nas Américas apurou com fontes da PM carioca que o perfil era feito por um policial do Bope e refletia a opinião de alguns policiais de que as emissoras teriam prejudicado o trabalho da polícia ao anunciar a operação. Poucos dias depois, a conta foi apagada.
Sujeitos a uma estrutura disciplinar rígida, policiais costumam ser reprimidos ou censurados por sua atuação nas redes sociais, como mostrou o interessante estudo “A Blogosfera policial no Brasil: do tiro ao Twitter”, das pesquisadoras Silvia Ramos e Anabela Paiva, publicado pela Unesco e o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (baixe aqui o relatório, em PDF).
O capitão Luiz Alexandre, da PM carioca, pegou 20 dias de detenção por comentar, no serviço de microblogs, sua nomeação para um cargo na corporação, como noticiou O Estado de S. Paulo. O jornal também relata o caso de um delegado que foi transferido ao defender eleições para a escolha do chefe da Polícia Civil do Rio e pedir uma corregedoria independente, na conta @Delegado_Pinho.
Antes dos perfis no Twitter, proliferaram os blogs de segurança pública, escritos por repórteres, acadêmicos e pelos próprios policiais. Como aponta o estudo da Unesco, a blogosfera policial enriquece o debate da violência e o trabalho da imprensa no Brasil: “a ampliação destas páginas tende a acelerar a qualificação profissional dos repórteres e editores destas áreas que observamos a partir dos anos 1990”.
Um dos efeitos, talvez, seja uma cobertura cada vez mais atenta aos problemas existentes dentro das próprias forças policiais. Esta semana, depois de noticiar a vitória da polícia na ocupação do Complexo do Alemão, a Rede Globo veiculou denúncias de abusos cometidos por policiais durante a operação (veja o vídeo).
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.