O veículo peruano Convoca.pe tornou-se o epicentro de eventos virtuais que servem como espaço coletivo de diálogo sobre novas tecnologias e investigações jornalísticas realizadas na América Latina e na Espanha.
Em meados de julho deste ano, o Convoca.pe realizou o Encontro Latino-Americano de Dados, Inovação e Jornalismo Investigativo (ELDIP, na sigla em espanhol) com mais de 30 palestrantes de todo o mundo, 13 mesas de exposição e quatro workshops especializados. Embora os temas discutidos tenham sido diversos, todas as palestras tiveram o mesmo objetivo: entender como fazer uma boa reportagem investigativa que combine tecnologia e inovação.
“Todos os dias são gerados grandes volumes de informações que raramente são processadas e analisadas por jornalistas e meios de comunicação para detectar histórias de interesse público e ajudar os cidadãos a tomar melhores decisões. Por isso, é fundamental que os jornalistas conheçam as principais ferramentas que possibilitam o processamento, análise, verificação e visualização de grandes quantidades de informação”, explica a equipe organizadora do evento no site oficial do encontro. “Além de estar atento às novas tendências e narrativas digitais para desenvolver histórias que tenham maior impacto público e beneficiem a sociedade”, acrescentam.
A LatAm Journalism Review (LJR) esteve presente no encontro e resume abaixo os pontos mais marcantes, durante as conversas, que facilitam a criação de equipes de inovação e casos de sucesso investigativo.
A jornalista e diretora do Convoca.pe, Milagros Salazar Herrera, falou sobre a importância de as equipes de investigação terem clareza sobre seu objetivo comum e o papel que cada um desempenha na dinâmica de trabalho.
“É muito importante valorizar a contribuição de cada membro da equipe porque isso nos dá a oportunidade de falar uma língua comum e ouvir uns aos outros. Ouvir o que o outro tem a dizer é fundamental”, disse Salazar em uma das mesas de discussão.
Salazar destacou ainda que dentro de uma equipe é importante estabelecer prioridades para gerar acordos claros. E ao mesmo tempo ser flexível caso esses acordos mudem durante o desenvolvimento de um projeto.
Nesse aspecto, concorda a jornalista Sandra Crucianelli, do Infobae e referência no uso de bancos de dados no jornalismo, que aposta na agilidade e na criação de trabalhos baseados em dados que não levam meses para serem concluídos.
“Os recursos humanos são essenciais. O grande desafio é criar uma equipe que entenda e comunique e todos saibam o que fazer”, comentou Crucianelli na mesa de abertura do encontro.
Uma discussão que se repetiu constantemente durante o encontro é a necessidade de publicar histórias que conectem os leitores e não deixem o lado humano de lado, mesmo que sejam usados dados ou tecnologia.
“Se você está considerando um trabalho de dados, a história real está lá fora. A história não está nos dados ou na visualização. A história está nas pessoas afetadas”, disse Ronny Rojas, repórter da Telemundo News. Rojas também recomendou ter empatia com os leitores, aproximar a obra das pessoas e personalizá-la. Da mesma forma, não se deve esquecer a reportagem de rua, que ainda é necessária apesar das vantagens que a tecnologia trouxe.
O jornalista Rafael Quintero, da unidade de dados do diário colombiano El Tiempo, também enfatizou este ponto, dizendo que o público colombiano está acostumado à crônica jornalística e ao aspecto humano nas reportagens, devido à influência deixada pelo escritor Gabriel García Márquez.
“Quando há uma grande matéria, e ela também é complementada com dados, a reportagem se torna mais poderosa. Nem todos os dados precisam ser complementados com uma ótima história, mas ajuda muito a deixar os leitores mais interessados”, comentou Quintero.
Outro fator que deve ser levado em consideração para gerar o interesse do cidadão é a tradução de informações excessivamente técnicas em linguagem simples.
“O desafio [quando há termos técnicos] é aprender a identificar histórias e poder contar sua importância de maneira simples, com uma linguagem mais próxima das pessoas”, disse Jackeline Cárdenas, jornalista do La República no Peru, durante uma das palestras do encontro
Na mesa inaugural intitulada "Rumo ao futuro: laboratórios de dados e inovação", Juan Cía, responsável pelo laboratório de inovação db El Confidencial na Espanha, abriu o debate sobre a construção de mídias mais úteis para os leitores. De acordo com Cía, isso só pode ser alcançado por meio da inovação e do pensamento crítico dentro do próprio meio.
“O Laboratório de Inovação El Confidencial tem sido um gatilho para mudanças dentro da redação e um gatilho para o pensamento crítico. Estamos trabalhando para poder criar fluxos de trabalho com equipes que costumavam trabalhar separadamente na redação [comercial, produto, editorial]”, disse Cía. “Os laboratórios de inovação têm que ser equipes que promovam a transformação corporativa dentro do meio, coloquem os leitores no centro da tomada de decisões, criem mídias mais úteis para os leitores”, acrescentou o jornalista.
Durante essa sessão, eles também explicaram que os laboratórios de inovação não devem ser entendidos apenas como uma equipe clássica de visualização de dados, mas como equipes que lidam com dados, tecnologia, produto, design, plataforma, entre outros. Além disso, durante o encontro chegou-se à conclusão de que a melhor forma de fazer um bom trabalho na mídia é por meio de equipes integradas.
Nesse sentido, o gerente de TI do Pulitzer Center on Crisis Reporting, Ash Guevara, recomenda que a organização seja o centro de qualquer trabalho em equipe. Para fazer isso, Guevara usa a metodologia scrum onde são estabelecidos sprints, que são um curto período fixo de tempo em que uma equipe trabalha para concluir uma determinada quantidade de trabalho.
“Não estou de acordo com a separação das redações entre repóteres de texto e designers. Nos veículos que estão fazendo melhores trabalhos de visualização, todos se consideram jornalistas. Não há separação. São equipes integradas”, disse Alberto Cairo, jornalista e professor da Universidade de Miami. “Você tem que horizontalizar o relacionamento, não verticalmente. Deve haver uma conversa horizontal. Se essa conversa não acontecer, você nunca será o The New York Times."