Moradores de grotas, favelas, quebradas, aldeias, quilombos e bairros populares de todo o Brasil se reuniram no Rio de Janeiro para o 1º Encontro Nacional de Comunicação das Periferias. Após quatro dias de discussão entre 12 e 15 de outubro, 70 ativistas e comunicadores redigiram uma mensagem em que se comprometem a criar uma rede de apoio e ação para usar a comunicação como ferramenta para lutar pela vida e pela garantia de direitos humanos.
“Inicia-se a criação de um grande banco de narrativas inspiradoras e colaborativas para criar empatia; problematizadoras, para mostrar a forma como o Estado se faz presente; reflexivas, para afirmar a potência das periferias; solidária, para a formação de um grande e forte grupo de proteção das comunicadoras e dos comunicadores em cada território”, escreveram os comunicadores no documento.
Um dos participantes, Pedro Borges, o co-fundador do portal de Alma Preta, que foca em questões da comunidade de negros do Brasil, disse que a proposta é importante na discussão de democratização da mídia brasileira. “[Uma rede de apoio] é a estratégia adotada mais eficiente e capaz de construir uma discussão séria sobre a democratização da mídia”, disse ao Centro Knight. “Temos um potencial muito grande. Devemos e podemos pautar o debate a nível nacional”.
Os comunicadores presentes ao encontro atuam em coletivos e associações afastados dos centros das grandes cidades brasileiras nos estados da Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul e Distrito Federal. Foi feita uma pesquisa para selecionar uma amostra de pessoas próxima da realidade demográfica brasileira: 50% de mulheres e 50% de homens; 54% de negras e negros.
Segundo Borges, a pluralidade dos participantes incentivou o conhecimento de diferentes realidades e particularidades de cada território. “A troca foi incrível. Tivemos a oportunidade de não só trocar tecnologia, conhecimento e posicionamentos políticos, mas também o afeto”, disse. “Se identificar é importante para confiarmos um no outro para fazer uma rede nacional das periferias. É fundamental você se olhar, se reconhecer. Só isso vai permitir a gente fazer um combate sério e forte contra o genocídio negro”, completou, referindo-se ao alto número de jovens negros mortos no Brasil.
A data do encontro foi escolhida como marco simbólico aproveitando a proximidade do dia 17 de outubro, Dia Internacional de Erradicação da Pobreza. Um dos objetivos do evento era mandar uma mensagem sobre a força das periferias para se construir uma sociedade com mais justiça, liberdade e convivência. “As pessoas da periferia já são potência na cidade. Estamos nos encontrando para ampliar essas vozes”, disse ao Centro Knight Eduardo Alves, diretor do Observatório de Favelas e um dos organizadores do evento.
Alves explica que o encontro é uma continuação do Seminário Internacional “O que é periferia, afinal, e qual seu lugar na cidade?”, que ocorreu em março, também no Rio. Na ocasião, os comunicadores periféricos assumiram o papel de combater “a visão reducionista, estereotipada e desqualificadora dos territórios periféricos” em uma carta escrita coletivamente.
“Estamos acumulando em contatos, identidades, para uma ação. Faremos outros encontros, já apontando para a escala internacional. Tem uma chegada coletiva de vários setores”, disse, e ressaltou: “O encontro não é um instrumento de representação. É uma ação coletiva organizada”.
“O principal obstáculo já enfrentamos: o Estado e a sociedade enxergam o território das periferias como território onde predomina a violência e a ausência. A violência letal pesa nesse território”, comentou Alves.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.