Em 2022, 39% da população dos Estados Unidos vivem em domicílios sem nenhum aparelho de rádio tradicional. Este índice era de apenas 4% em 2008. No mesmo período, o número de americanos que consome áudio digital, ou seja, fora do dial AM/FM, saltou de 21% para 73% da população. Os dados são da mais recente edição da pesquisa The Infinite Dial, da Edison Research.
“De muitas maneiras, o áudio costumava ser sinônimo de rádio. E como muitas coisas, as mudanças digitais na tecnologia de computação realmente mudaram isso e realmente mudaram a forma como as pessoas estão consumindo conteúdo”, disse Tamar Charney, que mediou o painel “Audio journalism and social audio: Listen up, it’s a new frontier of digital storytelling” [Jornalismo de áudio e áudio social: ouça, é uma nova fronteira da narrativa digital] durante o ISOJ 2022. “[Isso é] uma grande mudança de jogo porque as pessoas estão recebendo seu áudio em muito mais lugares do que o rádio.”
Segundo Charney, uma estrategista editorial que trabalhou para a NPR [National Public Radio, a maior rede de rádios públicas dos Estados Unidos], a mudança profunda em como as pessoas, sobretudo jovens, consomem a palavra falada e o áudio tem encorajado organizações jornalísticas a explorarem o formato.
Maggie Penman, produtora executiva do podcast Post Reports, do The Washington Post, disse durante o painel que o jornal tem experimentado com diferentes mídias e formatos em áudio, como artigos em áudio e as recentes plataformas de áudio social, como o Twitter Spaces e o Clubhouse. Segundo ela, os esforços dos jornalistas da publicação para chegar aonde os leitores estão no ambiente digital têm dado resultados positivos.
“Um de nossos repórteres me disse, ‘adoro vir ao Post Reports porque ouço do meu primo adolescente, que sei com certeza nunca leu nenhum dos meus artigos, mas ele ouve o Post Reports, e toda vez que estou no podcast, ele me liga’. Então eu acho que é isso que as organizações de notícias estão aprendendo. Não é porque as pessoas não estão lendo jornais impressos ou não estão ouvindo rádio que elas não estejam curiosas sobre o mundo,” disse Penman.
No San Francisco Chronicle, os podcasts têm servido como ferramenta para alcançar uma nova audiência que não se considera leitora do jornal, segundo Sarah Feldberg, editora de novos produtos e áudio. E o principal podcast produzido pela equipe, o Fifth and Mission, aposta em compartilhar de forma franca o processo de apuração e as decisões editoriais por trás das reportagens.
“Como eles [repórteres] encontram suas fontes, por que fazem as escolhas que fazem, por que estão contando as histórias que estão. (...) Então as pessoas entendem que tem um ser humano que está produzindo isso para você, e há motivos para elas estarem fazendo as escolhas que fazem. E se pudermos compartilhar e explicar isso, construímos confiança e conexão,” disse Feldberg.
Apesar de o podcast ter se tornado comum em muitas redações, uma limitação inerente ao formato impede que seja usado para veicular notícias de última hora. O consumo por demanda reduz a agilidade de atualização do noticiário, ainda mais com assuntos em desenvolvimento.
O podcast recém-lançado The Refresh, da Insider usa uma nova tecnologia para superar esta barreira, para oferecer notícias recentes, como uma rádio ao vivo, mas sob demanda. A primeira edição do podcast é disponibilizada às 7h e depois atualizada várias vezes por dia até o fechamento da edição final.
“Com The Refresh, pensamos em nós mesmos como a página inicial do jornal com pequenos módulos diferentes que podem ser retirados e depois recolocados sem realmente afetar a integridade [do áudio]”, disse a apresentadora e produtora Rebeca Ibarra. “Toda vez que você vem até nós, você tem as últimas notícias e podemos alterá-las sem precisar o programa todo graças à nova tecnologia por meio de uma empresa Spooler com a qual estamos trabalhando.”
Outra fronteira tecnológica para os jornalistas que trabalham com áudio são os chamados aplicativos de áudio social, como Clubhouse, Spotify Greenroom, e Discord. Redes sociais tradicionais também já lançaram serviços similares, como o Twitter Spaces e o Facebook Live Audio Rooms.
Estas plataformas servem para ampliar a visibilidade do conteúdo jornalístico e também estabelecer conexões com fontes, segundo Penman, do Washington Post. Isso ocorreu quando um repórter de tecnologia estava participando de um Twitter Spaces para discutir as revelações de que o Facebook sabe que o Instagram é tóxico para meninas adolescentes.
“E um de nossos repórteres de tecnologia notou que o chefe do Instagram estava ouvindo e disse: ‘ei, não sei se você quer conversar, mas provavelmente temos algumas perguntas para você’. Eles realmente deram a notícia em um Twitter Space porque o chefe do Instagram disse ao vivo: ‘Na verdade, acho que o Instagram para crianças é uma boa ideia e ainda devemos fazê-lo. E este foi um projeto que o Facebook havia engavetado'”, disse Penman.
O Clubhouse, que existe há dois anos, viu uma oportunidade no engajamento de jornalistas na plataforma. Tanto que contratou a jornalista Nina Gregory, com mais de 15 anos na NPR, como diretora de Notícias e Parcerias com a Mídia com o desafio de engajar jornalistas e organizações jornalísticas no Clubhouse.
“Passei muitos anos lendo estudos sobre o que os consumidores de notícias queriam. Eles queriam que as notícias se iluminassem e fossem mais profundas. E sinto que fomos capazes de experimentar essas duas coisas”, disse Gregory. “[O público] se torna parte da conversa. Portanto, também é uma relação diferente apenas porque você não está com áudio linear. Quer seja rádio ou podcasting que você está falando, você não está falando. Então eu acho que assim como você teria uma conversa normal com uma pessoa, eles são mais como uma pessoa humana normal. E as pessoas respondem.”