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Diversidade vai muito além de gênero e deve ser abordada desde uma perspectiva ampla no jornalismo, dizem painelistas em webinar

O primeiro webinar realizado pela recém-criada Red para la Diversidad en el Periodismo Latinoamericano (Rede para a Diversidade no Jornalismo Latino-Americano) tratou dos mitos sobre a diversidade no jornalismo e trouxe lições sobre como superá-los. As jornalistas Lucia Solis, Ana Acosta e María Eugenia Ludueña compartilharam reflexões e boas práticas da aplicação da abordagem de diversidade no jornalismo na conversa em espanhol que aconteceu no dia 26 de janeiro.

O primeiro mito desmantelado pelas jornalistas foi de que “o enfoque de direitos humanos faz com que o jornalismo não seja neutro e seja a favor de certas pessoas ou grupos”. Segundo Solis, jornalista e editora de gênero peruana e mediadora da conversa, “a cobertura jornalística da diversidade não faz mais do que visibilizar quem historicamente não foi visível”. Já Ludueña, codiretora da Agencia Presentes, destacou que “jornalistas não podemos permanecer neutros perante violações de direitos humanos”.

“Sim, podemos oferecer informação verificada, checada, de excelente qualidade, e relaciono isso com outro direito humano, que é o direito à comunicação. Fala-se menos deste direito humano, e também em relação a ele estão postas muitas desigualdades de gênero”, disse ela.

Solis lembrou que a cobertura jornalística da diversidade também busca “educar a opinião pública sobre o que são os direitos humanos, porque parece que ainda não há um consenso entre o que são direitos e o que são privilégios. Então por isso é tão importante entender o que são realmente [os direitos humanos]”, afirmou.

Sobre o segundo mito, “a diversidade no jornalismo só é possível em meios nativos digitais, alternativos ou independentes”, Acosta, editora do meio comunitário equatoriano Wambra e cofundadora do Festival Zarelia, lembrou que nos últimos anos de fato surgiram muitos meios nativos digitais fundados e liderados por mulheres e com enfoque de gênero. Com estes meios, emergiram também histórias e formas de narrar distintas, disse ela, por e sobre “pessoas que antes eram praticamente invisíveis nos meios tradicionais”.

screenshots of three panelists from the red diversidad webinar

As jornalistas María Eugenia Ludueña, Lucia Solis e Ana Acosta durante o webinar. (Captura de tela)

 

 

“A América Latina é uma das regiões onde há uma concentração midiática que impediu muito o acesso de uma diversidade de pessoas [aos meios de comunicação]. Então parece que esse mito é uma realidade, porque os meios [independentes] foram construindo isso e disputando essas narrativas dominantes. Mas isso não quer dizer que não seja possível. O que os meios [independentes] possibilitaram e mostraram é que isso é algo que se pode fazer [nos meios tradicionais]”, disse ela.

Para Acosta, nos últimos anos tem havido “uma espécie de contágio” dos meios nativos para os meios tradicionais na abordagem da diversidade. “O público tem forçado [os meios tradicionais] a fazê-lo. Quase parece não se tratar de uma decisão vinda da direção, mas sim parece se tratar de uma pressão do próprio público, das próprias pessoas que estão dizendo ‘olha só, aqui existe uma realidade que vocês não estão contando, e por isso vocês estão ficando no passado’”, afirmou.

O terceiro mito, “quando falamos de diversidade no jornalismo, nos referimos somente a gênero e diversidade sexual”, pode ser desconstruído por meio de uma abordagem interseccional da diversidade, comentou Ludueña. Ela citou reportagens da Agencia Presentes que tratam das interseções entre fatores identitários e sociais como idade, raça, etnia e origem, para além de gênero e sexualidade.

“A identidade não é feita de uma só camada, e pensar que a diversidade também é feita de uma só camada é restritivo e pode ser inclusive uma armadilha que nos limita no modo de olhar”, disse ela. “Quando começamos a olhar para a diversidade desde esse ponto de vista interseccional, as coisas se tornam mais complexas e mais interessantes.”

Acosta criticou a prática de alguns meios de apenas criar uma editoria “mulheres”, sem promover mudanças na abordagem das notícias e do conteúdo e na própria equipe.

“A diversidade implica propor um enfoque por meio do qual você se pergunta e se questiona sobre certas formas nas quais se constrói um meio de comunicação e como se exerce a prática jornalística. Então falamos de uma interpelação aos conteúdos, sim, que implica presença e visibilidade [de determinados temas e identidades], mas não somente nos conteúdos. Implica uma transformação e uma disputa também de como narramos as coisas”, disse ela.

Para Ludueña, um dos principais desafios consiste justamente em “contar a diversidade da diversidade” e visibilizar experiências positivas, evitando apresentar a vivência da diversidade apenas “como um conflito”.

“Se nos referimos a diversidade sexual, não há só uma maneira, por exemplo, de ser uma pessoa bissexual ou lésbica ou trans. Não é a mesma coisa ser gay no Rio de Janeiro, na selva guatemalteca, no sul da Argentina mapuche. Então o que temos que fazer é fugir dos estereótipos, ou tentar pelo menos ter consciência deles. Também considero importante revalorizar nossas identidades na nossa tão diversa, tão rica, tão bela América Latina, também lamentavelmente tão violenta, para que esses relatos circulem e para construir novas referências”, afirmou.

O próximo webinar em espanhol dessa série, "Como incluir mais pessoas LGBTQI+ nas redações", está agendado para 9 de fevereiro às 17 horas CST. As inscrições estão abertas neste link.

Pilar Cuartas, coordenadora de gênero e diversidade no El Espectador da Colômbia, conduzirá a discussão com Mariana Escobar Bernoske, jornalista de gênero e diversidade do El Espectador, e Felipe Morales Sierra, que trabalha na editoria judicial e no La Disidencia, o canal de diversidade sexual do El Espectador.

O terceiro webinar é "Racismo e discriminação na cobertura da migração, como enfrentá-los" e acontece no dia 23 de fevereiro às 17h CST. A jornalista mexicana Mariana Alvarado moderará o webinar com Perla Trevizo, uma jornalista mexicana especialista em migração que escreve para a ProPublica e Texas Tribune, e Nadia Sanders, uma jornalista investigativa mexicana.

O quarto e último webinar, "Perspectiva de gênero e como alcançar uma cobertura interseccional", está agendado para 9 de março às 17h CST. María Teresa Juárez, roteirista e jornalista mexicana, liderará a discussão com Aminetth Sánchez, jornalista investigativa e diretora do La Lista, e Alexa Castillo Nájera, jornalista e sexóloga.

As pessoas que participarem dos quatro webinars poderão receber um certificado de participação do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas e da Red para la Diversidad en el Periodismo Latinoamericano.