Jornalistas e acadêmicos debateram a importância de pesquisar os achados do fact-checking para descobrir quais estratégias e interesses estão por trás das informações falsas, durante o painel “Desinformação e notícias falsas: O que pode ser feito além do fact-checking?”, no Simpósio Internacional de Jornalismo Online (ISOJ), em 21 de julho.
A moderadora do painel, Talia Stroud, diretora do Center for Media Engagement da Universidade do Texas em Austin, disse que a parte complicada do modelo tradicional de fact-checking é a velocidade com que as notícias falsas chegam a centenas de milhares de pessoas.
“O conteúdo falso é difundido mais rapidamente do que a verdade. E acho que esse é um desafio crítico quando pensamos em como devemos ir além do fact-checking tradicional”, disse Stroud.
Stroud afirmou que as organizações de fact-checking estão explicando os fatos de maneira proativa por meio de áudio e formatos visuais, que é como como as pessoas geralmente consomem as notícias falsas. Ela acha que atualmente as organizações de fact-checking estão pensando em marketing e comunicação e tentando divulgar as informações de maneira mais ampla.
Nesse sentido, ela disse, as organizações devem determinar seu público-alvo, aprender a chamar a atenção da audiência com formatos que o público possa achar atraente, como gráficos, podcasts etc., pensar nas divisões existentes e, finalmente, pensar mais sobre experimentar e a repetição.
Craig Silverman, editor de mídia do BuzzFeed, disse que é necessário investigar os atores das informações falsas e a plataforma e o ecossistema que permitem que elas existam.
"Estamos no meio de um boom" de organizações de fact-checking, disse Silverman, citando o crescimento com base na pesquisa da Duke Reporters’ Lab. Ao lidar com desinformação e notícias falsas, é importante prestar atenção quando um único financiador está dominando o mercado, destacou Silverman.
Ele usou o Facebook, que tem parceiros em todo o mundo, como a Agence France Presse, como exemplo. A plataforma pede que seus parceiros verifiquem fatos específicos, frases específicas, rumores, conteúdo viral, mas não políticos. “Temos que garantir que o fact-checking tradicional não seja cooptado para servir uma parte. Quem são os atores? Quais são os sistemas, as tecnologias e outros participantes que estão permitindo a existência de todo esse ecossistema?”, questionou Silverman.
Não é mais suficiente verificar se uma afirmação é verdadeira, disse Silverman, também é preciso reportar a verdade sobre a mentira. Silverman disse que os jornalistas devem expor os maus atores, as entidades por trás de conteúdo e comportamento falso, enganoso e inautêntico, para revelar os sistemas e as táticas.
Silverman usou os casos de Roger Stone, um consultor de Donald Trump, que recentemente teve sua sentença comutada. O Facebook anunciou que removeu uma série de contas e páginas vinculadas a Stone que eram falsas. O Twitter removeu contas pelo mesmo motivo. Essas contas e páginas estavam promovendo ele e Trump, tinham uma agenda, eram autênticas, poluindo o espaço de informações sem serem necessariamente falsas, disse Silverman.
Algo que pode ser feito sobre desinformação e notícias falsas, disse Don Heider, diretor executivo do Markkula Center for Applied Ethics da Universidade de Santa Clara, é colocar um fato primeiro e dar contexto à declaração que está sendo feita, ao invés de publicar primeiro a declaração enganosa e depois dar o fato. Os jornalistas precisam parar de usar enquadramentos simplistas para cobrir questões complexas, porque muitas vezes as informações erradas usam esses mesmos enquadramentos familiares, afirmou.
“Uma das coisas sobre publicar nossas notícias principalmente em plataformas online é, eu diria, uma pressão crescente para criar histórias, publicar reportagens rapidamente e para que sejam cada vez mais breves. Portanto, a brevidade se tornou um princípio muito importante. Mas o problema disso é que muitas vezes isso pode nos levar a simplificar demais as histórias”, disse Heider.
Heider disse que os jornalistas precisam de várias habilidades para reconhecer informações falsas: alfabetização em mídias sociais, mais fundamentada nas emoções das pessoas; alfabetização científica, ao publicar uma história sobre um estudo científico; e alfabetização cerebral, relacionada ao nosso estado de espírito e à nossa vulnerabilidade à fraude e à manipulação.
Cristina Tardáguila, jornalista brasileira fundadora da Agência Lupa e diretora-adjunta da International Fact-Checking’s Network (IFCN), deu algumas idéias sobre o que pode ser feito além do fact-checking. Ela falou sobre a CoronaVirusFacts Alliance, que começou no início de 2020 após o surto na China.
Depois de enviar um email em janeiro solicitando possíveis colaborações, atualmente 99 organizações de fact-checking trabalham juntas e já fizeram mais de sete mil verificações de sobre o vírus. “Isso significa que estamos cobrindo mais de 70 países no mundo. Estamos verificando o conteúdo em mais de 40 idiomas diferentes", disse Tardáguila.
Tardáguila enfatizou a importância de trabalhar com fact-checking de forma colaborativa. "A gente não ia conseguir verificar esse conteúdo, essa quantidade de conteúdo, sozinhos, sem trabalhar juntos".
A CoronaVirusFacts Alliance possui bots de bate-papo no WhatsApp e também criou bancos de dados em português, espanhol e hindi. “Eu sei que o WhatsApp não é muito usado pelos falantes de inglês nos Estados Unidos, mas é uma coisa muito grande no resto do planeta. Então, conseguimos desenvolver um bot de verificação alimentado pelo banco de dados de fact-checking”, disse Tardáguila.
A desinformação está provando que os checadores precisam trabalhar mais e mais rápido, mantendo a precisão, de acordo com Tardáguila.
"Abrimos uma chamada para estudos e agora temos um grupo de pesquisadores maravilhosos que vão mergulhar fundo no banco de dados e contar boas histórias", mencionou Tardáguila.
"Não, nós não podemos ficar na unidade do fact-checking, porque parece que vamos fazer isso para todo o sempre. Então, temos que trabalhar juntos.”
Para ver a conversa completa, visite o canal do ISOJ no YouTube. Para uma lista completa de painéis, visite o site da ISOJ.