As eleições gerais de 30 de abril foram o grande teste para a recém-formada Red de Medios Alternativos del Paraguay, cujo objetivo é dar visibilidade a temas pouco divulgados pela mídia tradicional e que está "comprometida com a pluralidade de fontes de informação e com o direito à informação da cidadania"
Durante o dia da eleição, eles realizaram uma transmissão ao vivo do meio-dia às 18h que esteve disponível nas páginas de Facebook de cada um dos meios de comunicação pertencentes à rede. A rádio Fe y Alegría cedeu seus estúdios e equipamentos para realizar a transmissão, enquanto os jornalistas dos meios de comunicação conduziram o programa por meio de entrevistas, análises e conexões com colegas de reportagem de diferentes partes do país e do exterior, onde também votavam os paraguaios.
“Acima de tudo, buscamos contribuir com temas que não estiveram presentes na cobertura da grande mídia, como reivindicações sobre meio ambiente, questões fundiárias e produtivas dos povos indígenas e organizações camponesas, reivindicações de gênero, educação, saúde, uso de tecnologia, soberania energética, sobre a qual os candidatos evitavam falar ou debater", explicou Desirée Esquivel, diretora-executiva do jornal El Otro País, para a LatAm Journalism Review (LJR). “Mas nossa principal contribuição foram as tarefas de verificação de dados ou fact checking, buscando combater a desinformação, algo que a mídia tradicional e empresarial diretamente não faz”.
Dias antes, em 26 de abril – data em que se comemora no Paraguai o Dia do Jornalista – a rede teve seu lançamento oficial com um painel organizado pela Sembramedia e pela Universidade Autônoma de Assunção. Lá, foram divulgados os dez veículos de comunicação que o compõem: além do El Otro País, também estão Ciencia del Sur, El Surtidor, El Urbano, Hína, La Volanta, Made In Paraguay, OviedoPress, Periódico E’a e Revista Y.
Em sua apresentação, eles também falaram sobre o que estava previsto para o dia da eleição (30 de abril) e o especial feito no dia 24 de abril. Nesse dia, a mídia da Internet publicou, simultaneamente,reportagens investigativas,artigos de análise, entrevistas e notas de verificações de dados juntos nas redes sociais com as hashtags #EleccionesPY2023 e #Otramirada.
Para Esquivel, a experiência das #RedAlterNativa – como querem se apresentar nas redes – nestas eleições "foi muito importante, tanto para inculcar na audiência a existência e força das novas mídias digitais, quanto para perceber entre nós, os editores e jornalistas, o quanto podemos fazer unindo esforços em um trabalho de jornalismo colaborativo”.
Se houve uma lição a nível jornalístico que a pandemia da Covid-19 deixou, foi sem dúvida a importância e o valor do jornalismo colaborativo em qualquer país. O Paraguai não ficou alheio a essa realidade e, para Esquivel, é justamente essa lição que deu origem ao que hoje é a rede.
A origem da Rede pode ser encontrada em dezembro de 2022, quando o Paraguai viveu eleições internas – uma espécie de eleição primária em que cada partido elege seus representantes. No dia 11 de dezembro, uma semana antes das eleições, os meios de comunicação da rede publicaram reportagens conjuntas, mas em suas conversas perceberam que não bastava.
Embora não tenha sido um problema particularmente grave "como se sentiu no Brasil", a desinformação "está crescendo" no Paraguai, explicou Andrés Colman Gutiérrez, diretor jornalístico do El Otro País, para a LJR. Por exemplo, segundo Colmán, no contexto das eleições, temas como religião e reforma educacional foram alvo de grandes ondas de informações falsas.
Por isso, o primeiro projeto concebido como rede se concentrou quase exclusivamente na realização de exercícios de fact-checking. Aproveitando a experiência do El Surtidor com sua iniciativa La Precisa – a única focada em verificação no Paraguai –, os membros primeiro pensaram em fazer checagens dos discursos dos candidatos durante os debates presidenciais. Porém, como os debates foram cancelados devido à recusa de um deles em participar (hoje o presidente eleito), o plano da rede teve que mudar.
Como cada um dos veículos tem uma especialidade particular: seja o tipo de jornalismo que fazem (soluções, visual, dados) ou o tema que cobrem (ciência, política), a rede decidiu cobrir as eleições fazendo reportagens sobre temas relatados, levando em consideração as regiões, mas principalmente respeitando as particularidades de cada meio.
“[Fazemos] reportagens com a nossa linha, mas sempre com essa abordagem de outro olhar”, disse Colmán. “Não vamos fazer a cobertura que a mídia tradicional faz, mas vamos tentar dar mais voz ao cidadão, das organizações sociais e ter um olhar crítico sobre as eleições.”
Esquivel esclarece que, apesar do fato de a verificação ao vivo do projeto durante os debates presidenciais não ter sido realizada, os meios de comunicação da rede reconhecem a importância dessas iniciativas. Por isso, além do trabalho conjunto, cada veículo de comunicação realizou quatro checagens repartidas entre os meses de abril e maio. Da mesma forma, de mãos dadas com El Surti, farão um grande diretório da desinformação que está nas redes sociais e das verificações, e estarão disponíveis para consultas do público.
Agora que as eleições deste ano terminaram, a Rede Alternativa sabe que um trabalho mais exigente está chegando. A eleição de Santiago Peña como presidente significou a continuidade do Partido Colorado – de linha conservadora e que detém o poder há sete décadas com uma única interrupção –, o que motivou protestos, mas também mostrou que, embora não esteja unida, há forte oposição ao partido.
“Esse panorama torna ainda mais necessário o jornalismo independente e alternativo para exercer o controle cidadão, mas sobretudo para proporcionar uma comunicação que nos permita seguir construindo propostas para a construção de uma sociedade melhor”, disse Esquivel. “Nessa perspectiva, continuaremos trabalhando juntos para fortalecer nossos respectivos meios de comunicação e, ao mesmo tempo, seguiremos coordenando esforços na Rede Alternativa, com novos projetos e programas conjuntos”.