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Publicidade estatal na imprensa deve ser uma questão técnica, não política, dizem organizações após declarações do presidente peruano

Recentemente, o presidente peruano Pedro Castillo se reuniu com um grupo de jornalistas da região de Huánuco no Palácio do Governo, em Lima, e propôs que formassem sua própria agência de notícias para que recebessem dinheiro de publicidade estatal e que ele os assessoraria, como publicado pelo portal jornalístico Sudaca.

Os jornalistas regionais disseram em resposta que prometeram dar "apoio à democracia", disse o portal.

Dias antes, o presidente Castillo havia declarado aos meios de comunicação que não daria "nenhum centavo" a quem deturpasse os fatos, desinformando, publicou La República. Castillo se referiu ao vídeo que diversos meios de comunicação publicaram sobre a rejeição expressa por um grupo de pessoas que gritou "fora" ao presidente, enquanto ele almoçava em um concorrido restaurante da cidade de Arequipa, segundo o jornal. Segundo o presidente, não foi um protesto, como alguns meios de comunicação afirmaram, mas sim algumas poucas pessoas gritando.

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O presidente peruano, Pedro Castillo, dirige-se à mídia. (Captura de tela)



Na terça-feira, 7 de dezembro, o Congresso peruano votou uma moção de vacância contra o presidente Castillo para destituí-lo do cargo por incapacidade moral permanente para governar, por nomear ministros com supostos vínculos com o terrorismo, entre outros motivos. A maioria dos legisladores votantes rejeitou a moção. 

“As falas do presidente foram tremendamente infelizes, ele deu 10 passos para trás, dando de novo à publicidade uma conotação política quando tem se lutado para que seja uma questão puramente técnica”, disse Zuliana Lainez, presidente da Asociación Nacional de Periodistas del Perú (ANP), à LatAm Journalism Review (LJR). “A publicidade estatal está a cargo do Estado e deve responder aos mecanismos que, a partir do Estado, promovam a sustentabilidade de um bom ecossistema midiático”.

Nessas declarações, Castillo também expressou a sua "gratidão" aos meios de comunicação regionais do país, reconhecendo-os pelo trabalho que realizam, porque sabem quais são os "grandes problemas do país", publicou El Comercio.  

“Se você analisa o discurso do presidente e das pessoas próximas a ele no Executivo, eles têm essa dicotomia 'imprensa de Lima', com interesses políticos, versus 'imprensa regional', como a imprensa que realmente conhece 'o povo'”, disse Rodrigo Salazar, diretor executivo do Consejo de la Prensa Peruana (CPP), à LJR.

Adriana León, diretora da área de liberdade de informação do Instituto Prensa y Sociedad (IPYS) do Peru, qualificou os comentários de Castillo de "populistas".

“Os jornalistas do interior trabalham em péssimas condições, portanto, a proposta do presidente é ainda mais grave, porque ao pedir-lhes que se comprometam com a democracia em troca da publicidade estatal, o risco é que acabem servindo de amplificadores de seu governo”, disse León à LJR.

A cobertura enviesada da imprensa nas recentes eleições polarizadas no Peru deve ter criado animosidade em relação à imprensa, León refletiu.

“Castillo, como presidente, não fala com a imprensa, não dá entrevistas nem abre a porta do Palácio do Governo aos jornalistas” de Lima.

A ANP achou positivo, a princípio, quando em seu discurso de posse, em 28 de julho, Castillo propôs a descentralização da publicidade estatal, disse Lainez. 

“O modelo de distribuição da publicidade estatal no Peru precisa ser reformulado com urgência, deve ser descentralizado. Infelizmente, a publicidade estatal continua a ser utilizada com poucos critérios técnicos, e não é uma questão deste governo, essa é uma crítica que se manteve por pelo menos os últimos três ou quatro governos”.

Segundo reportagem do meio Sudaca, do governo de Alberto Fujimori (1990-2000) em diante, o investimento da publicidade estatal na imprensa diminuiu. Entre 2005-2020, de acordo com o estudo do jornalista Jaime Cordero, que fundamenta a reportagem do Sudaca, a publicidade estatal representa apenas entre 2% e 8% do faturamento total dos grandes meios de comunicação do país, como El Comercio, América TV/Canal N, Grupo La República, Grupo RPP, Latina e Grupo Expreso/Extra.

O Congresso vem discutindo desde julho deste ano uma série de modificações na Lei que regulamenta a Publicidade Estatal (Lei 28.874), promulgada em 2016, com o objetivo de torná-la mais equitativa em nível nacional, publicou a agência estadual Andina. 

A modificação da Lei 28874 incluiria critérios que considerassem duração da campanha estatal, público-alvo, cobertura, equilíbrio informativo, impacto da campanha, preço, localização dos meios e validade da autorização do Ministério dos Transportes e Comunicações, segundo publicação do La República. Essa iniciativa, disse o jornal, também busca priorizar os meios de comunicação de distritos, províncias e regiões que tenham pelo menos 50% do conteúdo de programação local .

A publicidade estatal, segundo o Congresso peruano, são todos os recursos públicos que são veiculados nos meios de comunicação do país, públicos ou privados. Podem ser campanhas sobre saúde, educação, segurança ambiental, etc. Os formatos podem ser fotografias, vídeos, ilustrações, pôsteres, spots de rádio e outros.

Quando foi apresentada um primeiro rascunho da proposta de modificação da lei, em 2019, observada pelo então presidente Francisco Sagasti, o Consejo de la Prensa Peruana (CPP) questionou, entre outros critérios, que fosse uma condição para a destinação de publicidade estatal que os meios de comunicação tenham autorização do Ministério dos Transportes e Comunicações. “Isso pode ser usado como intimidação”, observou o Conselho na época em seu site. 

O CPP sempre apoiou uma distribuição mais equitativa da publicidade estatal, que chegue a mais meios de comunicação regionais, disse Salazar. 

“O problema no Peru é que não existe um estudo de mercado aprofundado em nível nacional, que realmente reflita o alcance dos meios digitais, impressos e de rádio e televisão. Às vezes se sabe, por meio de pesquisas, qual é o alcance da imprensa em Lima, mas não se mede o alcance dos meios no interior”, explicou. 

Segundo Salazar, o CPP tem proposto que essa avaliação de mercado a nível nacional seja feita pelo Instituto Nacional de Estatística e Informática (INEI), em colaboração com uma entidade privada, de dois em dois anos, para medir o número de leitores e o alcance da imprensa do país em determinados períodos.

Lainez concorda com Salazar que as pesquisas sobre o alcance dos meios de comunicação nas províncias são quase inexistentes em algumas regiões e que, consequentemente, não recebem publicidade do estado.

"Muito do que coloquialmente chamamos de 'o bolo da publicidade' é deixado para a grande mídia em Lima", disse ela.

A publicidade estatal deve ser priorizada nos locais onde é mais difícil que um meio sobreviva apenas da publicidade comercial, disse Lainez, porque estão em cidades muito remotas e com pouco movimento comercial.

“Os critérios geográficos devem ser incorporados às questões de distribuição. Também deve ser considerado um sistema de rodízio para a atribuição das verbas publicitárias, que permita sustentar fundamentalmente aqueles veículos que mantêm a informação local em pé. Isso para nós é fundamental e deve ser discutido no Executivo”, acrescentou Lainez.

Um amplo debate sobre as questões de alocação de publicidade estatal é urgente no país, disse ela.

“Precisamos remover de uma vez por todas o estigma de que a propaganda estatal pode ser usada para recompensar ou punir as linhas editoriais. Isso é terrível para a democracia”.

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