Assim como seu território exuberante de rios, lagos e florestas extensas, 67% da região de Los Ríos, no sul do Chile, é composta por "florestas" ou "semiflorestas" de notícias. Isso significa que existem condições adequadas para o exercício do jornalismo e oportunidades para que as comunidades se mantenham informadas.
"Existe uma cobertura jornalística variada e bastante sólida, graças a uma infraestrutura digital que funciona relativamente bem e à forte presença do rádio, que chega até os cantos mais distantes", disse à LatAm Journalism Review (LJR) Sebastián Gallardo, diretor do meio digital nativo noticiaslosrios.cl.
Ilustração do mapa chileno para o estudo "Desertos de Notícias". As áreas em laranja representam os desertos de notícias. (Captura de tela)
Embora Los Ríos seja um caso positivo para o jornalismo no país sul-americano, infelizmente não é a regra.
Um estudo recente liderado pela Fundação Gabo revelou que 47,5% de todas as comunas chilenas — a menor unidade territorial do país — são desertos de notícias, e 26,1% são semidesertos.
Esses "ecossistemas áridos" são lugares onde não existem condições para exercer o jornalismo, o que se reflete na falta de veículos de comunicação, mas também na cobertura oferecida pelos poucos que existem.
"Não há condições para que a população que vive nesses municípios tenha acesso a informações de interesse público local", disse à LJR Alberto Arellano, diretor do Centro de Investigação e Projetos Jornalísticos (CIP) da Universidade Diego Portales. Arellano e a jornalista Francisca Skoknic foram os líderes do estudo no Chile.
O estudo da Fundação Gabo também analisou os cenários jornalísticos da Argentina, Colômbia, México e Peru. O Chile apresentou a maior porcentagem de desertos de notícias.
"Sabíamos que íamos encontrar um número significativo de desertos, entendendo que há uma centralização tremenda no funcionamento dos meios de comunicação no Chile, e que essa centralização, mesmo em nível microscópico, também se replica nas regiões", disse Arellano.
Considerando que esta é a primeira vez que essa pesquisa é realizada em nível nacional no Chile, Arellano destacou sua importância para fazer um diagnóstico que permita "frear a desertificação midiática" do país e transformá-lo em territórios "mais florestados".
A ideia da pesquisa regional surgiu após a publicação de El Hormiguero, um estudo da Fundação Gabo que mapeou os veículos nativos digitais da América Latina. Esse estudo mostrou a vitalidade dos ecossistemas midiáticos, mas também as "profundas lacunas" no acesso à informação de qualidade, segundo disse à LJR Miguel Montes Camacho, diretor de programas da Fundação.
Para realizar o estudo, o CIP contatou 26 pesquisadores representando as 16 regiões do Chile. Eles conseguiram identificar 802 veículos de notícias que, para serem considerados como tal, deveriam publicar notícias de interesse público local e com periodicidade de pelo menos duas vezes ao mês.
Devido ao "objetivo" do estudo ser encontrar onde estão os desertos de notícias, foram excluídos os municípios da região metropolitana de Santiago. A decisão intencional de deixá-los de fora tem a ver com o fato de serem sede dos principais veículos de comunicação, presumindo-se que sejam florestas de notícias. No entanto, os municípios periféricos da região metropolitana foram incluídos.
Uma das principais descobertas é que apenas cerca de 25% dos municípios chilenos contam com veículos de comunicação que cumprem os requisitos mínimos para as necessidades de informação local dos cidadãos.
"E o que acontece nos desertos?", questionou Arellano. "A desinformação é galopante, e as instituições públicas em geral não estão sujeitas a muita fiscalização — o papel da mídia. Então, é um problema não apenas do ponto de vista do acesso à informação das pessoas, mas também do ponto de vista da saúde da democracia."
Embora ainda seja preciso estudar as conclusões em detalhes, a pesquisa identificou uma crise econômica dos veículos de comunicação, que poderia explicar a presença desses desertos.
"Em nível estrutural, o Chile também se caracteriza por ter políticas muito fracas para promover e apoiar financeiramente os meios de comunicação, do ponto de vista das políticas públicas, e isso é algo que provavelmente pode estar contribuindo para essa situação", disse Arellano.
Nesse sentido, os veículos podem depender da publicidade oficial ou de grandes empresas, disse Arellano. Por exemplo, em regiões onde predomina a mineração, as empresas costumam ser quem domina a publicidade.
"Percebemos que em algumas regiões os meios estão muito condicionados aos poderes locais", disse Arellano.
A crise econômica leva também à precariedade trabalhista. Embora a maioria dos veículos tenha respondido que seus funcionários contam com contratos por tempo indeterminado, os pesquisadores também descobriram que o trabalho voluntário é bastante alto.
Embora isso não seja o ideal, Arellano disse que isso demonstra a importância que as pessoas dão ao jornalismo.
"A importância e a vocação disso são muito úteis, principalmente em regiões muito fragmentadas e dispersas", disse Arellano.
Outra descoberta relevante tem a ver com o papel do rádio, cuja adaptação e persistência o tornaram o meio de comunicação local dominante no Chile. Segundo o estudo, 42% dos veículos de comunicação transmitem pelo rádio.
"Embora se saiba que historicamente desempenhou um papel protagonista tanto em zonas urbanas quanto rurais para informar os chilenos, a novidade é que [o rádio] continua mantendo esse papel privilegiado apesar dos avanços das plataformas digitais", aponta o estudo.
Na dispersa região de Los Lagos, por exemplo, o rádio se torna o fator unificador, segundo o estudo. No sul do país, Los Lagos tem uma geografia variada que inclui lagos, fiordes, florestas e zonas costeiras, incluindo o arquipélago de Chiloé. Quase 30% da população vive em zonas rurais.
Por sua geografia acidentada, é difícil a criação de veículos de comunicação, segundo o estudo. 50% de seus municípios são desertos de notícias.
A Rádio Patagônia é um dos veículos que busca atender às necessidades de informação, e para isso evoluiu com a tecnologia e se adaptou a outras formas de distribuição de conteúdo. Fundada em 2004 como um projeto online, hoje se define como um veículo multimídia, ou seja, um veículo que incorpora o sistema de "rádio visual" (rádio e televisão). "O primeiro veículo da região a fazê-lo", disse Cristian Hurtado Salas, diretor e gerente geral da Rádio Patagonia, à LJR.
Puerto Montt, na região chilena de Los Lagos. (Foto: Cortesia da Rádio Patagonia)
Com sede em Puerto Montt, a capital da região, e com uma equipe de cinco jornalistas, a rádio cobre temas desde política e economia até a indústria local, como a agricultura. Além de sua frequência FM, a equipe transmite por plataformas digitais, e inclusive tem convênios com operadoras de TV a cabo para levar seu sinal a todo o Chile.
Para Hurtado, os maiores desafios da cobertura são econômicos. Segundo ele, existe uma concorrência desleal entre alguns veículos pela publicidade, mas também as regulamentações trabalhistas dificultam a contratação formal. No entanto, Hurtado está convencido do papel importante do jornalismo.
"Entendemos que a informação e a fiscalização jornalística têm um papel como parte da saúde democrática de uma sociedade", disse Hurtado.
Ao mesmo tempo em que o estudo regional revela a "crise estrutural do jornalismo", também oferece 16 recomendações organizadas em quatro eixos temáticos: fortalecimento da sustentabilidade, promoção da qualidade jornalística, garantias de segurança e proteção, e cobertura do poder local.
Karen de la Hoz Rodríguez, diretora do estudo, disse à LJR que sua revisão seria de grande importância. "Além do quadro geral, que é bastante sombrio, gostaríamos de destacar a seção de recomendações do estudo, que oferece algumas diretrizes para organizações que trabalham para fortalecer o jornalismo local."
Lançamento do estudo sobre desertos de notícias. (Foto: Fundação Gabo)
Por exemplo, recomenda-se a realização de projetos-piloto com duração de 6 a 12 meses em áreas consideradas desérticas ou semidesérticas, incluindo treinamento e recursos para implementação. Sugere-se também o apoio a projetos individuais com ferramentas para reduzir custos e encargos administrativos, bem como a oferta de treinamento sobre acesso à informação pública.
Para Alberto Arellano, um dos líderes do estudo no Chile, o caso de Los Ríos pode levar a uma conclusão "esperançosa".
"[Em Los Ríos] existe uma tendência para uma floresta de notícias, o que pode ser uma boa notícia. Poderíamos examiná-la de perto para ver quais circunstâncias ou variáveis intervêm ali para tornar aquela região específica muito mais verde do que as demais”, disse ele.
Gallardo disse que seu veículo de notícias, noticiaslosrios.cl, foi fundado em 2014 em meio ao auge da revolução digital com o objetivo de cobrir a região "desde suas menores comunas" e não apenas a capital.
"Acreditamos que as histórias locais também merecem um lugar central", disse.
O veículo – que normalmente emprega um ou dois jornalistas — cobre uma variedade de temas que vão desde desenvolvimento social e educação até reportagens políticas e policiais. No último ano, disse Gallardo, também fortaleceram suas investigações porque "a transparência é fundamental na gestão social, administrativa e política".
Apesar do progresso na cobertura e no panorama de notícias da região, Gallardo disse que ainda há trabalho a ser feito.
"Sempre haverá comunidades ou famílias isoladas que não recebem as informações locais ou nacionais necessárias, e enquanto isso ocorrer, a tarefa não estará completamente cumprida."