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Reforma do Código Penal brasileiro pode elevar pena por crime de difamação para até quatro anos de prisão

Por Isabela Fraga

Com pena mínima prevista atualmente de três meses de detenção, o crime de difamação no Brasil pode vir a ser penalizado com ao menos dois anos de prisão, se o projeto de reforma do Código Penal brasileiro, que está em tramitação no Senado, for aprovado. O agravamento das penas sugerido no projeto está na contramão do caminho apontado por diversas organizações civis e países da América Latina, que buscam descriminalizar os crimes de imprensa -- responsáveis por casos de limitação da liberdade de expressão e de condenação de diversos jornalistas no continente.

A título de comparação, a Lei de Imprensa, editada durante a ditadura militar no Brasil e revogada em 2009, previa pena de até três anos de prisão para crime de difamação -- um ano a menos do que a pena máxima para o crime proposta pela reforma do Código Penal, que prevê até quatro anos de encarceramento. Não à toa, portanto, o projeto, de autoria do senador Pedro Taques, tem sido alvo de severas críticas de juristas e magistrados.

Um dos críticos mais contundentes é o jurista e ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior, para quem a atual proposta do código traz o "risco de uma vergonha internacional", segundo o site Consultor Jurídico. Nesta quinta-feira, 28 de fevereiro, Reale Júnior participará de uma audiência pública da comissão especial do Senado que analisa a proposta de reformulação, noticiou o portal Terra.

Reale Júnior é um dos articuladores do movimento da comunidade jurídica que, em setembro de 2012, juntou mais de três mil assinaturas para pedir o "sobrestamento" do projeto -- ou seja, a interrupção da contagem do tempo para conclusão de um trabalho --, informou o Globo.

O tempo parece ser um dos maiores problemas do projeto de reforma. Em apenas oito meses, uma comissão de juristas designada pelo Senado teve de debater, pensar e escrever a parte mais geral e conceitual do direito penal, rever todos os crimes em espécie e trazer para o código todas as chamadas "legislações extravagantes", que estavam espalhadas pela constituição. A pressa foi um dos motivos para o advogado René Dotti deixar a comissão que assessorava o Senado e juntar-se ao coro de críticos da proposta, segundo o Globo.

O advogado Thiago Bottino, professor da Fundação Getúlio Vargas e membro da Comissão Permanente de Direito Penal do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), concorda. "A ideia da reforma é sistematizar os crimes, as penas etc. Em oito meses, esse trabalho fica comprometido", avaliou Bottino em entrevista por telefone ao Centro Knight. Para alguns analistas políticos tal pressa é justificada pelo fato de o presidente do Senado, José Sarney, querer que a reforma do Código Penal seja aprovada ainda sob seu mandato.

Bottino também enfatiza o absurdo das mudanças em relação aos crimes contra a honra. "Calúnia, difamação e injúria nem deveriam ser crimes. Não têm gravidade suficiente para serem discutidos na área penal, podem ser resolvidos no âmbito cível", comentou. Mas por que, então, sugeriu-se esse agravamento de pena para crimes tão controversos? "Acho que, de um modo geral, os governantes têm um pouco de medo da imprensa, um desconforto. Agravar as penas de crimes contra a honra pode vir daí".

Outras críticas ao anteprojeto que podem influenciar o trabalho da imprensa tratam dos crimes contra propriedade imaterial e crimes cibernéticos. O Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação (GPOPAI), da Universidade de São Paulo (USP), apresentou em outubro de 2012 suas propostas de alteração ao anteprojeto, que incluem o tratamento do problema da pirataria no âmbito cível -- e não criminal.

Para Bottino, o ideal é que o anteprojeto de reforma fosse retirado do Senado para que a comissão fosse reestruturada e tivesse mais tempo para trabalhar sobre o texto, incorporando as críticas. "É possível que o texto seja mudado já no Senado, mas o melhor é que ele já chegue para votação em uma forma mais madura", comentou o advogado.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog Jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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