Com três novas iniciativas, a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) busca inovar no seu trabalho com foco no combate à impunidade nos crimes contra jornalistas, monitoramento da situação da liberdade de expressão e de imprensa na região e apoio dos veículos sócios no processo de transformação digital da indústria jornalística.
Com “Lápices Inmortales” a organização procura conscientizar sobre os elevados níveis de impunidade nos crimes contra jornalistas. Uma missão que faz parte da organização há 25 anos, como explicou Ricardo Trotti, diretor executivo da SIP, à LatAm Journalism Review (LJR).
“A Lápis Imortais parte de uma ideia da SIP para combater a impunidade que envolve os crimes contra jornalistas, preocupação desta instituição há 25 anos, quando foi criado o primeiro projeto Crimes Sem Castigo Contra Jornalistas. Naquela época, o que a SIP fazia era investigar crimes que ficaram impunes, e essas investigações [...], ao longo dos anos, chegamos a apresentar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos mais de 30 crimes contra jornalistas”, disse Trotti. “Conseguimos muitas conquistas em todos os países, desde o agravamento das penas para os criminosos até a federalização dos crimes em países como o México, e também a criação de promotorias especiais para investigar crimes contra jornalistas”.
A outra parte desse trabalho, segundo Trotti, é conscientizar a comunidade internacional e o público em geral. Por isso, junto com a agência de publicidade Zubi Advertising, criaram a recente campanha que começou identificando três casos emblemáticos de assassinatos de jornalistas na região: os crimes de Irma Flaquer, da Guatemala; Carlos Lajud Catalán, da Colômbia; e Alfredo Jiménez Mota, do México.
Com parentes dos jornalistas, eles procuraram objetos que pertenceram aos repórteres para que um laboratório de Miami pudesse extrair seu DNA. Posteriormente, uma fábrica de lápis em El Salvador conseguiu incluir o DNA de jornalistas no grafite dos lápis. Na lateral de cada lápis você pode ver em memória de quem ele foi criado.
“Estou muito orgulhoso de que meu filho seja levado em consideração depois de tantos anos, depois de 15 anos, porque aqui a imprensa local e nacional parece já tê-lo esquecido”, disse à LJR José Alfredo Jiménez, pai de Alfredo. “Todos os anos nos lembramos dele, a cada 2 de abril os mesmos jornalistas, seus colegas, fazem um monumento para lembrar a cada ano o marco do seu desaparecimento. É o único evento que é realizado em memória de meu filho. Agora que o Ricardo [Trotti] me disse o que queriam fazer, fiquei muito orgulhoso que sua carreira jornalística já seja conhecida internacionalmente, que ele seja lembrado por meio de um lápis que tem seu DNA”.
Jiménez lembra que, embora seu filho nunca tenha recebido ameaças de morte, ele recebeu advertências de pessoas supostamente ligadas ao crime organizado. Alfredo Jiménez desapareceu na madrugada de 2 de abril de 2005 e, embora seu caso esteja sendo investigado na esfera federal desde o início, não houve grandes avanços e ninguém foi detido, explicou Jiménez.
“Esta eu diria que é a campanha de maior impacto”, disse Trotti. “São centenas e centenas que vamos enviar aos governos, a ideia é apresentá-los aos governos que queremos pressionar por mudanças, para que haja justiça. Também a organismos intergovernamentais como a OEA, o BID, a Unesco, um pouco para que haja consciência do assunto. E acreditamos que esses lápis, que têm um simbolismo muito forte e impactante, podem ajudar ”.
Trotti destacou que os presidentes da República Dominicana e do Panamá, na última Assembleia da SIP, assinaram com esses lápis as Declarações de Chapultepec e Salta.
A campanha, que também consiste em peças visuais, já foi reproduzida em diversas mídias impressas da região e também serão colocados cartazes em pelo menos oito cidades dos Estados Unidos.
De acordo com Trotti, até 2 de novembro - Dia Internacional pelo Fim da Impunidade de Crimes Contra Jornalistas - eles esperam promover ainda mais sua campanha dos Lápis Imortais.
Um índice para alcançar mudanças
Para a SIP, medir a liberdade de expressão e de imprensa na região sempre foi um objetivo dentro de sua missão. De fato, a organização publica relatórios trimestrais produzidos pelos relatores ou vice-presidentes regionais que possuem em cada um dos países.
Porém, com o Índice de Chapultepec, a SIP busca “ter uma avaliação diferente". "Eu diria um pouco mais científica e acadêmica sobre como as liberdades de expressão e de imprensa são afetadas pelos poderes públicos em cada um dos países. E de acordo com várias dimensões”, disse Trotti.
As quatro dimensões medidas são "cidadania informada e liberdade de expressão", "violência e impunidade", "controle da mídia" e "exercício do jornalismo".
“O que tratamos com o Índice de Chapultepec, embora a leitura mais fácil seja sempre ver um índice, um ranking de países, na verdade o que a SIP quer é que cada país se olhe como se fosse um espelho e, portanto, é por isso que existe uma análise DOFA [Pontos Fracos, Oportunidades, Pontos Fortes e Ameaças] em cada um dos países sobre as coisas, as oportunidades que têm para melhorar a situação de liberdade de imprensa e expressão e são apontadas as fragilidades que têm e como superá-las", Trotti assegurou.
“A ideia é que nos próximos anos, quando desenvolvermos o índice, um país possa se medir e se comparar ao longo dos anos. Esse é o objetivo principal. E obviamente com a ideia de que haja reformas nas políticas públicas para que a situação da liberdade de imprensa melhore ”.
Para desenvolver o índice, a SIP escolheu a Universidade Católica Andrés Bello da Venezuela como parceira, mas também conta com o apoio do Grupo Sura e da Fundação Bolívar - ambos da Colômbia - e também de Edward e Karen Seaton, dos Estados Unidos. A ferramenta para a criação do índice foi elaborada durante um ano e meio, e a primeira medição foi publicada na recente Assembleia. Para esse primeiro índice, as quatro dimensões foram avaliadas em 22 países do continente americano de maio de 2019 a abril de 2020.
“Na prática, o que fica em evidência é a forte preponderância do Poder Executivo contra a liberdade de imprensa em todos os países, na maioria dos países”, disse Trotti.
Por enquanto o projeto tem duração de três anos, mas eles esperam conseguir manter a medição. “Continuaremos enquanto tivermos o apoio dessas empresas. Acho que todos vão concordar que esta é uma ferramenta muito boa para a construção da democracia”, acrescentou Trotti.
Um desafio para impulsionar a indústria jornalística
Ciente dos desafios que a mídia enfrenta para acompanhar a transformação digital da indústria jornalística, a organização lançará em breve o SIP-Rockstar Challenge que busca conectar os problemas da mídia com o mundo das startups que podem oferecer soluções tecnológicas.
“A Rockstar é a empresa que escolhemos para unir esses dois mundos de mídia e startups, para que possam trabalhar juntos buscando soluções e fornecendo novas ferramentas tecnológicas para a mídia para que possam ter ferramentas maiores para sua transformação digital, que é um pouco o desafio da mídia neste momento”, disse Trotti.
A Rockstar é uma aceleradora e incubadora de projetos criada na Holanda, especialista em desafios desse tipo. No entanto, até agora eles não haviam trabalhado em questões relacionadas à mídia, explicou Trotti.
Atualmente, a Rockstar Colombia analisa os problemas apresentados pelos veículos sócios da SIP com o objetivo de entrar em contato com as startups e investidores de tecnologia da América Latina que têm as soluções e desejam trabalhar com a mídia.
Trotti estima que a convocatória seja lançada oficialmente no próximo mês e que sejam escolhidos 12 projetos que buscam responder a alguns dos problemas mais comuns enfrentados pela mídia, como monetização de conteúdo, publicidade, assinaturas digitais, novas formas de gestão, entre outros. Os projetos escolhidos vão passar por um período de seis meses com essas startups recebendo orientação e sugestões de contatos com possíveis parceiros, investidores, entre outros.
"Se espera que alguns novos projetos estejam instalados até abril", disse Trotti. “E ao longo desses seis meses a ideia é que tudo seja divulgado na medida em que o meio de comunicação encontre caminhos e soluções tecnológicas para os problemas”. Trotti acrescentou que o veículo escolhido deve concordar em publicar as soluções de forma que beneficiem toda a indústria e não apenas um determinado meio de comunicação.
Todos os tipos de mídia - rádio, mídia impressa, nativos digitais, televisão - poderão participar. No entanto, a SIP quer ajudar mais “as pequenas e médias mídias que têm maiores problemas e que às vezes precisam de mais recursos, porque não têm nem recursos financeiros para poder trabalhar nessas questões”, segundo Trotti.
“[A competição está] focada em detectar as necessidades dos meios de comunicação mais vulneráveis em questões econômicas, tecnológicas etc. e que às vezes são mais meios locais do que grandes meios de comunicação que podem ter distribuição nacional”, acrescentou.
As três iniciativas foram lançadas durante a 76ª Assembleia Geral da SIP, que aconteceu virtualmente de 21 a 23 de outubro.
*Esta história foi escrita originalmente em espanhol e foi traduzida por Marina Estarque.