O escritório mexicano do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (Acnudh) e vários defensores da imprensa instaram o governo mexicano a investigar os ataques relatados contra jornalistas que ocorreram no dia 7 de janeiro em Concepción, Acapulco, no estado de Guerrero.
O fotojornalista Bernardino Hernández e pelo menos três outros jornalistas foram atacados por agentes do Estado enquanto cobriam um confronto no qual forças de segurança tentaram desarmar a polícia comunitária em La Concepción, informou a revista Proceso. Onze pessoas morreram e 38 foram detidas.
A polícia do Estado espancou Hernández com coronhadas de pistola e rifle, de acordo com Proceso. Hernández disse ao Comitê de Proteção a Jornalistas (CPJ) que chegou a perder a consciência temporariamente durante o ataque.
Os policiais também roubaram os cartões de memória de sua câmera e danificaram seus equipamentos, de acordo com Proceso. Esses cartões, informou a revista, continham imagens da "operação violenta".
Hernández também disse ao CPJ que o ataque aconteceu depois que ele fotografou oficiais espancando membros da polícia comunitária, alguns dos quais estavam desarmados. Ele também disse à organização que se identificou como jornalista, mas os policiais disseram que não importava onde ele trabalhava e que "o fariam desaparecer" se ele continuasse a fotografar.
De acordo com o que o jornalista disse ao CPJ, ele sofreu uma concussão, mas nenhum dano cerebral. Ele também relatou ter machucado as pernas, o torso e a cabeça. Segundo o CPJ, o secretário estadual de saúde de Guerrero disse que o estado pagaria suas despesas médicas.
"Hernández disse que teme por sua segurança, porque ele também reconheceu alguns dos policiais estaduais de coberturas anteriores", informou o CPJ, acrescentando que a polícia federal foi designada para guardar temporariamente sua casa.
Hernández é correspondente da AP e de Cuartoscuro e colaborador de Proceso. Outros jornalistas atacados foram Jacob Morales, do jornal El Sur, Rubén Santiago, do jornal La Jornada Guerrero, Sergio Robles, da nova agência Quadratín, e Jorge Torres, de Univisión, de acordo com o Proceso.
Segundo Morales, a polícia estadual tornou-se hostil aos repórteres e tentou impedir o registro do evento, uma vez que o confronto entre agentes do Estado e polícia comunitária começou, informou SDP Noticias.
Alguns dos repórteres disseram que foram agredidos e empurrados, enquanto outros disseram que a polícia apontou suas armas para eles, de acordo com SDP Noticias. Os repórteres se queixaram ao comandante da polícia, mas ele os insultou e ameaçou, acrescentou o site.
Após o incidente, repórteres em Acapulco e Chilpancingo marcharam em protesto contra o tratamento aos jornalistas e exigiram respeito pelo jornalismo, de acordo com o jornal El Universal.
O escritório mexicano do Acnudh disse em um comunicado que, juntamente com a Comissão de Direitos Humanos do Estado de Guerrero (CDHEG), entrevistou jornalistas que relataram terem sido atacados, bem como autoridades, pessoas que foram detidas e membros da comunidade e organizações da sociedade civil.
O escritório citou Jan Jarab, representante do Acnudh no México, dizendo que era "inegável que vários jornalistas foram atacados por elementos das forças policiais ao cobrir os eventos e isso também deve ser investigado".
O Acnudh escreveu que o escritório tem evidências da "existência de violações dos direitos humanos cometidas pelas forças de segurança durante a operação, que são profundamente preocupantes". Informou receber informações sobre atos de tortura, fabricação de provas e buscas sem mandados, entre outras violações.
"Além disso, o Acnudh considera que os ataques contra jornalistas por parte das forças de segurança, especificamente contra Bernardino Hernández, que até teve de ser hospitalizado devido à gravidade de seus ferimentos, são profundamente graves", afirmou o comunicado, acrescentando que o roubo de equipamento também é preocupante.
O escritório disse que os eventos "não só constituíam um obstáculo à liberdade de expressão e ao direito de os cidadãos obterem informações independentes e plurais, mas também poderiam representar uma tentativa de esconder ou destruir provas de graves violações dos direitos humanos". Solicitou às autoridades que garantam que os jornalistas possam realizar seu trabalho "sem obstáculos e com segurança".
O CDHEG informou que abriu uma investigação sobre os supostos ataques contra repórteres e os está auxiliando.
O governo do Estado de Guerrero respondeu que os "ferimentos de Hernández" não são graves, como demonstram os relatórios médicos, "e que o evento está sendo investigado”.
O governo disse que está disponível para abordar as preocupações do Acnudh, bem como as medidas de precaução sugeridas pelo escritório, "com o inegável propósito de que os eventos em La Concepción sejam investigados com estrita adesão à lei e pleno respeito pelos direitos humanos".
Defensores da imprensa, incluindo CPJ e PEN México, condenaram os ataques contra jornalistas.
"É tarefa da polícia proteger os jornalistas, mas já vimos muitos casos no México onde a polícia é a culpada da violência contra jornalistas", disse Alexandra Ellerbeck, coordenadora do programa da América do Norte do CPJ, de acordo com o comunicado. "As autoridades devem investigar este ataque e processar qualquer oficial responsável".
Em uma nota sobre o "início ameaçador de 2018", o PEN México reportou os ataques a jornalistas em La Concepción e disse que eram evidências da impunidade no país.
A Comissão Nacional de Direitos Humanos do México (CNDH) também pediu às autoridades que garantam a integridade e o exercício do trabalho jornalístico.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.