Em #VenezuelaALaFuga (“Venezuela em fuga”, em tradução livre), os textos, vídeos, áudios e dados contam histórias de mães, pais e filhos que deixam a Venezuela devido à crise que persiste em seu país, para buscar melhores condições de vida em outras partes da América Latina.
Esta série, trabalhada em quatro etapas, tenta documentar e retratar o êxodo de venezuelanos para países como Colômbia, Equador, Peru, Brasil, Chile e Argentina. Lançada em 4 de março, esta iniciativa é uma obra conjunta do jornal El Tiempo, da Colômbia, e do portal jornalístico Efecto Cocuyo, da Venezuela. Meios como Ojo Público, do Peru, e a organização jornalística Conselho de Redação da Colômbia se somaram a esse esforço.
"Como editora da Unidade de Dados de El Tiempo, propus a Laura Weffer e Luz Mely Reyes (de Efecto Cocuyo) que nos inscrevêssemos para uma bolsa concedida pela IPYS (organização peruana Instituto Imprensa e Sociedade) para financiar projetos de investigação", disse a jornalista colombiana Ginna Morelo ao Centro Knight.
A iniciativa apresentada por Morelo, Weffer e Reyes foi uma das duas propostas vencedoras do prêmio de cinco mil dólares do IPYS em novembro de 2017. "O objetivo inicial [do projeto] é percorrer as três rotas onde os venezuelanos estão fugindo como consequência da crise no país", explicou Morelo, referindo-se a Peru, Argentina e Curaçao.
Weffer, cofundadora e diretora editorial de Efecto Cocuyo, e Morelo, também presidente do Conselho de Redação da Colômbia, foram as editoras e curadoras das entregas desta primeira fase do especial.
A colaboração transnacional entre jornalistas latino-americanos tornou-se uma prática comum nos últimos anos, especialmente desde que o mundo se tornou mais globalizado e questões como imigração ou corrupção não aderem mais a fronteiras geográficas estritas.
Para conseguir trabalhar em conjunto a edição das histórias, Weffer e Morelo usaram diferentes ferramentas. Eles usaram WhatsApp chats para se comunicar entre elas e com os colaboradores durante suas viagens. Elas também se comunicaram por meio de Skype, Google Hangout e Meet.Jit.si. As fotos e os textos da reportagens foram salvos em Drive para edição e os vídeos foram compartilhados via Dropbox e WeTransfer.
"A comunicação aberta, transparente e permanente sempre foi a chave. Sem dúvida, acho que há uma bela curva de aprendizado em tudo o que fizemos com camaradagem, profissionalismo, compreensão e solidariedade ", disse Morelo.
Morelo explicou que entender o fenômeno e sua manifestação foi fundamental para a realização do especial. Para isso, como a primeira etapa do projeto, Reyes desenvolveu três peças que tentam explicá-lo em números, disse Morelos.
De acordo com informações coletadas por Reyes, a migração de venezuelanos para outros países da América do Sul aumentou 895% entre 2015 e 2017. Quase um milhão de pessoas (925 mil) deixaram a Venezuela nos últimos dois anos. A maioria dos venezuelanos se deslocou para a Colômbia ou usou este país como uma rota de trânsito para outros destinos da região.
O primeiro depoimento publicado em 4 de março conta a história de 35 migrantes venezuelanos. Uma delas é Naycore Gallango, 37, que partiu da cidade venezuelana de Valencia, Carabobo, rumo a Tumbes, Peru, em um ônibus. Ela é especialista em enfermagem e deixou temporariamente seus três filhos, seu marido e sua mãe idosa na Venezuela, em busca de um futuro melhor para sua família.
Para esta história, Morelo e Diego Pérez, da unidade de vídeo de El Tiempo, acompanharam em sua rota os 34 migrantes cujo destino era o Peru. Além da crônica que esta viagem produziu, eles também fizeram um documentário que dividiram em cinco partes para compartilhar com o público em seus portais e através de suas redes sociais.
Sobre a realização do documentário mencionado - que leva o nome da série, “Venezuela a la Fuga”, e cuja duração é de 33 minutos - é a primeira vez que um jornal tradicional latino-americano com uma plataforma digital aposta em fazer algo desse formato, de acordo com Morelo. Ela explicou que há muitas notícias sobre o que está acontecendo na Venezuela, mas essas histórias detalhadas, com um olhar intimista e respeitoso, são poucas, e que "esse era o objetivo".
"Do lado profissional, as condições do ambiente tornavam tudo um desafio permanente. É proibido gravar abertamente na Venezuela. Faça tomadas limpas é difícil; conseguir um ritmo narrativo também é complexo, mas desde que Ginna me convidou para o projeto, propus que tínhamos que fazer um documentário", disse o diretor audiovisual de El Tiempo, Diego Pérez, ao Centro Knight.
Continuando com a cobertura das outras histórias, em outra etapa da realização do especial, a equipe de Efecto Cocuyo formada pelos jornalistas Ibis León e Ángel Colmenares cobriu a jornada de migrantes venezuelanos para o Brasil. A partir desta rota que começou em Caracas e terminou em Boa Vista, foram produzidas uma crônica e quatro histórias em vídeo.
Nos próximos dias, será publicada a reportagem do site peruano de jornalismo investigativo Ojo Público. Esta trata da migração para o Peru de venezuelanos que precisam de medicamentos, tratamentos e cuidados médicos que não podem mais acessar em seu país.
A jornalista peruana Fabiola Torres, cofundadora e editora de Ojo Público, disse ao Centro Knight que "o desabastecimento de alimentos e medicamentos gerou uma crise humanitária na Venezuela que está causando um êxodo em massa. O Peru tornou-se um destino importante porque abriu mais facilidades migratórias ".
Antes da série, Ojo Público já havia publicado algumas histórias sobre venezuelanos que saíam de seu país, como os migrantes venezuelanos com HIV. E para este especial, o site peruano está trabalhando em questões que já havia identificado como conseqüência da crise geral que a Venezuela vem enfrentando nos últimos anos, como a busca de atendimento médico em outros países, explicou Torres. A história que vão publicar nesta semana trata de crianças venezuelanas com doenças crônicas que estão solicitando seu cartão de imigração no Peru por causa da gravidade de seu estado de saúde.
"Este projeto busca poder dar um panorama bastante claro e completo do que é o fenômeno do êxodo venezuelano para a América Latina. Uma das maiores ondas de migração nos últimos anos, que está relacionada à crise humanitária que a Venezuela vive, embora o governo [venezuelano] não o reconheça oficialmente ", disse Torres.
Ela também disse que o que se pretende com este especial é "ir além das histórias descritivas e poder estabelecer certos dados específicos sobre o número de migrantes, rotas, dificuldades e facilidades legais que vivem em cada país".
Sobre uma segunda fase do projeto, Morelo revelou que eles propuseram conseguir mais histórias de venezuelanos em outras latitudes. "Estamos prestes a subir para o site uma do México. Laura Weffer criou uma conta de email e esperamos que mais material chegue por lá", disse Morelo, enquanto diz que continuarão a cobrir mais rotas dessa migração massiva. No momento, estão trabalhando em uma história de venezuelanos na Bolívia, acrescentou.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.