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Com caso da Colômbia, SIP lança campanha para exigir fim da impunidade de crimes contra jornalistas na região

Com o assassinato de Gerardo Bedoya Borrero, diretor da seção de Opinião do jornal El País, de Cali, na Colômbia, partia a última voz forte de protesto em Cali, segundo Ana Arana jornalista que investigou seu assassinato. Na noite de 20 de março de 1997, Bedoya Borrero estava saindo de um complexo de apartamentos quando levou pelo menos cinco tiros no abdômen. As autoridades não definiram se houve um ou dois assassinos.

O jornalista, também colunista do jornal, ficou conhecido por suas críticas à classe política corrupta e ao tráfico de drogas, incluindo denúncias sobre as ligações do crime organizado com diversos atores do Estado. Vinte e sete anos depois, a verdade sobre o seu crime não é conhecida: nem os autores materiais nem os autores intelectuais foram descobertos. Até abril de 2020, a investigação de seu crime permaneceu em fase de coleta de provas.

A impunidade no caso Bedoya Borrero o levou a ser escolhido como o primeiro a ser destacado na mais recente campanha da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP). “Vozes que exigem justiça” (“Voces que reclaman justicia”, em espanhol).

O principal objetivo da campanha lançada no dia 18 de março é “resgatar a memória de dezenas de jornalistas assassinados na América Latina nas últimas décadas”, disse Carlos Lauría, diretor executivo da SIP, à LatAm Journalism Review (LJR).

Segundo Lauría, o mesmo desta campanha também se manifesta no trabalho que a SIP vem realizando há anos para combater a impunidade nos crimes contra jornalistas na região. Parte deste trabalho inclui, por exemplo, a apresentação de casos perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

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Periodista colombiano Gerardo Bedoya Borrero asesinado en 1997. Su crimen sigue en impunidad. (Foto: Archivo El País de Cali)

Foi exatamente isso que a organização fez com o crime de Bedoya Borrero. Em 23 de setembro de 1999, a SIP apresentou o caso perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) alegando a responsabilidade do Estado colombiano no assassinato do jornalista e a falta de investigação e punição dos responsáveis.

Após anos de diálogo entre a SIP como representante das vítimas, o Estado colombiano e a CIDH, as partes chegaram a um acordo em 16 de agosto de 2019. Como parte do Acordo de Solução Amigável, o Estado reconheceu a sua responsabilidade internacional pela falta de investigação do crime, entre outras violações dos direitos humanos.

No dia 30 de setembro de 2019, em evento público, além de reconhecer esta responsabilidade, o Estado colombiano pediu desculpas aos seus familiares.

Pedimos desculpas pela violação dos direitos humanos de que foram vítimas Gerardo Bedoya Borrero e sua família.. Esse episódio nunca deveria ter acontecido. E não se deve repetir, num Estado social de direito em que a proteção da vida, a integridade pessoal, o acesso à justiça e a liberdade de expressão são pilares essenciais de uma sociedade democrática", afirmou aquele que era então o Conselheiro Presidencial para a Humanidade Direitos e Assuntos Internacionais, Francisco Barbosa Delgado.

Dois anos antes, em março de 2017, o assassinato de Bedoya Borrero foi declarado um crime contra a humanidade, impedindo a sua prescrição.

Contudo, apesar da solução amigável e da imprescritibilidade do crime, este continua impune.

“Precisamente, a iniciativa tem a ver fundamentalmente com perseverar nesta exigência de justiça face a um alto nível de impunidade na maioria dos países onde jornalistas são assassinados”, disse Lauría, que destacou que a falta de procura de justiça é um problema comum nos países da região.

“O agravante da impunidade na questão da violência contra jornalistas é que, aqueles que cometem este tipo de atos, vendo que não há punição para os responsáveis, sentem que tem luz verde e que podem continuar cometendo este tipo de crimes abertamente sem serem punidos, sem receberem justiça. Portanto, esta é uma reivindicação permanente”, acrescentou.

Para Vicky Perea, diretora do El País, a escolha do caso Bedoya Borrero é “uma honra” não só para os meios de comunicação em que o jornalista trabalhou, mas para a sociedade de Cali.

“O seu caso é o mais claro exemplo de impunidade do sistema de Justiça colombiano por crimes cometidos contra a liberdade de imprensa”, disse Perea à LJR. “Gerardo, desde sua coluna, manteve uma posição clara e frontal contra a corrupção na política, o tráfico de drogas, seus vínculos com diversos atores do Estado, inclusive as suas Forças Armadas, e contra todos aqueles fenômenos que na época ameaçavam e afetavam de forma muito maneira séria a vida dos colombianos, o Valle del Cauca e Cali.”

Perea destacou também a falta de diligência das forças da ordem, apesar da declaração de crime contra a humanidade.

“Ao apresentar novamente o seu caso ao público, através de ‘Vozes que exigem justiça’, espera-se que o seu processo judicial seja reativado e agora seja possível saber quem foram os autores intelectuais do seu crime, quem foram os autores materiais e finalmente se faça justiça a ele, à sua família, ao jornal El País de Cali, ao jornalismo colombiano e ao exercício da imprensa livre no mundo”, concluiu Perea.

A campanha da SIP destacará a cada mês um caso em que a justiça não foi alcançada e, desta forma, prestará homenagem ao seu trabalho e ao seu legado, sem esquecer a exigência de justiça, explicou Lauría.

Os membros da SIP são convidados a aderirem à campanha de diversas formas, seja republicando o comunicado que destaca cada jornalista, fazendo suas próprias reportagens sobre o caso, com editoriais, etc. Este mesmo convite se estende à sociedade civil em geral, às organizações que defendem a liberdade de imprensa e aos meios de comunicação que não são membros da SIP.

“[Ecoando] uma mensagem da presidente do subcomitê de impunidade (da SIP, Andrea Miranda), convidamos todos aqueles que entendem e apreciam o trabalho jornalístico e que estão conscientes da importância da administração da justiça nos crimes contra jornalistas e que querem contribuir para manter viva a memória dos nossos colegas caídos”, disse Lauría.

Perea, do El País, destaca a importância do projeto para continuar a luta contra a impunidade, que considera o “pior inimigo” da liberdade de imprensa.

“São múltiplos os casos que não ficaram impunes ou nos quais o aparelho judiciário dos países foi obrigado a não encerrar as investigações porque a SIP exerceu a pressão necessária sobre os Estados ou seus poderes judiciários”, disse Perea. “As vozes e palavras daqueles que foram assassinados por exercerem a profissão de jornalista e cumprirem o trabalho de serem porta-vozes da sociedade devem continuar na memória coletiva até que lhes seja feita justiça”.

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