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Ferramenta jornalística impulsiona investigações transfronteiriças de dados na América Latina

Quando um grupo de jornalistas investigativos latino-americanos começou a rastrear a empresa costarriquenha Constructora Meco, uma das primeiras ferramentas que consultaram foi a NINA.

Bastou inserir o nome da empresa nesta plataforma para revelar uma complexa rede de operações comerciais e contratos governamentais em vários países da região, incluindo não só a Costa Rica, mas também Panamá, Colômbia, Nicarágua, El Salvador, Guatemala, Honduras e Belize. Foi assim que nasceu “Tras los pasos de Meco,” (Nos passos da Meco), uma investigação conjunta entre CRHoy, Foco Panamá e El Espectador da Colômbia, em aliança com o Centro Latino-Americano de Investigação Jornalística (CLIP, na sigla em espanhol).

"NINA é uma plataforma que conecta diferentes bases de dados abertas para encontrar conexões entre empresas e indivíduos que são contratados por governos na América Latina", disse à Latam Journalism Review (LJR) Emiliana Garcia, gerente geral do CLIP.

A plataforma NINA posiciona-se como aliada dos repórteres investigativos num momento em que o jornalismo latino-americano está em crise devido, em parte, à falta de financiamento e às restrições impostas à imprensa independente. Desenvolvida pelo CLIP, esta ferramenta permite que jornalistas acessem bases de dados abertas sobre contratos, empresas e sanções de 21 países e cruzem informações importantes para revelar supostas redes de corrupção e outras possíveis irregularidades, economizando tempo e dinheiro.

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Equipe do Centro Latino-Americano de Jornalismo Investigativo (Foto: Cortesia)

"Nós recomendamos aos jornalistas que usem a ferramenta diariamente. Ou seja, que sempre que começam uma investigação acessem a NINA para ver se encontram algo. Esse é realmente o seu poder", disse García.

Por exemplo, o codiretor e editor do site da Guatemala No Ficción, Oswaldo Hernández, disse à LJR que eles estão cada vez mais familiarizados com as buscas na NINA, o que lhes permitiu iniciar e até descartar reportagens investigativas.

"Em uma ocasião, conseguimos verificar graças à NINA que uma representante legal de uma empresa era na verdade um nó dentro de um sistema de contratos municipais", disse Hernández. "No final,  a reportagem foi descartada porque não conseguimos validar nossa hipótese inicial, mas confirmamos que a pessoa tinha essa vinculação".

NINA também tem sido utilizada em investigações transfronteiriças sobre conflitos relacionados ao lítio no Chile e na Argentina ou sobre consultores que estão disseminando agendas políticas enganosas na região.

Como usar a NINA

Landing page NINA

Os usuários da NINA podem visualizar informações sobre empresas, entidades, indivíduos, contratos e documentos. (Foto: Captura de tela)

NINA contém as bases de dados do OpenCorporates, Open Sanctions, Poderopedia Venezuela, Projeto de Informação sobre Crime Organizado e Corrupção (OCCRP, na sigla em inglês), entre outros. Por sua vez, eles se conectam com registros públicos e bancos de dados internos de diversos meios de comunicação como, por exemplo, o de contratações públicas criado pelo Ojo Público no Peru.

O acesso à NINA exige registro e fornecimento de informações sobre o veículo em que se trabalha, o país de residência e a nacionalidade. Uma vez dentro, os usuários podem consultar informações sobre empresas, entidades, pessoas, contratos e documentos. Atualmente, a plataforma conta com 400 usuários.

A ferramenta permite visualizar dados estruturados. Ou seja, dados organizados em tabelas. Também oferece dados não estruturados, como imagens, PDFs, documentos do Word, e-mails e muito mais.

A NINA também oferece a opção de utilizar sua Interface de Programação de Aplicativos, API, para que seus usuários possam realizar pesquisas em suas próprias plataformas. No entanto, esta opção requer autorização de uso pela equipe do CLIP, pois só é permitido o acesso a jornalistas ou pesquisadores.

A equipe do CLIP também oferece assessoria gratuita aos jornalistas que queiram cruzar informações com dados da NINA, mas não têm conhecimento tecnológico ou capacidade financeira para fazê-lo.

Economizando tempo e dinheiro

O jornalismo atual vive uma crise de sustentabilidade como nunca antes: aprovação de leis que impõem restrições aos veículos independentes, baixos salários, suspensão do apoio de ajuda estrangeira, jornalistas no exílio dedicando-se a outras profissões, etc. Portanto, investir em tecnologia está entre as necessidades menos urgentes dos meios latino-americanos atualmente.

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Alejandra Gutiérrez, diretora e cofundadora do meio de comunicação digital da Guatemala Ocote, disse à LJR que sua equipe tem usado a NINA em suas investigações. (Foto: Cortesia)

No entanto, a equipe do CLIP assumiu a tarefa nos últimos cinco anos de manter e melhorar sua ferramenta, seguindo assim sua premissa de produzir notícias colaborativas transfronteiriças e colocar suas inovações tecnológicas a serviço do jornalismo na região.

"A primeira fase da NINA foi concluída em 2020, mas nestes anos fizemos muitas melhorias, como adicionar novos dados e aperfeiçoar o front end [o que o usuário vê] da NINA", disse García. "Isso permitiu o avanço de muitas investigações na América Latina".

O CLIP conseguiu construir a NINA graças a uma bolsa da Google News Initiative. A criação, desenvolvimento e execução da ferramenta, que durou aproximadamente um ano, custou US$ 150 mil.

Isto sem contar com pagamentos a recursos humanos ou manutenções posteriores. Segundo García, são necessários entre US$3 mil e US$4 mil por mês para mantê-la funcionando.

"Desenvolver tecnologia é caro porque é preciso pagar por um servidor, é preciso memória, é preciso velocidade", explicou García. "Quanto maior o número de usuários, maior o número de buscas, ou seja, quanto maior o número de solicitações, o servidor tem uma velocidade diferente e uma carregamento diferente e isso custa mais dinheiro".

NINA também contém os dados do Sayari, um banco de dados com acesso a registros públicos, inteligência financeira e informações comerciais estruturadas de milhões de empresas em todo o mundo. O uso individual do Sayari exige pagamento em dólares, porém o CLIP paga uma assinatura anual e o disponibiliza gratuitamente aos jornalistas.

A NINA não só economiza dinheiro, mas também tempo. Uma de suas novidades é um chatbot de inteligência artificial que fornece resultados mais analíticos e precisos. Isso permite que o jornalista avance mais rapidamente em suas investigações, pois economiza tempo na leitura de documentos.

A diretora e cofundadora do veículo digital da Guatemala Ocote, Alejandra Gutiérrez, disse à LJR que antes da chegada desta ferramenta eles tinham que ir a cada base de dados individualmente, mas agora podem cruzar informações com diversas fontes em minutos.

"Economizamos muitas horas de trabalho, de busca de documentos", disse Gutiérrez. "Agora, com a integração dos dados da Guatemala, temos concentradas em um só lugar todas, ou as principais, fontes de informação jornalística".

Traduzido por Marta Szpacenkopf
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