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Jornalistas cidadãos preenchem o vazio informativo nos protestos venezuelanos

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  • 14 março, 2014

Este artigo foi originalmente publicado em inglês no site Journalism for Change, uma plataforma focada em cobrir notícias relacionadas ao jornalismo cidadão. Siga-los no Twitter @journoforchange.

Por Luis Carlos Díaz

Em 12 de fevereiro, os violentos protestos em Caracas resultaram na morte de três pessoas. Algumas testemunhas enviaram vídeos e fotografias dos eventos ao jornal Últimas Noticias, que rapidamente publicou o material online. A gravação mostra forças policiais uniformizadas e pessoas com roupas de civis disparando contra manifestantes, uma versão dos fatos bastante distinta da apresentada pelos meios estatais. Como na Ucrânia e em outros países em conflito, as redes sociais e o jornalismo cidadão estão exercendo um papel crucial de difundir a verdade.

Os protestos na Venezuela começaram em 4 de fevereiro depois que as exigências de vários estudantes universitários em Táchira foram reprimidas. Pediam maior segurança em seu campus depois de uma tentativa de estupro contra uma estudante. Vários jovens foram presos durante essas manifestações iniciais, que em pouco tempo se espalharam pelas principais cidades do país, onde também foram recebidas com repressão pelas autoridades. O líder político de oposição Leopoldo López foi preso em 18 de fevereiro, acusado de incitar os protestos e instigar a violência.

O conflito levou à morte de pelo menos 20 pessoas, deixou 2.382 feridos e levou à prisão mais de 1.250 manifestantes e ativistas. Desde o começo, a mídia esteve notadamente ausente e muitos venezuelanos ficaram sem informação sobre o que estava ocorrendo dentro de seu país.

Mas para muitos com acesso à Internet, os meios cidadãos ajudaram a preencher o vazio informativo. Estima-se que Venezuela, com uma população de 29 milhões de pessoas, conta com mais de 12 milhões de usuários conectados à Internet: 10,5 milhões deles têm uma conta de Facebook e entre 3 e 4 milhões, uma de Twitter. A Internet tem sido o principal meio de comunicação e vem permitindo que os usuários respondam rapidamente às mudanças nos eventos. A jornalista e advogada Marianne Diaz de Global Voices Advocacy fez um chamado aos usuários do Twitter para que reportem casos de censura através de Herdict, um site que recompila informação sobre incidentes de censura na web em tempo real. Twitter tem sido uma fonte valiosa de vídeos, fotos, opiniões e humor, bem como de uma enorme quantidade de dados misturados e sem organização.

Durante os primeiros dias dos protestos, Conatel, a agência oficial de telecomunicações na Venezuela, advertiu os canais de rádio e televisão para que não cobrissem os protestos em uma tentativa de impedir que eles se espalhassem. Os veículos estatais produziram uma versão parcial dos eventos; a maioria dos meios privados se autocensuraram. A rede de televisão a cabo NTN24 foi retirada do ar em 12 de fevereiro após sua cobertura dos eventos. As vozes da oposição permaneceram sem ser ouvidas -- inclusive nos programas que supostamente oferecem opinião e comentários -- e os protestos foram mostrados nas notícias só para apresentar as figuras da oposição e os manifestantes como indivíduos violentos e de maneiras negativas. Em 21 de fevereiro, houve relatos de que a Internet em Táchira teria sido bloqueada. Também houve relatos de apagões elétricos.

A imprensa continua sofrendo com a escassez de papel jornal, o que já resultou no fechamento de vários jornais por todo o país e na redução do número de páginas impressas dos principais veículos. Em todo caso, o ciclo regular de publicação de um jornal é insuficiente e não pode oferecer cobertura adequada do que está se passando em cada cidade, em mudança a cada minuto.

Os "info-cidadãos" dão as notícias

Com as redes sociais, os cidadãos estão recebendo informação de primeira mão, frequentemente dados não processados que podem ser avaliados por sua relevância, significado e interesse jornalístico. Em outras palavras: a diferença entre jornalistas e cidadãos é seu método de verificação. Este processo ocorre ao vivo, diante dos olhos de qualquer um, com um grande número de pessoas participando no exercício de recolher e distribuir informação. Também aumenta o número de erros e informação falsa disponível na esfera pública. Contudo, as comunidades aprendem com rapidez: dado que o conhecimento coletivo se constrói rapidamente, os "info-cidadãos" e jornalistas podem elaborar um modelo colaborativo para usar proativamente durante uma crise. Algumas pessoas contribuem com dados, outras oferecem perspectivas pessoais sobre fatos específicos, e outras verificam e validam a informação. Os relatosenviados a Últimas Noticias são fortes exemplos disso, mas há muito mais.

As pessoas também estão utilizando Facebook para organizar e compartilhar informação. O aplicativo Zello foi comparado aos "walkie-talkies", já que permite enviar mensagens de áudio; outros, como Whatsapp, Telegram e BlackBerry Messenger, ajudam a alcançar uma audiência mais ampla. Mas encontrar maneiras para compartilhar mensagens que não sejam monitoradas continua sendo um desafio.

Durante a crise, o jornalismo cidadão tem sido capaz de conseguir duas coisas importantes. Em primeiro lugar, um sistema alternativo para compartilhar informação confiável entre os cidadãos foi establecido, construindo redes de confiança que se fortalecem a cada dia que passa. Em segundo, cada dado publicado através das redes sociais ajuda a fortalecer ou debilitar a reputação pública do indivíduo que compartilha a informação. Por uma parte, as mentiras e os chamados à violência são identificados e descartados da rede de confiança. Por outra, aqueles que compartilham informação útil e autêntica são reconhecidos e suas vozes começam a ser escutadas por uma audiência cada vez maior. Assim, apesar da existência de um "enxame" de comentários, reportagens e relatos de testemunhas oculares tentando preencher a lacuna de informação, há círculos e redes de confiança que emergem do barulho.

Ameaças, perigos e limites

Existem, claro, tentativas regulares de censurar as redes sociais. Em 15 de fevereiro, se relatou que os usuários do Twitter não podiam ver as fotos publicadas no site. O presidente anunciou em 22 de fevereiro que seu governo estava interceptando mensagens enviadas por Zello para recolher informação sobre protestos planejados. Antes do anúncio, 15.000 mensagens locais circulavam em um só dia. Em pouco tempo o aplicativo foi bloqueado.

O problema com a cobertura cidadã durante tempos de crise é que as comunidades estão extremadamente fragmentadas. É muito difícil desmentir os erros e corrigir a informação falsa uma vez que esteja disseminada. Cada pessoa que compartilha uma opinião ou notícia tem um preconceito político ou ideológico. E a maneira como a informação é absorvida varia conforme esses preconceitos. As notícias são distorcidas ou mal interpretadas, e chegam às redes sociais e aos sites sem ser verificadas porque são críveis e realistas.

E, como em qualquer outro lugar, aqueles com as opiniões mais extremas frequentemente se beneficiam da atenção midiática, e seus pontos de vista são difundidos, seja pelos meios novos ou pelos tradicionais. Sabem fazer mais ruído, têm argumentos fortes e costumam estar muito bem organizados, o que assegura que suas opiniões sejam amplamente difundidas. Estes fatores têm um claro impacto na qualidade das comunicações cidadãs.

O ambiente de mídia reflete os pontos de vista dos adivinhos e aqueles que procuram atiçar as chamas da violência - seja por estarem próximos do conflito ou não - mas também fornece oxigênio para aqueles que querem conhecer os fatos e a cobertura verdadeira. Ao avaliar a situação na Venezuela ou de qualquer outro lugar, é importante entender os limites das mídias sociais e do jornalismo cidadão, como os de suas promessas.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog Jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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