Por Teresa Mioli e Paola Nalvarte
Como todos os anos desde 1993, quando a UNESCO proclamou o dia 3 de maio como o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, jornalistas e defensores da liberdade de expressão na América Latina e em todo o mundo se reuniram em conferências e discutiram online a importância da liberdade de imprensa e das ameaças que ela enfrenta.
A UNESCO realizou a 25ª celebração anual do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa em Acra, Gana, em conjunto com o governo do país africano. No evento, que teve como tema “Checando o poder: Mídia, Justiça e o Estado de Direito”, a organização lançou seu relatório global para 2017/2018 “Tendências mundiais em liberdade de expressão e desenvolvimento da mídia”. O sumário do relatório está disponível em inglês e espanhol.
No contexto do evento, os Relatores Especiais Edison Lanza e David Kaye divulgaram uma declaração conjunta com outros especialistas em liberdade de expressão sobre “independência e diversidade da mídia na era digital”.
Lanza é Relator Especial sobre Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e Kaye é Relator Especial da ONU para a Liberdade de Opinião e Expressão.
A declaração aborda várias ameaças à mídia, incluindo ameaças à segurança da mídia e ameaças legais, políticas, tecnológicas e econômicas. Também aborda as responsabilidades das plataformas de mídia e online de respeitar os direitos humanos e insta-os a “melhorar seu profissionalismo e responsabilidade social”, operar de forma transparente e apoiar o trabalho independente da mídia.
Segundo a Federação de Jornalistas da América Latina e do Caribe (FEPALC, por sua sigla em espanhol), 12 jornalistas foram mortos na região até agora este ano. A organização exigiu que os governos garantam a segurança pública para os jornalistas, “que no exercício da profissão, são vítimas do crime organizado e da intolerância social, que permeiam no campo da administração pública”.
Várias organizações latino-americanas de jornalismo e liberdade de expressão organizaram eventos em 3 de maio em comemoração ao Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.
ARGENTINA
A Associação de Entidades Jornalísticas da Argentina (Adepa) criou uma campanha focada na defesa do papel do jornalismo profissional como solução para a divulgação de notícias falsas. A campanha foi difundida nas redes sociais e nos principais meios de comunicação digitais, de rádio e TV da Argentina com a hashtag #periodismoprofessionalSI e #noticiasfalsasNO.
"Mesmo nas redes sociais e plataformas de tecnologia, o jornalismo profissional ainda tem editores que respondem pelo que publicam. Liberdade de imprensa significa que o jornalismo profissional é reconhecido pelas plataformas digitais", destacou Adepa em seu site.
COLÔMBIA
A Fundação pela Liberdade de Imprensa (FLIP) na Colômbia disse que registrou 150 violações à liberdade de imprensa, afetando 177 vítimas, desde o início de 2018. Isso significa 63 ataques a mais do que o mesmo período do ano anterior. Em particular, o dia 3 de maio marcou 20 dias desde que o desaparecimento de uma equipe de jornalistas equatorianos do jornal El Comercio foi confirmado perto da fronteira Equador-Colômbia. Os jornalistas, detidos por um grupo de membros dissidentes das FARC, foram posteriormente confirmados mortos, mas seus corpos ainda não foram recuperados.
A organização está usando a hashtag #VotoInformado para incentivar candidatos e seguidores a “promover um ambiente favorável à liberdade de expressão”, já que as agressões se agravaram no período anterior às eleições presidenciais. Também criou mini-vídeos com o nome “On the Record”, no qual jornalistas colombianos renomados discutem censura.
A FLIP e a organização da liberdade de expressão Proyecto Antonio Nariño organizaram uma coletiva de imprensa conjunta em 3 de maio para discutir a liberdade de expressão na Colômbia e os objetivos para mídia, entidades públicas, audiências e jornalistas.
CUBA
O jornal cubano independente 14yMedio ressaltou que, graças à tecnologia, vários meios de comunicação independentes apareceram em Cuba nos últimos anos, apesar das fortes restrições que o governo cubano mantém sobre a imprensa há décadas. Segundo o site, esse boom nos espaços jornalísticos se deve também ao impulso de um público que exige maior diversidade de temas e ângulos. "Revistas de moda, sites dedicados ao beisebol e portais com abordagens feministas fazem parte do novo e variado ecossistema de informação".
EQUADOR
As organizações Fundamedios e Dialogando Ando organizaram a conferência “Periodismo en Riesgo” (Jornalismo em Risco) para marcar o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Os jornalistas Arturo Torres, Dolores Ochoa e Rodolfo Asar falaram sobre a prática do jornalismo no Equador e reportagens em áreas complexas. Os jornalistas também chamaram a atenção para os jornalistas desaparecidos do El Comercio, além de “centenas de vítimas equatorianas de narcotraficantes e grupos criminosos organizados que operam na fronteira norte do país”, segundo a Fundamedios.
MÉXICO
A primeira vencedora do Prêmio Breach-Valdez de Jornalismo e Direitos Humanos foi reconhecida em uma cerimônia na Cidade do México. Daniela Rea recebeu o prêmio, criado em homenagem aos jornalistas Miroslava Breach e Javier Valdez, ambos mortos em 2017 por causa de suas reportagens investigativas. Houve pequenos avanços em ambos os casos de homicídio, mas os defensores dos direitos humanos estão pressionando o governo mexicano para identificar e punir os autores intelectuais em ambos os casos.
Para a seção mexicana da Artigo 19, uma organização internacional de liberdade de expressão e da informação, a comemoração global da liberdade de imprensa deve servir para lembrar ao governo do México a dívida esquecida que tem com todos os jornalistas que perderam suas vidas enquanto realizavam seu trabalho, jornalistas que sofrem com autocensura devido à situação de violência no país e que são afetados pelas ameaças e ações do crime organizado, bem como pelas autoridades do governo.
A cada ano o México estabelece um novo recorde de ataques contra a imprensa. Entre 2009 e 2017, a Artigo 19 documentou 2.765 ataques contra jornalistas e meios de comunicação. Mais da metade deles (1.986) ocorreu durante o mandato do atual presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, que está prestes a concluir seu tempo no cargo.
PERU
O Instituto Imprensa e Sociedade (IPYS) e a União Europeia no Peru realizaram a Conferência Europa-América Latina para o Jornalismo Investigativo, que discutiu a cobertura de corrupção, crime organizado, lavagem de dinheiro e tratamento de pessoas. A conferência foi transmitida online e aconteceu até 5 de maio.
VENEZUELA
IPYS Venezuela lançou a campanha #QueNadieNosCalle (Que ninguém nos cale). Um vídeo da campanha apresenta depoimentos de pessoas cuja liberdade de expressão foi violada. O vídeo começa com Alba Cecilia Mujica, que sofreu censura interna de seu canal, Globovisión, no início de 2018, por comentar seu programa matinal sobre o suposto assassinato extrajudicial do líder opositor Óscar Pérez.
A organização pela liberdade de expressão Espacio Público também divulgou seu relatório anual de 2017 sobre a situação das liberdades de expressão e informação na Venezuela. Segundo o relatório, a organização registrou 708 casos, que totalizaram 1.002 denúncias de violações à liberdade de expressão em 2017.
INTERNACIONAL
A Rede IFEX, formada por mais de 100 organizações de liberdade de expressão e liberdade de imprensa em todo o mundo, incluindo a América Latina, lançou a campanha “Um lado da história não é suficiente”. Meios parceiros postaram fotos de líderes mundiais sendo entrevistados pela mídia, exceto que os jornalistas foram substituídos pelos próprios mandatários. Em uma conferência de imprensa, o presidente dos EUA, Donald Trump, responde a perguntas de outros Donald Trumps. O presidente russo, Vladimir Putin, pontifica para si mesmo durante uma entrevista. As fotos servem para enfatizar a importância da mídia independente capaz de resistir aos esforços para controlar a informação.
“São os vácuos de informação. As bolhas. As câmaras de eco. Às vezes, elas são criadas para nós, pelos esforços do governo para conter a mídia ou pelos algoritmos do Facebook que limitam nosso feed na rede social. Às vezes ajudamos a construí-los nós mesmos”, disse a IFEX em um comunicado à imprensa. “Eles garantem que ouvimos apenas aqueles com os quais tendemos a concordar, vozes que nunca nos deixam desconfortáveis e opiniões que reforçam a nossa. Independentemente do nome que você der, isso não é bom. Falar apenas para si mesmo - simplesmente não é saudável ”.
A International Women´s Media Foundation (IWMF) aproveitou o dia para chamar a atenção para a falta de mulheres repórteres que continua a permear o setor de notícias. Segundo a organização, o número de mulheres nas redações aumentou apenas 1% em 16 anos. Os apoiadores foram encorajados a espalhar fatos como esses nas redes sociais usando a hashtag #CheckYourBylines.
Na maioria dos países latino-americanos, a impunidade, a violência contra jornalistas e as políticas autoritárias contra a imprensa continuam sendo um problema, segundo a Repórteres Sem Fronteiras (RSF). Em seu recente ranking sobre liberdade de imprensa no mundo, a RSF classificou Cuba (ranqueada 172 de 180), México (147) e Venezuela (143) como os países com menor classificação nas Américas, e Costa Rica (10ª posição) como um dos que têm o quadro legal mais sólido sobre questões de liberdade de informação.
Segundo a ONU, na América Latina, 9 de 10 casos de ataques contra jornalistas ficam impunes. A entidade disse que 142 jornalistas foram mortos na região entre 2012 e 2016.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.