Cobrir protestos, fotografar filas para conseguir mantimentos ou fazer vídeos dentro de hospitais podem ser atitudes arriscadas para jornalistas hoje na Venezuela. Vários repórteres e fotojornalistas no país têm sido sujeitados a detenções temporárias e permanentes durante seus expedientes nos últimos meses.
Recentemente, agentes do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional da Venezuela (Sebin) deteram Matt Gutman, um correspondente da rede americana de notícias ABC, no dia 24 de outubro, enquanto ele estava fazendo uma reportagem sobre as condições de um hospital no estado de Carabobo. Gutman, além de um cinegrafista e um médico venezuelano que foram detidos com ele, foram mantidos sob custódia até a noite do dia 26 de outubro.
A ABC News confirmou a detenção do jornalista no dia 27 de outubro e comunicou que Gutman "foi liberado sem incidentes".
O Sindicato Nacional de Trabalhadores da Imprensa (SNTP, na sigla em espanhol) da Venezuela publicou no Twitter um documento que aparenta ter sido ser enviado da Direção de Migração ao Escritório de Migração do Aeroporto Internacional Simón Bolívar. O assunto do documento é "retorno voluntário" e o nome de Gutman está na lista.
O documento afirma que o "cidadão estrangeiro" está sendo expulso do país e está proibido de voltar à Venezuela.
O Instituto Imprensa e Sociedade (IPYS, na sigla em espanhol) da Venezuela informou ao Centro Knight que registrou 22 casos de detenções arbitrárias de diretores, jornalistas e fotojornalistas entre 1º de janeiro e 30 de setembro deste ano.
De acordo com a organização, a maioria das detenções foi realizada pela polícia do estado (8). As outras entidades responsáveis foram as Forças Armadas Nacionais (7), o Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin) (3), os tribunais (2) e as autoridades aeroportuárias (2).
"Detenções realizadas pelas Forças Armadas, Sebin e policiais do estado ocorreram durante a cobertura nas ruas, especificamente, durante a cobertura de protestos civis, filas de pessoas para comprar comida e cobertura fotográfica especial", disse o IPYS Venezuela.
No entanto, William Castillo, vice-ministro de Comunicação Internacional da Venezuela, disse recentemente às Nações Unidas: "Na Venezuela, não há jornalistas presos nem com processos na Justiça por produzirem reportagens, mas há donos de veículos sendo processados por difamação", informou o Efecto Cocuyo.
Inúmeras detenções temporárias e permanentes ocorreram no contexto da cobertura de protestos contra o governo, em particular durante as manifestações nacionais realizadas nos dias 1º de setembro e 26 de outubro.
O jornalista Alejandro Puglia, diretor do Escritório de Monitoramento e Avaliação do Parlamento, foi finalmente liberado no dia 26 de outubro depois de ser detido por ter utilizado um drone para tirar fotografias durante um protesto em massa, no dia 1º de setembro, em Caracas, informou a EFE.
De acordo com a agência de notícias, o governo tinha anunciado uma proibição administrativa do uso de drones dias antes.
O jornalista chileno-venezuelano Braulio Jatar Alonso ainda está preso após ter sido detido no dia 3 de setembro. Ele foi acusado de lavagem de dinheiro, mas críticos disseram que Alonso foi preso porque o Reporte Confidencial, site do qual o jornalista é diretor, publicou imagens de um protesto contra o presidente Nicolás Maduro na Ilha Margarita.
Sua irmã, Ana Julia Jatar, escreveu no dia 28 de outubro que ele está em uma prisão de alta segurança e foi "submetido a isolamento e a todos os tipos de privação física e psicológica".
As detenções não ocorrem apenas no contexto das coberturas de protestos.
Jornalistas da mídia colombiana RCN e da Red Más Noticias foram detidos em agosto por gravarem em um "corredor presidencial" em Caracas. A Defensoria Pública informou ao El Nacional que um ministro do governo afirmou que os jornalistas foram tratados como "entrevistados".
No mesmo mês, o site digital El Pitazo informou que um de seus jornalistas foi detido e espancado em San Fernando de Apure enquanto cobria um evento político convocado pela oposição.
Mariengracia Chirinos, do IPYS, disse que a maioria das prisões e detenções são curtas, enquanto outras vêm acompanhadas de procedimentos legais.
"Acreditamos que os casos mais graves de detenções que tivemos foram os que ocorreram entre setembro e outubro", disse Chirinos. Ela citou o caso de Jatar como o mais sério.
As detenções de jornalistas são apenas uma parte da deterioração da liberdade de imprensa na Venezuela, que preocupa organizações nacionais e internacionais de liberdade de expressão.
Jornalistas internacionais que tentaram entrar no país para noticiar protestos em massa têm sido detidos e proibidos de entrar por não terem a documentação adequada para trabalhar no país.
Um grupo de jornalistas relatou ter sido assaltado, ameaçado e roubado durante a tomada à força da Assembleia Nacional no dia 23 de outubro, por parte de cidadãos leais ao governo.
Escritórios dos veículos de notícias foram atacados e roubados. Jornais fecharam devido à falta de papel para impressão. Além disso, como mencionado acima, jornalistas e meios de comunicação têm sido alvos de ações judiciais.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.