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Na Colômbia, um chatbot que fala sobre dinheiro como um amigo

Como competir com as plataformas de inteligência artificial (IA) generativa mais populares na hora de esclarecer dúvidas sobre economia e finanças? O veículo digital colombiano Economía para la Pipol está tentando fazer isso com informação de qualidade, dados atualizados e linguagem clara e descontraída.

O veículo especializado em economia vai lançar no próximo mês seu próprio chatbot com inteligência artificial, que busca responder às perguntas dos usuários sobre dinheiro de forma clara e simples.

"Queremos que essa nova ferramenta do Economía para la Pipol chegue a muitas pessoas, que seja um lugar seguro para fazer perguntas sobre economia e finanças", disse à  LatAm Journalism Review (LJR) Valerie Cifuentes, diretora criativa e cofundadora do veículo. "Queremos que as pessoas percam o medo de perguntar e, através de respostas validadas por nossa equipe, possam entender melhor os assuntos, esclarecer dúvidas e formar opiniões bem informadas".

Screenshot of Colombian news outlet Economía para la Pipol website. (Photo: Screenshot)

A linguagem do chatbot seguirá o formato característico do Economía para la Pipol de explicar temas financeiros. (Foto: Captura de tela)

O chatbot, batizado de "La Pipol Bot", foi desenvolvido como parte da participação conjunta do Economía para la Pipol e da empresa de tecnologia Datasketch no programa Innovation Challenge da iniciativa JournalismAI e Google News Initiative. O objetivo da ferramenta é ajudar a diminuir a distância entre a informação econômica especializada e as pessoas comuns, segundo a descrição da ferramenta no programa.

Com esse mesmo propósito nasceu o Economía para la Pipol em 2021, disse sua cofundadora e diretora executiva, María Camila González.

"Percebíamos que a forma como as notícias econômicas eram comunicadas e contadas era direcionada para um nicho muito específico, especialmente pessoas em posições de poder, que tomam decisões e já entendem de economia", disse González à LJR.

O lançamento do chatbot está programado para 4 de setembro. Seus criadores esperam que suas características ofereçam valor agregado em termos de linguagem, confiabilidade e qualidade da informação em comparação com os grandes modelos de linguagem (LLMs, na sigla em ingles) como ChatGPT, Gemini ou Claude.

Com dados sólidos e sem alucinações

A desinformação causou estragos na Colômbia durante os protestos massivos de abril de 2021 contra um projeto de reforma tributária apresentado pelo governo do então presidente Iván Duque. A preocupação da população com a crise econômica desencadeada pela pandemia de COVID-19, a ameaça de possíveis aumentos de impostos e o uso político da informação às vésperas das eleições do ano seguinte criaram o ambiente perfeito para a proliferação de informações falsas ou enganosas.

Foi nesse contexto que nasceu o Economía para la Pipol, numa tentativa de suas fundadoras de tirar as pessoas da confusão e do medo, explicando em linguagem simples a reforma tributária, bem como conceitos básicos de economia e finanças.

"As pessoas estavam sentindo no bolso o efeito da crise econômica e queriam entender melhor o que estava acontecendo", disse González. "As pessoas nas ruas não estavam debatendo com argumentos, mas com um monte de fake news. Queríamos explicar para as pessoas, na mesma linguagem das fake news e das correntes falsas, como funciona a economia".

Quatro anos depois, já como um veículo digital consolidado e um ano antes de outras eleições presidenciais, o Economía para la Pipol busca somar seu chatbot com IA aos seus esforços de contextualizar e explicar a economia para que os colombianos tomem decisões melhores.

O "La Pipol Bot" responde perguntas dos usuários sobre economia e dinheiro através de técnicas de processamento de linguagem natural (PLN) e machine learning. É respaldado por informações que o Economía para la Pipol apurou e publicou ao longo de seus quatro anos de existência. González disse que isso o diferencia de outros sistemas de IA conversacional, cujas fontes de informação às vezes são de confiabilidade duvidosa.

"O conteúdo é muito bem selecionado e, além disso, há informações que talvez não sejam encontradas facilmente na internet porque vêm de fontes humanas", disse a jornalista. "Por exemplo, sabemos o que está acontecendo com a transição energética na Colômbia a partir de uma entrevista que fizemos com um ministro. Não são dados necessariamente fáceis de encontrar na internet. Aí há um valor agregado muito importante".

Parte das informações que alimentam o chatbot vem de uma base de dados que o Economía para la Pipol e a Datasketch construíram com mais de 900 perguntas e respostas sobre os temas que o veículo cobre.

"Se o usuário fizer perguntas que tenham algum tipo de relação com a lista de perguntas que já temos, mesmo que mude alguma terminologia, o sistema automaticamente detecta essa relação com a lista de perguntas que temos e responde a partir dela", disse à LJR Juliana Galvis, coordenadora da equipe da Datasketch no projeto.

Essa lista de perguntas será alimentada com novos conteúdos que o Economía para la Pipol for publicando, disse Galvis. No entanto, o chatbot também tem acesso a informações financeiras e econômicas oficiais da Colômbia, ao estar conectado a fontes de dados de instituições públicas como o Departamento Nacional de Estatística da Colômbia (DANE, na sigla em espanhol) e o Banco da República.

Essa conexão, disse Galvis, foi possível através de APIs (Interfaces de Programação de Aplicativos, na sigla em inglês), sistemas que funcionam como "pontes" para que dois sistemas diferentes troquem dados ou funções de forma automática.

Estar conectado a fontes de dados de instituições públicas dará ao chatbot acesso a informações que se atualizam constantemente. Isso permitirá oferecer aos usuários respostas com informações atualizadas, o que nem sempre acontece com outras plataformas de IA, disse Galvis.

"Normalmente a memória desses sistemas de IA não é tão imediata e não está tão atualizada no dia a dia, e por isso é difícil que respondam sobre assuntos que aconteceram há um dia ou há uma semana", disse. "Nos interessava que esse chatbot não ficasse defasado na alimentação de informação, e que se uma pessoa quer ter informação de um indicador hoje, possa ter a informação mais atualizada possível".

As alucinações são um dos principais problemas dos modelos de IA generativa. Elas acontecem quando o modelo não tem uma determinada informação e a "preenche", conforme os padrões de texto com os quais foi treinado, com algo que soa coerente, mas que não é real ou correto.

Colombian journalists María Camila González y Valerie Cifuentes, founders of news outlet Economía para la Pipol. (Photo: Screenshot of Economía para la Pipol website)

As jornalistas colombianas María Camila González e Valerie Cifuentes fundaram a Economía para la Pipol em 2021. (Foto: Captura de tela do site da Economía para la Pipol)

Para o Economía para la Pipol e a Datasketch era fundamental evitar que o seu chatbot desse respostas com alucinações. Por isso, o limitaram a usar apenas dois tipos de informação: os dados já verificados pela equipe jornalística e os de fontes oficiais, em vez de recorrer a informações abertas da internet como fazem os grandes modelos de linguagem.

"Se você pergunta hoje para o ChatGPT sobre algum tema conjuntural da economia na Colômbia, ele vai responder algo, certamente, mas talvez não seja completamente verdadeiro ou validado por uma equipe jornalística", disse Galvis. "Se o nosso chatbot está respondendo algo, isso com toda certeza passou por um processo de checagem previamente pelo Economía para la Pipol".

O "La Pipol Bot" também é limitado a responder perguntas sobre temas específicos do Economía para la Pipol, e os usuários que perguntarem sobre outros assuntos serão avisados sobre isso, disse Galvis.

"Se, por exemplo, um usuário pergunta algo que não tenha absolutamente nada a ver [com economia], como 'qual é o nome do presidente de tal país?', o sistema, como não associa essa pergunta com as que temos listadas, vai responder que não tem essa informação", disse Galvis.

Modelo de linguagem muito natural

Um dos fatores que distinguiu a forma como o Economía para la Pipol cobre temas de economia e finanças é a linguagem que usa, que se distancia muito da maioria dos veículos especializados nesses temas.

Essa linguagem simples e descontraída, que inclui humor, memes e gifs, se tornou um diferencial para o veículo. Inclusive levou suas fundadoras a realizar parcerias com organizações e empresas para dar consultorias em comunicação e ministrar palestras sobre temas econômicos em linguagem simples.

"O valor agregado é realmente o estilo de contar as coisas", disse González. "Pensamos em como contaríamos uma história, ou como usar muito mais o storytelling nisso e sair do formal".

E essa mesma linguagem foi a que imprimiram no "La Pipol Bot" para que tivesse coerência com o resto de seus produtos jornalísticos.

"A linguagem que usamos é ainda mais informal, é até mesmo popular", disse González. "Isso também conecta as pessoas com o chat de uma forma diferente, até mais emocional".

A forma de responder do chatbot é um dos pontos que agradaram os usuários que usaram a ferramenta nos dois testes feitos com usuários reais, um virtual e outro presencial, com pessoas convocadas através das redes sociais do Economía para la Pipol, disse González.

Outro fator mencionado nesses testes foi a credibilidade da informação, acrescentou.

"As pessoas que testaram nos disseram que usariam o chatbot do Economía para la Pipol porque acham que construímos uma confiança e uma credibilidade com nossa audiência, que acredita no jornalismo que fazemos", disse González. "Nos dizem que usariam como complemento do uso regular do ChatGPT e de outros chatbots, e isso para nós é muito, muito valioso".

Desafios no caminho

Embora o "La Pipol Bot" esteja quase pronto para o lançamento, seu desenvolvimento não esteve livre de desafios. Um dos principais desafios técnicos foi a conexão da ferramenta com as fontes de dados públicos, já que nem todas as instituições econômicas da Colômbia permitem conexão a suas bases de dados através de APIs, disse Galvis.

Embora o DANE tenha permitido essa conexão, a equipe da Datasketch enfrentou dificuldades para que o chatbot pudesse usar os dados dessa instituição.

"O Departamento de Estatísticas tem acesso à informação de uma maneira que não nos servia. As estruturas dos dados eram muito diferentes das do sistema que estávamos construindo", disse Galvis. "O que tivemos que fazer tecnicamente foi transformar a estrutura dos dados que o DANE tem para a nova estrutura que precisamos".

Screenshot of the Instagram profile of Colombian news outlet Economía para la Pipol. (Photo: Screenshot)

O estilo simples e casual do Economía para la Pipol, que inclui humor, memes e GIFs, tornou-se um trunfo para o veículo. (Foto: Captura de tela)

A equipe conseguiu que o chatbot se conectasse aos dados da maioria dos indicadores econômicos do DANE, mas não de todos os que haviam planejado. Galvis disse que numa próxima fase da ferramenta tentarão se conectar aos dados do resto dos indicadores.

Outro desafio técnico no qual a Datasketch está trabalhando é conseguir a automatização total do processo de atualização das bases de dados com conteúdo do Economía para la Pipol, já que até o momento há etapas que devem ser executadas de forma manual, acrescentou Galvis.

Conseguir a sustentabilidade financeira do chatbot é outro ponto pendente na lista. A ferramenta foi financiada com um subsídio do programa do JournalismAI, então o Economía para la Pipol e a Datasketch precisarão encontrar formas de continuar financiando o projeto, não só para mantê-lo, mas para fazê-lo crescer, disse González.

"O subsídio tem recursos limitados para esse período de tempo para desenvolver o chatbot e para o lançamento", disse a jornalista. "Agora o nosso desafio é buscar financiamento para que se sustente ao longo do tempo. E para levá-lo a outras plataformas, como por exemplo, o WhatsApp".

Traduzido por Marta Szpacenkopf
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