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Nasce novo projeto online para potencializar redes sociais na cobertura da crise venezuelana

Por Samantha Badgen

Com a meta de evitar a censura e autocensura presente nos meios venezuelanos desde os protestos que começaram em fevereiro deste ano, um grupo de profissionais latino-americanos desenvolveu um projeto pelas redes sociais que oferece notícias sobre a situação do país.

Venezuela Decoded recompila informação encontrada no Twitter em tempo real, a agrupa segundo as fontes (sejam governamentais ou da oposição) e a separa por idioma (espanhol e inglês). Também conta com uma linha do tempo criada com a ferramenta Timeline JS onde mostra os eventos mais importantes de cada dia.

Os criadores são Ana María Carrano, Mary Aviles, Douglas Gómez-Barrueta, Martín Quiroga, Eric Ortiz e Martha Olmos, um grupo de jornalistas, designers e programadores associados à Bolsa John S. Knight da Universidade de Stanford que criaram o projeto quando viram o aumento na censura e autocensura na Venezuela.

“Quando começou o conflito, se acirrou a censura e pensamos em como responder aos episódios mais chamativos de censura, como o bloqueio do sinal de NTN24 e o bloqueio temporário das imagens no Twitter”, disse Carrano em entrevista com o Centro Knight para o Jornalismo nas Américas. “O povo na Venezuela está se informando via Twitter, então estamos tentando criar um marco onde se veja tudo”.

Venezuela Decoded também responde a outros tipos de pressão enfrentados pelos meios tradicionais, como a censura direta de veículos a seus jornalistas, ou a falta de papel-jornal  por causa das fortes restrições à compra do insumo estabelecidas pelo governo venezuelano. A crise de papel levou vários jornais a reduzirem sua circulação ou até mesmo fechar.

Pressões como estas levaram muitos jornalistas venezuelanos a recorrer ao Twitter para poder divulgar os detalhes que não se publicam nos meios tradicionais. Também existem contas de Twitter que funcionam de forma paralela aos meios estatais e publicam toda a informação que é vetada nas contas oficiais. O objetivo do Venezuela Decoded é centralizar toda esta informação.

“A informação que não sai nos canais regulares encontra outra forma de sair no Twitter, como a prisão de Leopoldo López, que não foi transmitida por nenhum canal, foi como se não existisse", disse Gómez. "O Twitter foi esse dia o canal por onde a gente se informou.”

As listas de Twitter que aparecem no Venezuela Decoded funcionam em tempo real e estão compostas por fontes de vários setores, como integrantes do governo, membros da oposição, jornalistas e organizações não governamentais. A meta é formar uma história completa do que está passando com fontes variadas para que os leitores possam formar suas próprias opiniões e análises, disse Aviles.

“Temos não apenas vozes oficiais; temos jornalistas, cidadãos e queremos agregar contexto e trazer outros elementos”, acrescentou.

O lento despertar do jornalismo digital venezuelano

Segundo Carrano, Gómez e Aviles, a crise no país teve um impacto maior na transição aos meios digitais da imprensa venezuelana, que até agora vinha sendo lenta na mudança para o mundo digital, algo que ficou aparente com a falta de papel-jornal.

Com uma das conexões de internet mais lentas do continente e uma penetração bastante baixa de telefones inteligentes – em parte pelos altos preços e a falta de acesso a alguns bens no país – Carrano pensa que a ausência da Venezuela no cenário de empreendimentos jornalísticos digitais não é por falta de ideias, mas por falta de oportunidade.

“O cenário de inovação não é tão propício no país como o é no exterior”, disse a jornalista. “A situação nacional não facilita a implementação de projetos de inovação”.

Com a crise atual dando maior impulso à mudança noticiosa rumo às redes sociais, a equipe de Venezuela Decoded vê nestas plataformas o futuro do jornalismo venezuelano.

“A mídia venezuelana está em um momento muito complicado porque além da situação política, tem que aprender a se adaptar às plataformas digitais, e os jornalistas também”, disse Gómez.

Aviles acrescentou: “Tem que haver treinamento para jornalismo de dados, e mais jornalistas interessados em aprender isso”.

Planos para o futuro

Nas próximas semanas, Venezuela Decoded lançará uma nova página intitulada “Quién es quién”, na qual explicará quem são os protagonistas envolvidos no atual conflito. Martín Quiroga, arquiteto de sistemas e co-fundador do projeto, está buscando mais maneiras de filtrar a informação que se publica no site e analisar o uso de hashtags ou identificar os nomes mais usados, além de detectar padrões na informação que circula pelas contas oficiais e as da oposição.

“Outro aspecto é o tema geográfico, estamos vendo como podemos contextualizar o que está passando. Queremos fazer um mapa onde possamos sobrepor a informação para dar uma ideia da origem das fontes e dos dados que estamos conectando”, disse Quiroga.

Com mais de 5 mil visitas únicas diárias e uma conta de Twitter que já tem mais de 600 seguidores, Venezuela Decoded teve um crescimento bastante significativo nos seus primeiros dias.

“Estamos surpresos com o modo como fomos recebidos e com a cobertura da mídia”, afirmou Carrano. “O que mostra que de verdade há um espaço para isso, e nós o estamos preenchendo”.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog Jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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