texas-moody

O "apoio" do governador de Veracruz à imprensa: jornalistas mexicanos questionam prêmio

  • Por
  • 4 abril, 2013

Por Daniela Pastrana

No dia 2 de abril, o governador do estado mexicano de Tabasco, Javier Duarte, recebeu um prêmio da Associação Mexicana de Editores de Jornais (AME, na sigla em espanhol) por seu papel em "garantir a liberdade de expressão".

No entanto, durante a administração de Duarte, Veracruz tornou-se um dos dez lugares mais perigosos do mundo para a imprensa, segundo a organização Repórteres sem Fronteiras. O prêmio chocou e revoltou jornalistas de todo o país. Recentemente, um grupo de jornalistas lançou uma página no Facebook e a hashtag #ChayoPremio no Twitter para rejeitar o prêmio. Os jornais Notiver e Diario de Juárez anunciaram que sairiam da AME em protesto pelo prêmio. 

No editorial abaixo para o Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, Daniela Pastrana, jornalista independente e diretora executiva da rede Journalists on Foot, detalha a deterioração da liberdade de expressão em Veracruz nos últimos anos, a inabilidade da administração de Duarte em garantir a proteção para jornalistas, e como jornalistas têm reagido à notícia do prêmio. 


Por Daniela Pastrana

Nos últimos anos, Veracruz registrou todas as modalidades de ataques graves à imprensa: jornalistas assassinados e desaparecidos, mulheres joranlistas agredidas, ataques a meios de comunicação e jornalistas forçados ao exílio.

Desde 1 de dezembro de 2010, quando Javier Duarte foi empossado como governador do estado, foram assassinados nove jornalistas, outros dois -- pelo menos -- estão desaparecidos, dezenas se viram forçados a abandonar o estado ou largar o jornalismo por ameaças de morte, um jornal foi incendiado e praticamente todas as semanas uma nova agressão se soma à lista de ataques registrados pelas organizações de defesa da liberdade de expressão.

Os jornalistas vivem com medo e sem esperança.

"A nós, está claro que muitos crimes vão continuar impunes, que suas memórias foram contaminadas, que não veremos justiça e que a impunidade prevalecerá. Perdemos a esperança em uma atuação honrosa do governo em relação a nós", disse uma jovem jornalista de Xalapa.

Em 2 de abril, os empresários de 100 jornais regionais erunidos sob a Associação Mexicana de Editores de Jornais entregaram um prêmio ao governador Duarte por seu "apoio" à liberdade de expressão que causou surpresa entre colegas de todo o país. No Twitter, o prêmio foi batizado de "chayopremio".

 

Em meio ao horror, o governo de Veracruz -- o terceiro estado mais povoado do país e um dos nove que não viram mudança em seus governantes em oito décadas -- tentou melhorar usa imagem da única forma que conhecem os políticos veracruzanos: distribuindo dinheiro aos que falam as "coisas certas" e atacando aos que se opõem a eles.

O melhor exemplo de como "opera" o governo ocorreu há algumas semanas, quando o próprio governador Duarte criticou Félix Márquez, um jovem fotógrafo da agência Cuartoscuro, que em um mês de trabalho capturou imagens de um grupo de autodefesa no município de Tlalixcoyan, na região de Sotavento. Em um evento público, Duarte manteve a acusação feita no dia anterior por seu secretário de governo de que as imagens eram falsas.

Essa tem sido a marca da administração de Javier Duarte, que em setembro de 2011, após prender durante mais de um mês dois tuiteiros que difundiram rumores sobre ataques a escolas, promoveu uma reforma penal para penalizar aqueles que divulgam informações que possam provocar "perturbação da ordem pública".

Duarte comprou a franquia do Hay Festival para Xalapa, e para a edição de 2012 convidou célebres jornalistas internacionais. Gastou dinheiro em "medidas de segurança" e presentes para os jornalistas. Mas seu escritório de Comunicação Social mantém uma política de controle sobre os veículos por meio das pautas publicitárias, e sua voz fala nas redações, marca a agenda e exige mudanças de repórteres.

Entre maio e junho de 2012, após os assassinatos de quatro colegas, vários repórteres fugiram do estado. Era o segundo êxodo de jornalistas causado pela violência e havia tensão política pela proximidade da eleição presidencial. O governo de Duarte ofereceu a vários repórteres ameaçados o pagamento de sua estadia fora do estado "até que terminem as eleições".

No dia 7 de junho, para comemorar o Dia da Liberdade de Expressão, o governador anunciou a criação da Comissão Estatal de Atenção e Proteção de Jornalistas, em uma cerimônia onde foram rifados, entre outros presentes, cinco automóveis e dez viagens de uma semana com todos os custos cobertos para realizar um curso na Espanha.

A Comissão se formalizou em dezembro de 2012, como um órgão "autônomo" e com um financiamento de 15 milhões de pesos. Fazem parte dela duas professoras da Universidade Veracruzana -- presidenta e secretária executiva --, e oito comissionados: cinco são proprietários ou diretores de poderosos veículos regionais, dois são líderes de organizações simpáticas ao governo e apenas um, Jorge Morales, é um jornalista respeitado (ao menos até entrar na Comissão) que tem tentado tornar transparentes os gastos do órgão, e, para desgosto de muitos colegas, revelou que apenas 5,2% dos recursos serão destinados para a proteção de jornalistas, enqunato o resto será usado para pagamento de salários e gastos operativos.

Os jornalistas de Veracruz não confiam no órgão "autônomo", no entanto, o governador foi aplaudido pela Comissão Nacional de Direitos HUmanos e premiado pela Associação Mexicana de Editores de Jornais, que reune cerca de cem dos principais jornais regionais do país, incluindo sete jornais de Veracruz: El Dictamen, El Mundo de Córdoba, El Mundo de Orizaba, la Opinión de Poza Rica, Imagen de Veracruz, Notiver e AZ de Xalapa.

Em todos esses, houve ao menos um jornalista ameaçado que está desaparecido, que foi assassinado ou forçado ao exílio.

"O que sinto? Coragem, indignação e impotência", conta uma jornalista expriente. "É um governo que arrasta assassinatos de companheiros e não é possível que empresários legitimem a ideia de que existe liberdade de expressão em Veracruz, quando não há".

Não só nas questões de segurança, que já não são reflretidas na mídia, mas também em temas de transparência ou qualquer outro, sua estratégia é dizer às redações para que não se publica determinada coisa. para o governo de Duarte, os assassinatos dos jornalistas estão resolvidos.

A Procuradoria de Justiça Estatal acusou aos chefes do Notiver, Milo Vela e Yolanda Ordaz, de trabalhar para a máfia, com base em um interrogatório extrajudicial no qual seus nomes são mencionados. Os fotojornalistas Guillermo Luna, Gabriel Huge e Esteban Rodríguez, assassinados em 3 de maio de 2012, foram acusados de ter participado do homicídio de seus colegas, com base em uma estranha declaração de um de seus possíveis assassinos (segundo as autoridades, o homem disse que eles foram mortos porque haviam matado outros jornalistas).

No assassinato de Víctor Manuel Báez Chino, as autoridades culparam duas pessoas que, segundo a versão oficial, formavam parte de uma célula do grupo criminoso do narcotráfico Los Zetas, mas que não puderam se defender porque também foram assassinadas. E e no caso de Regina Martínez, a Procuradoria acusou um homem soropositivo e analfabeto pelo assassinato, que disse ao juiz que havia sido torturado para se declarar culpado. Além disso, desde o início das investigações, as autoridades assediaram os amigos da jornalista com perguntas sobre sua vida pessoal, não sobre suas investigações jornalísticas.

"O prêmio dado a Duarte é um escárnio duplo", comenta um jornalista. "Das autoridades, que não têm mais o mínimo interesse em melhorar a situação e pretendem fingir que está tudo bem em Veracruz, quando não está, e dos donos dos jornaias, que em vez de oferecer um salário melhor aos seus funcionários, preferem conferir esses prêmios que geram apenas insegurança entre os jornalistas pelo grau de impunidade em que estamos vivendo."

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

Artigos Recentes