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Quase cinco anos após assassinato do jornalista Gabriel Hernández em Honduras, autoridades ainda ‘aguardam resultados’ das investigações

Por ocasião do Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas, a LatAm Journalism Review destaca quatro casos emblemáticos na região que permanecem em grande parte impunes.

Wendy Funes, jornalista e diretora do meio Reporteros de Investigación, está convencida de que os crimes contra jornalistas em Honduras só serão resolvidos quando o próprio jornalismo os investigar.

É por isso que, quando o jornalista Leonardo Gabriel Hernández foi assassinado em 17 de março de 2019, ela e sua equipe foram a Nacaome, no departamento de Valle, no sul do país, onde o crime ocorreu. Hernández era o apresentador do programa “El Pueblo Habla” (“O Povo Fala”), e Funes queria descobrir no que ele estava trabalhando quando foi assassinado.

“Descobrimos que, entre as críticas que fazia aos políticos, ele também havia solicitado informações sobre uma estrada que, na época, custava 20 milhões de lempiras – US$ 1 milhão na época – e que parecia ter sido concluída no papel, mas a obra física não havia progredido”, disse Funes à LatAm Journalism Review (LJR). “Nossa investigação apontou para o fato de que as investigações de Gabriel e o questionamento de políticos locais causaram desconforto.”

No entanto, a linha de investigação que o Ministério Público de Honduras supostamente seguiu estava relacionada a drogas e gangues, e não ao seu trabalho jornalístico, explicou Funes. E mesmo essa linha de investigação não foi desenvolvida, disse ela. Até o momento, não há informações sobre quem foram os autores materiais e intelectuais do crime.

Essa impunidade do assassinato de Hernández é a norma para crimes contra jornalistas em Honduras. De acordo com dados de 2022 da Comissão Nacional de Direitos Humanos (Conadeh), 90% dos assassinatos de jornalistas no país estão impunes.

O Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ) tem registros de 37 assassinatos de profissionais da imprensa entre 1992 e 2023 em Honduras. Um deles é o de Hernández que, de acordo com sua classificação, está em "total impunidade".

Embora Honduras não esteja incluída no Índice Global de Impunidade 2023, para Carlos Martínez de la Serna, diretor de programas do CPJ, os números de Honduras no caso de assassinatos são "realmente trágicos".

"A impunidade também é muito alta", disse ele à LJR. "O problema que temos em Honduras é a dificuldade de investigar os casos. É muito complicado".

Uma questão com a qual Funes concorda. "As autoridades nem sequer querem nos dar acesso às informações", disse ela sobre os obstáculos durante a investigação desse e de outros crimes contra jornalistas.

Nenhuma informação sobre a investigação

Quase cinco anos após o assassinato, não está claro o que aconteceu com a investigação que está sendo realizada pela Promotoria Especial de Crimes contra a Vida do Ministério Público.

"Várias medidas investigativas foram ordenadas, como a coleta de depoimentos de membros da família e vizinhos. Os resultados dessas investigações estão sendo aguardados", disse a Promotoria à LJR.

Como o crime "ainda está em processo investigativo", a Promotoria não forneceu mais detalhes, como a situação das três pessoas que foram presas como supostos autores do assassinato. Na época, foi noticiado que essas pessoas eram membros da mara (gangue) Salvatrucha e que foram encontradas em posse da motocicleta em que supostamente teriam viajado para cometer o crime.

"Nunca se soube de nada. Nada foi dito. Silêncio total", disse à LJR Leonel García, jornalista de Nacaome que trabalhou com Hernández por 12 anos. "Autores materiais? Nenhum. Ninguém está preso aqui. Impunidade desenfreada neste país e neste departamento. [...] Os [autores] intelectuais ainda estão soltos, à vontade, nada aconteceu com eles, não descobriram nada. Eles sabiam como fazer isso".

Hernández e García compartilhavam a mesma visão do que deveria ser o jornalismo: ser a voz do povo e exigir que as autoridades cumpram seu dever. Eles começaram no mesmo programa de televisão que ambos criaram: "Dígalo como quiera" (Diga como quiser). Depois, cada um continuou com seu próprio programa – Hernández na televisão, e García, no rádio – trabalhando juntos para cobrir as notícias.

Suas investigações abrangiam desde casos de corrupção, supostas ligações de autoridades com o tráfico de drogas até problemas fundiários. Hernández, por exemplo, noticiou o suposto roubo de uma vasta área de terra de fazendeiros e pescadores por agentes públicos e deputados.

"Sempre sentimos que as balas estavam nos seguindo por causa da maneira como fazíamos nosso jornalismo, [um jornalismo] do povo, porque neste país, estar do lado do povo é um crime", disse García.

Uma das principais críticas ao Estado feitas por Funes e García foi a falta de proteção a Hernández, que, diante da vigilância e das ameaças, levou sua situação ao conhecimento do Mecanismo Nacional de Proteção aos Jornalistas.

Embora a Secretaria de Direitos Humanos não tenha respondido à LJR para esta reportagem, uma declaração para este meio em 2020 do representante do Sistema Geral de Proteção afirmou que o Mecanismo não recebeu uma solicitação de proteção por parte de Hernández. Isso é negado tanto por García quanto por Funes.

“Para mim, o assassinato do meu braço direito e do meu irmão de alma foi uma punhalada muito forte nas costas”, disse García, que após o assassinato de Hernández recebeu medidas de proteção. “A mesma instituição que me dá proteção, o mesmo Estado disse a ele 'você não se aplica', e como poderia não se aplicar se nós dois estávamos no fio da navalha! Estavam nos perseguindo. Estavam nos observando para nos assassinar. Porque estávamos tocando em questões transcendentais de pilhagem.”

Funes disse acreditar que, nos crimes contra jornalistas, o trabalho deles é frequentemente ignorado como motivo do crime.

"No caso dos jornalistas, parece que as autoridades investigam esses crimes com preconceito", disse Funes.

Embora García tente levar adiante o legado de Hernández, que ele disse ter sido uma promessa que fizeram um ao outro, a verdade é que seu assassinato causou um silenciamento em sua cidade.

"A repercussão que um crime como esse e a consequente impunidade podem ter é que os jornalistas informam com medo ou acabam se censurando para evitar represálias das autoridades locais, que, sendo autoridades, qualquer um pensaria que são responsáveis por políticas públicas para reduzir a impunidade. Isso aconteceria em um país decente, mas em Honduras muitas vezes são as autoridades que também gerenciam as células do crime organizado", disse Funes.

Para García, o progresso na investigação do crime de Hernández seria alcançado por meio de organizações internacionais e da pressão que elas poderiam exercer.

“Eu só peço e exijo que as organizações internacionais, porque não há investigação aqui em Honduras, que venham a Honduras e vejam o arquivo sobre Gabriel Hernández: quem o assassinou ou quem está na prisão e ainda não foi condenado", disse ele. "E também peço às organizações internacionais que venham e analisem minhas medidas nesse mecanismo. Eu estou preocupado.”

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