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Sociedade civil do Uruguai vai à CIDH para pedir ao governo que aplique lei de comunicação de 2014

Representantes da sociedade civil do Uruguai pediram ao seu governo que implemente efetivamente a Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual (SCA) e os envolva no desenvolvimento e implementação das diretrizes que a regulam.

Os representantes da Coalición por una Comunicación Democrática (CCD)  do Uruguai fizeram a demanda no 162º período de audiências públicas da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), realizada de 22 a 26 de maio em Buenos Aires, Argentina.

Na audiência, representantes do governo disseram que a lei tem sido aplicada desde a sua aprovação pelo Parlamento em dezembro de 2014, mas a CCD destacou a ausência de vários elementos-chave nesse processo.

Em nome da CCD, composta por mais de 30 organizações da sociedade civil que trabalham com comunicação e direitos humanos, os pesquisadores Paula Baleato e Gabriel Kaplún pediram aos Três Poderes uruguaios que explicassem o atraso na aplicação efetiva da lei SCA.

Baleato observou que 120 dias após a votação da lei, o Poder Executivo deveria ter nomeado um comitê composto por nove membros da Assembléia Geral para criar um órgão regulador das comunicações. No entanto, 800 dias depois, esse corpo ainda não foi criado, de acordo com Baleato. "Esta é uma grande ausência que também dificulta a aplicação da lei", disse ela.

O Conselho Honorário Consultivo do Serviço de Comunicação Audiovisual (Chasca) não foi criado, a defensoria para as audiências não foi implementada, e o plano nacional de educação para a mídia não foi desenvolvido, informou a CCD.

Para Kaplún, essas agências "recuperam e aprimoram os mecanismos de participação civil nos processos de implementação de políticas de comunicação". Chasca, acima de tudo, deve intervir na regulamentação da lei, segundo a própria legislação, disse Kaplún.

Essas preocupações foram expostas diante do recente anúncio do governo de uma pronta publicação da regulamentação da lei, isto é, das regras que vão reger a aplicação da norma. A regulamentação teria sido desenvolvida sem a participação da sociedade civil, de acordo com a CCD.

"A lei também prevê a criação de um fundo para promover a produção audiovisual nacional. Especialmente porque a lei visa a diversidade de conteúdo e pluralismo, e o Uruguai, mais do que outros países, tem grandes dificuldades para sustentar sua própria produção audiovisual", explicou Kaplún.

Fernanda Cardona, diretora-geral do Ministério da Indústria, Energia e Minas, e Nicolás Cendoya, da Unidade Reguladora de Serviços de Comunicação (Ursec) –ambos representantes do governo que estiveram presentes na audiência– disseram que o Estado aplicou a lei assim que ela foi promulgada.

"Agências como o Conselho e Chasca não são essenciais para a aplicação da lei", disse Cendoya.

Os representantes afirmaram que, de fevereiro de 2015 a 18 de maio de 2017, a Comissão Ursec aprovou 54 resoluções que aplicavam a lei, sem necessidade de regulamentação. De acordo com Cendoya, existem atualmente 80 casos em andamento que envolvem a aplicação da legislação. "No total, a lei foi aplicada 134 vezes, em 30 meses, o que dá uma média de 4,47 vezes por mês", disse.

Após a promulgação da norma, 29 empresas de comunicação apresentaram 29 petições de inconstitucionalidade. Muitos desses processos continuam em andamento até hoje, de acordo com Cendoya.

O Estado não podia endossar uma lei com tantos questionamentos, devido à necessidade de segurança jurídica, disse Cendoya. Portanto, até que os julgamentos sejam concluídos, a regulamentação não podia ser aprovada, disse ele.

No entanto, Kaplún considerou este atraso na elaboração da regulamentação como um "fracasso do governo". De acordo com o Supremo Tribunal, a maioria dos artigos da lei são absolutamente constitucionais, então as condições para implementar a lei estão dadas há muito tempo, disse o pesquisador.

Na sua apresentação, Cardona e Cendoya afirmaram que, ao final de grande parte dos processos judiciais contra a lei, um grupo de trabalho de 16 profissionais foi formado para desenvolver uma regulamentação inicial. Em maio, após 19 sessões de trabalho, um rascunho de 103 artigos foi submetido ao presidente da República, Tavaré Vásquez, para avaliação.

Por sua vez, o Relator Especial para a Liberdade de Expressão da CIDH, Edison Lanza, disse que a Comissão e as Nações Unidas consideraram que o processo de desenvolvimento da lei, em termos de conteúdo, respeita a liberdade de expressão.

"É uma lei que respeita a independência editorial da mídia (...) e é um exemplo para a promoção da diversidade e do pluralismo que a região carece em todas as áreas da comunicação", afirmou o relator.

No entanto, ele perguntou a Cardona e a Cendoya se há a intenção de convocar a sociedade civil para o restante do processo de implementação da regulamentação da lei.

"O que se tentou e o que a lei afirma é que aqueles que ocupem esses cargos sejam eleitos por uma maioria especial do Parlamento, tenham idoneidade, e não sejam influenciados pelos poderes que muitas vezes influenciam a comunicação. Portanto, isso permanece muito válido para a Comissão e é por isso que convocamos essa audiência", disse Lanza.

Grande parte da lei não foi implementada, a agência-chave, reguladora das comunicações, o Conselho de Comunicação Audiovisual, ainda não existe, disse Baleato, uma das representantes da sociedade civil.

"Queremos gerar um diálogo em relação a isso e olhar para frente, e gerar um compromisso de trabalho. O não cumprimento da lei afeta não apenas o Uruguai, mas também a região, em matéria de boas práticas", afirmou.

No entanto, Cardona não deu uma resposta concreta a esses questionamentos. Ela também não deu uma data para a resolução do processo de implementação da regulamentação da lei, nem comentou sobre a possibilidade de participação civil. "O trabalho está pronto", disse ela, referindo-se à regulamentação, e sua publicação pode ser uma questão de dias ou semanas, concluiu.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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