Por Katherine Pennacchio e Júlio Lubianco
Eleições presidenciais, causas sociais, desinformação, tendências da informação, partidas de futebol ou a última música de Shakira são alguns dos temas de debate, escolhidos pela mídia, para realizar os chamados Twitter Spaces.
Os spaces são salas de bate-papo públicas, disponíveis no aplicativo do Twitter, baseadas em áudio. Eles foram criados no primeiro trimestre de 2021 como uma resposta à plataforma Clubhouse, disponível apenas para dispositivos iOS, que ganhou popularidade durante a pandemia de COVID-19. Os Twitter Spaces podem ser descritos como salas de bate-papo ou um programa de rádio 2.0.
Qualquer usuário do Twitter, usando iOS ou Android, pode criar um Space ou ingressar em um como ouvinte. Mídias independentes da América Latina e grandes como BBC ou El País estão usando a ferramenta como uma estratégia digital, ou seja, para ganhar seguidores nas redes sociais e aumentar sua audiência.
“Twitter Spaces é um formato novo e diferente que permite ouvir vozes mais interessantes. Usamos para nos posicionar, construir uma marca e obviamente também aumentar nossa presença nas redes porque somos um projeto muito jovem, então não temos um grande número de seguidores. Cada vez que fazemos um Space no Twitter, crescemos mais rápido do que a média diária”, disse Nicholas Dale, da equipe de mídias sociais do EL PAÍS América Colômbia, ao LatAm Journalism Review (LJR).
O EL PAÍS América Colômbia começou a fazer Twitter Spaces no final de agosto deste ano, desde então tem feito semanalmente. Os temas são diversos e são escolhidos em relação ao que está em debate público ou trending nas redes sociais.
Um de seus Spaces mais populares aconteceu no dia 19 de outubro com um tema muito distante dos eventos políticos. Foi intitulado 'Monotonia: O significado da nova música de Shakira' e, como o próprio nome indica, a conversa girou em torno da letra da nova música da cantora colombiana e sua carreira. Mais de 7.700 pessoas se conectaram e ouviram mais de uma hora de discussão.
“No Twitter você encontra usuários muito mais atentos à atualidade, pessoas que costumam ler a mídia e se informar. Bem diferente do usuário do Instagram, por exemplo. Portanto, é o espaço natural para nós como meio de comunicação”, disse Dale. “Mas o space sobre a Shakira fez mais sucesso justamente porque foi além do que pensávamos e daquele leitor médio do El País. Foi para um público muito mais amplo e funcionou muito bem para nós.”
Apesar da crise que a plataforma Twitter vive atualmente, com a onda de demissões em massa após sua compra pelo magnata Elon Musk e os rumores de fechamento, os Spaces continuam funcionando normalmente.
Os Twitter Spaces são públicos. Os ouvintes podem ser convidados diretamente por meio de um link. Podem ser ouvidos ao vivo ou gravados, desde que o anfitrião tenha escolhido a opção de gravar a conversa. Além disso, ficam disponíveis por um mês na plataforma.
E, embora seja uma ferramenta de áudio, também oferece a opção de legendas ao vivo. Em termos de inscrições, até 13 pessoas (incluindo o anfitrião e 2 co-anfitriões) podem falar durante o space.
Em termos técnicos, os Twitter Spaces são muito simples. Os participantes se conectam de seus telefones celulares e a discussão começa. Nenhum ajuste de som ou painel de controle necessário, conforme exigido pelo rádio.
No entanto, nem todos estão acostumados com essas ferramentas tecnológicas. “Conseguimos identificar alguns problemas. Por exemplo, não é recomendável entrevistar pessoas que não usam tecnologia ou pessoas muito idosas que não estão acostumadas a usar o Twitter. Pode ser um tema muito interessante, mas essas questões técnicas podem fazer você perder seguidores”, disse Ana Carolina Griffin, editora-chefe do Espaja.com (Venezuela), à LJR .
Dale concorda com essa questão, que também considera importante a alfabetização digital dos participantes, pois isso pode causar problemas quando os convidados se conectam ou participam com fluência.
Um ponto em que os Twitter Spaces não diferem muito dos espaços do rádio é a produção. Os organizadores devem escolher o tema, convidar os participantes ou quem vai conduzir a conversa, promover o space para que mais pessoas se conectem e depois, em muitos casos, servir de moderadores.
Tanto o El País América Colômbia como o Espaja.com escolheram as tardes de quarta-feira para realizar seus spaces para facilitar a produção. Desta forma, aproveitam a segunda e a terça para escolher o tema e contactar os convidados.
“Temos nos saído bem com o Twitter Spaces. Cada vez que fazemos um nosso número de seguidores cresce. Embora seja uma carga adicional de trabalho. É basicamente como produzir um programa de rádio. Não é tão complexo porque não precisamos de operador de som, mas pode gerar a mesma angústia de um programa de rádio, principalmente quando um convidado cancela ou há uma mudança de planos”, explicou Griffin.
EsPaja.com é uma mídia digital venezuelana dedicada à verificação de informações. Há mais de 25 semanas são anfitriões de Twitter Spaces (um semanal) onde já participaram mais de 34 convidados. Seus números são inferiores aos do El País América Colômbia, mas chegaram a 925 pessoas conectadas ao vivo.
Para Griffin, uma das desvantagens de usar o Twitter Spaces é que você precisa de uma conexão estável com a Internet e a Venezuela tem um dos piores sinais do mundo; eles atualmente ocupam o 137º lugar no Speedtest Broadband Internet Speed Index. Isso fez com que, em algumas ocasiões, eles tivessem que cancelar os Twitter Spaces programados ou que alguns ouvintes perdessem o interesse durante a transmissão.
No entanto, a ferramenta serviu como uma janela para abordar questões essenciais, como desinformação durante a pandemia do COVID-19 ou notícias falsas relacionadas à jornada de migrantes venezuelanos. E, em alguns Twitter Spaces, eles dão a oportunidade aos ouvintes de participarem fazendo perguntas ou dando sua opinião sobre o assunto.
“Aqui no Twitter, o ouvinte tem a liberdade de dizer ao entrevistado o que quiser. E é necessário, principalmente em países como a Venezuela, onde esses espaços de debate costumam ser fechados. Com esta ferramenta abre-se um pequeno espaço de liberdade.”
No Brasil, veículos nativos digitais aproveitaram a recente campanha eleitoral para experimentar com o Twitter Spaces. No JOTA, site especializado na cobertura dos três poderes, o primeiro space ocorreu logo após o primeiro debate entre os candidatos. O horário era ingrato: depois da meia-noite. Mas, mesmo assim, a média da audiência foi maior do que outras transmissões ao vivo do JOTA feitas em vídeo.
“Será que vale a pena? Vamos testar. E teve uma audiência muito boa. Na média, maior que as nossas transmissões ao vivo no YouTube,” disse à LJR o jornalista Iago Bolívar, consultor de comunicação digital do JOTA.
Nos pouco mais de dois meses de campanha, incluíndo o segundo turno, os Spaces do JOTA alcançaram uma audiência entre 2 mil e 7 mil ouvintes. Além da equipe própria, foram convidados também jornalistas de veículos locais para informar sobre a eleição nos estados.
“O nosso diferencial foi ancorar uma cobertura em apuração e modelo estatístico [e não em opinião]. Estamos agora estudando como fazer isso na conertura do novo governo, mas consideramos que é uma ferramenta muito flexível e muito útil,” disse Bolívar.
Também durante a campanha eleitoral no Brasil, a Agência Pública manteve um programa semanal no Twitter Spaces, mas a primeira experiência com o formato ocorreu em 2021, durante a publicação da investigação que revelou que o fundador das Casas Bahia, Samuel Klein, teria mantido por ao menos 30 anos um esquema de exploração sexual de crianças.
“Por ser uma das maiores investigações da casa, falando em audiência e repercussão, achamos importante inovar na maneira de comunicá-lo e também abrir uma porta mais próxima com nossos leitores e leitoras. E o Spaces possibilita isso, conversar,” disse à LJR Ravi Spreizner, coordenador de redes da Agência Pública.
Nas próximas semanas, a Pública vai usar o Spaces com parte da sua nova campanha de arrecadação de doações de leitores, que busca recursos para investigar ações mantidas sob sigilo durante o governo Bolsonaro.
“Até janeiro, vamos falar de acesso à informação e de como investigar o que ficou escondido nesses quatro anos. Depois, vamos manter o Spaces semanal. Vai se chamar Re-Pública,” disse Spreizner. “Temos pensado cada vez mais no Spaces como uma ferramenta estratégica, seja para campanhas de arrecadação, seja para potencializar nossas investigações.”