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UNESCO alerta para aumento das ameaças à segurança de jornalistas na cobertura de protestos

O jornalista Ángel Gahona foi assassinado em Bluefields, na Nicarágua, enquanto transmitia ao vivo, pelo Facebook, os protestos que aconteciam naquela cidade contra Daniel Ortega em 21 de abril de 2018. Em 19 de junho de 2016, Elidio Ramos Zárate, jornalista do jornal El Sur, morreu após ser baleado na cabeça enquanto cobria protestos e confrontos na cidade de Juchitán de Zaragoza, estado de Oaxaca, México.

Os casos de Gahona e Ramos fazem parte da lista de 10 repórteres assassinados durante a cobertura de protestos, segundo o relatório da Unesco Segurança de jornalistas em cobertura de protestos: preservação da liberdade de imprensa em tempos turbulentos, que integra a série Tendências Globais em Liberdade de Expressão e Desenvolvimento da Mídia.

Captura de tela Relatório Unesco Segurança jornalistas cobertura protestos

Captura de tela relatório da Unesco Segurança de jornalistas em cobertura de protestos.

Em seu relatório, a UNESCO aponta o aumento nos últimos anos dos casos de perseguição, detenção e violência física contra jornalistas que cobrem manifestações. De acordo com os seus registros, de 1º de janeiro de 2015 a 30 de janeiro de 2020, pelo menos 125 jornalistas foram agredidos enquanto cobriam protestos em 65 países.

A maior parte dos ataques, segundo a Unesco, foi cometida por integrantes das forças de segurança do governo, embora também haja registros de ataques de manifestantes.

Dos 125 casos, 15 ocorreram em 2015, 16 em 2016, 21 em 2017, 20 em 2018, 32 em 2019 e 21 no primeiro semestre de 2020, “o que mostra uma tendência clara de crescimento no número de ataques sofridos por jornalistas que cobrem protestos", disse o relatório.

A tendência parece se manter no resto do ano. Só na Colômbia, entre 9 e 21 de setembro, a Fundação para a Liberdade de Imprensa (FLIP) registrou 33 violações à liberdade de imprensa no âmbito da cobertura de protestos. Segundo a organização, as agressões contra meios de comunicação e jornalistas partiram da Polícia Nacional, em 76% dos casos, e também de manifestantes e pessoas não identificadas, em 24%.

Agressões físicas, obstruções ao trabalho jornalístico, detenções ilegais e até ameaças durante a cobertura foram registrados pela FLIP.

Também na Colômbia, em um caso que ainda está sendo investigado, o comunicador indígena Abelardo Liz foi ferido por tiros durante a cobertura de um protesto no município de Corinto, departamento de Cauca, em 13 de agosto deste ano. O comunicador morreu a caminho do hospital.

“Os jornalistas têm um papel duplo na cobertura dos protestos: eles estão lá para garantir a responsabilização das forças de segurança, ou seja, para informar a sociedade como um todo se a ação dessas forças estava em conformidade com o Estado Democrático de Direito; mas também estão lá para dar voz às reivindicações daqueles que protestam", disse Guilherme Canela, chefe da seção sobre Liberdade de Expressão e Segurança de Jornalistas da UNESCO, à LatAm Journalism Review. “Portanto, garantir sua segurança é, ao mesmo tempo, um fim em si mesmo, pois é proteger o direito à liberdade de expressão e um fim para proteger outro direito fundamental, que é o direito de protestar”.

De acordo com o relatório, esses ataques à imprensa violam leis e normas internacionais já acordadas "há muito tempo no âmbito de diferentes instituições multilaterais".

Além de ataques como espancamentos, intimidações, vigilância, sequestro, prisão, humilhação e destruição de equipamentos, o relatório indica que alguns funcionários públicos utilizaram uma prática conhecida como “doxxing”. Ou seja, eles publicaram informações privadas e identificáveis ​​de jornalistas, que incluem seu endereço ou nomes de parentes, "geralmente com intenção maliciosa". Em alguns casos, a mídia impressa, de rádio ou digital foi censurada, sites foram bloqueados e programas de rastreamento foram instalados nos dispositivos dos jornalistas, entre outras práticas.

Embora em menor proporção, os manifestantes também agrediram a imprensa, segundo a reportagem. Entre as práticas utilizadas pelos manifestantes estão a ocupação temporária de meios de comunicação para tirá-los do ar ou para fazer transmissões, reter os jornalistas temporariamente, danificar equipamentos e até mesmo incendiar um meio de comunicação.

O uso de armas não letais contra jornalistas também foi destacado pelo relatório. O documento destaca, por exemplo, o uso de gás lacrimogêneo e balas de borracha na América Latina, mas também balas de pimenta e balas expansivas em outras regiões. Além dos 10 jornalistas mortos, o uso dessas armas deixou pelo menos 15 jornalistas gravemente feridos, segundo o relatório.

Mulheres jornalistas "foram deliberadamente perseguidas e atacadas por causa de seu gênero", detalha o documento. Os casos registrados pelo relatório incluem mulheres jornalistas que foram ameaçadas de estupro ou que foram detidas pelas forças de segurança e forçadas a se despir e humilhadas. Em outra ocasião, manifestantes espancaram e tiraram as roupas de uma jornalista.

“Os dados apresentados pela Unesco são alarmantes e precisamos de um esforço coletivo urgente para enfrentar o problema, sendo uma das ações mais urgentes o treinamento adequado das forças de segurança”, acrescentou Canela.

Uma das recomendações do relatório, justamente, é a capacitação de membros da força pública. De acordo com a Unesco, a organização e seus órgãos associados realizam programas de capacitação em liberdade de expressão voltados para as forças de segurança desde 2013. Pelo menos 3.400 membros das forças de segurança de 17 países, incluindo a Colômbia, receberam esse treinamento.

O relatório também oferece recomendações aos trabalhadores da imprensa, como usar visivelmente sua identificação de jornalista ou passar por treinamento sobre medidas de segurança, o que seria de responsabilidade dos veículos de comunicação. A Unesco recomenda a leitura do Manual de Segurança para cobertura de manifestações da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).

Além do português, o relatório também está disponível em espanhol, inglês e francês.

Esta história foi originalmente escrita em Espanhol e traduzida por Marina Estarque.

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