Por Samantha Badgen
Para Marianela Balbi, diretora executiva do Instituto de Imprensa e Sociedade (IPYS) na Venezuela, a censura da imprensa e a proibição de transmitir ao vivo os protestos que agitam o país contra o governo do presidente Nicolas Maduro têm como objetivo evitar que mais pessoas se juntem às manifestações, incluindo as áreas pobres da Venezuela — onde a única versão que se têm sobre as manifestações vem dos canais de notícia.
"Estamos vivendo um nível de manipulação direta de informações por parte dos porta-vozes do Estado", disse Balbi sobre o estado de censura dos meios de comunicação no país. "Quando prenderam Francesca Commissari, a Assessora de Imprensa em Miraflores afirmou em sua conta no Twitter que ‘oito terroristas internacionais’ haviam sido presos, comentário que nunca foi esclarecido”.
Em uma entrevista recente ao Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, Balbi falou sobre censura da imprensa nas últimas semanas de protestos, o papel das redes sociais na crise atual e as medidas legais articuladas por Maduro desde que assumiu a presidência para silenciar seus críticos.
Há várias semanas as principais cidades da Venezuela têm sido inundadas por uma onda de protestos denunciando a insegurança, a inflação e a escassez de produtos. Os protestos, que começaram como manifestações estudantis, tornaram-se violentos quando a Guarda Nacional reprimiu as manifestações, violando os direitos humanos e a liberdade de expressão. Segundo o sindicato dos trabalhadores de imprensa na Venezuela, mais de 89 jornalistas nacionais e estrangeiros foram agredidos desde o início dos protestos.
Para Balbi, as agressões contra civis e jornalistas marca uma diferença notável entre a forma como Maduro e seu antecessor lidam com as crises.
"A diferença entre o governo do presidente Chávez e o presidente Maduro está na forma de lidar com as pessoas", disse Balbi. Para a diretora, enquanto Chávez nunca teve um relacionamento fácil com a imprensa, sempre se mostrou mais cuidadoso com a questão dos direitos humanos.
Além das agressões, que ocorrem pouco mais de um ano após a morte de Chávez, a imprensa venezuelana tem notado um aumento no uso de medidas legais e judiciais como mecanismos de censura, afirmou Balbi. As medidas incluem sanções legais proibindo a divulgação de imagens que incitam o ódio e a violência.
“A CONATEL (Comissão Nacional de Telecomunicações da Venezuela) que aplicaria as leis em casos de imagens veiculadas que causem angústia ou mais violência", disse Balbi, referindo-se às multas e medidas sendo tomadas contra a imprensa. Exemplo dessa postura do governo é o canal a cabo NTN24, que teve seu sinal bloqueado durante a primeira semana de protestos após transmitir imagens dos eventos nas ruas. Segundo Balbi, o bloqueio teria servido como advertência a outros canais.
Balbi também comentou que desde o ano passado houve uma mudança no tratamento da imprensa por parte do governo.
"Sempre houve ataques físicos contra jornalistas e alguns meios de comunicação. Este ano o padrão de comportamento começou a mudar. Começaram a fazer uso dos tribunais: a Procuradoria Geral da República e a Supremo Tribunal estão sendo usados para processar jornalistas e meios de comunicação", disse Balbi. "Isso não ocorre por causa da crise atual; esta tendência de atacar certos meios e jornalistas já tinha começado antes."
Balbi citou como exemplo o caso recente do jornal Tal Cual. O tribunal impôs medidas cautelares contra os diretores do jornal na decisão de um processo contra a nota editorial do colunista Carlos Genatios.
Profissionais da imprensa também afirmam que o governo Maduro censura e monitora as redes sociais, uma das únicas fontes de notícias para muitos venezuelanos.
No final de fevereiro, o Twitter confirmou que as imagens dos protestos publicadas através do seu serviço foram bloqueadas. O Twitter disse suspeitar que o governo venezuelano estava por trás da ação.
Embora em muitos casos as redes sociais tenham ajudado a preencher o vácuo de informação no país, moradores das áreas mais pobres do país não têm acesso à internet, e a falta de verificação nesse meio tem contribuído para a incerteza. O fato de que a maioria dos canais de televisão e estações de rádio não estão transmitindo ao vivo os protestos e a repressão gera muita ansiedade, porque as pessoas se sentem mal informadas, explicou Balbi, o que torna as redes sociais um foco de notícias e inquietação onde falsas notícias se misturam com os fatos.
"As pessoas estão se voltando para as redes sociais como um mecanismo de buscar a informação vetada no rádio e na televisão, mas não existe nenhum tipo de controle nas redes sociais, onde informação não verificada pode circular", disse Balbi. Entre a cacofonia de notícias há também "informações verificadas de jornalistas e profissionais que trabalham na internet, o que permite que se esclareça os eventos, especialmente os que envolvem feridos”.
Várias organizações internacionais denunciaram os ataques à liberdade de imprensa na Venezuela. O Instituto Internacional de Imprensa pediu que Maduro pare de ameaçar os meios de comunicação, um grupo de peritos independentes das Nações Unidas fez um pedido ao governo da Venezuela para esclarecer as denúncias de detenções e uso excessivo da força, eex-presidentes latino-americanos condenaram as violações aos direitos humanos.
Além disso, três dos maiores jornais da América Latina se uniram para divulgar informações sobre a situação na Venezuela com o slogan "Somos todos Venezuela. Sem liberdade de imprensa não há democracia”.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog Jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.