A situação da liberdade de imprensa no continente americano segue enfrentando ameaças que vão desde a violência contra jornalistas até o uso de mecanismos legais, a aprovação de leis que restringem a prática da profissão e os ataques cibernéticos.
Foi a conclusão dos 450 diretores de meios de comunicação e jornalistas que se encontraram na 72º Assembleia Geral da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), realizada na Cidado do México do dia 13 ao 17 de outubro.
Os assassinatos de jornalistas continuam sendo a ameaça mais grave. Desde abril de 2016, já 12 jornalistas foram mortos na região. México é o país com o maior número de homicídios, com 7 das 12 mortes. Com esses casos, o país contabiliza 118 homicídios 20 desaparecimentos de jornalistas desde o ano 2000.
O presidente do México, Enrique Peña Nieto, que abriu a Assembleia Geral, disse estar consciente de “que apesar dos avanços dos últimos anos, ainda há crimes contra jornalistas que devemos solucionar”.
O presidente assegurou que o aumento da violência contra jornalistas fez com que o país criasse, em 2012, o Mecanismo para a Proteção de Pessoas Defensoras dos Direitos Humanos e Jornalistas, assim como a Procuradoria Especial para a Atenção de Delitos Cometidos contra a Liberdade de Expressão (Feadle).
Peña Nieto garantiu que atualmente o Mecanismo protege 452 pessoas, das quais 167 são jornalistas. Acrescentou que a Feadle conta com “novas atribuições legais para atender e atrair as denúncias contra ataques a jornalistas” e que até o momento recebeu 48 casos.
“O governo do México é o primeiro a reconhecer a necessidade de consolidar esses instrumentos. Temos a determinação de ajustar onde tem que ser ajustado, e de mudar o que for necessário, para que cumpram as suas funções”, afirmou Peña Nieto, que espera que “as recentes mudanças estruturais […] nos permitam diminuir a impunidade”.
Por anos esse Mecanismo, assim como o trabalho feito pela Feadle, tem recebido críticas de organizações defensoras de direitos humanos. Para elas, tais instrumentos não conseguiram cumprir as suas funções. O México ocupa o oitavo lugar no Índice de Impunidade do CPJ de 2015, que lista os países onde os responsáveis por crimes contra jornalistas ficam impunes.
Durante a Assembleia, Peña Nieto também assinou a Declaração de Chapultepec, adotada pela Conferência Hemisférica sobre a Liberdade de Expressão em 1994, que estabelece dez princípios para garantir e proteger a liberdade de expressão.
Mas o México não é o único país da região com números altos de violência contra jornalistas e de impunidade. Colômbia, por exemplo, registra desde o ano 2000 mais de 100 casos sem solução de jornalistas assassinados. Enquanto isso, o Brasil é um dos países com maior número de agressões contra jornalistas na cobertura de manifestações públicas.
Os assassinatos, no entanto, são “a ponta do iceberg”, de acordo com a SIP. A organização afirma que as mortes ocorrem quando os jornalistas já foram vítimas de intimidações, agressões e assédios. Na Bolívia, Colômbia, Equador, Honduras, México, Nicarágua, Paraguai, Panamá e Venezuela, jornalistas e editores têm sido vítimas de ameaças e intimidações por parte de traficantes de drogas, grupos criminosos, autoridades locais, nacionais e militares.
“Com a tímida reação das autoridades, isso quando não participam ativamente na intimidação dos jornalistas, é criado um clima propício para a agressão e, eventualmente, o assassinato de jornalistas", afirma a SIP em seu documento de conclusões.
A SIP também reconhece outros mecanismos para impedir o trabalho jornalístico. Menciona, por exemplo, o aumento de repórteres obrigados a participar como testemunhas em processos judiciais e tentativas de forçar os jornalistas a revelar as suas fontes. A organização afirma também que há países onde a primeira autoridade se envolveu diretamente em disputas e críticas a jornalistas; e lugares onde se usa a publicidade oficial como prêmio ou castigo, segundo a linha editorial do meio de comunicação.
Cuba e Venezuela continuam preocupando pelas restrições à liberdade de imprensa. O surgimento de meios digitais na ilha “inquieta o governo, que aumentou a repressão contra esses veículos, e de forma mais marcada ainda, reprime os jornalistas-cidadãos”. A SIP relata casos de detenções, interrogatórios, ameaças e o confisco de equipamentos de jornalistas do país.
Já na Venezuela, a piora do cenário da liberdade de expressão é cada vez mais notório, segundo a SIP, que afirma que a imprensa no país sofre insultos por parte de governantes, agressões e roubos de equipamentos. As detenções arbitrárias e a proibição de informar demonstram esse agravamento. Talvez o caso mais representativo dos últimos meses seja o de Braulio Jatar que está preso desde 3 de setembro após reportar sobre os protestos contra o presidente Nicolás Maduro na Isla Margarita.
Mas nos últimos anos os meios de comunicação da região também tiveram que enfrentar outros ataques mais modernos, os cibernéticos, que segundo a SIP, cresceram de forma “alarmante”. Veículos da Bolívia, Guatemala, El Salvador e Trinidad e Tobago foram afetados de “forma séria” por esse tipo de ataque.
Por isso, a SIP e o Google lançaram o Projeto Escudo (Project Shield) durante a Assembleia Geral com o objetivo de oferecer aos meios de comunicação da região uma ferramenta para que possam se proteger desses ataques.
Durante a Assembleia também foi realizada a entrega oficial do Grande Prêmio SIP para a Liberdade de Imprensa 2016 para a Associação Equatoriana de Editores de Jornais (AEDEP) “pela sua permanente defesa da liberdade de imprensa e de expressão”.
Uma das atividades da AEDEP em prol da liberdade de expressão tem sido denunciar a Lei Orgânica de Comunicação aprovada em 2013 e apoiada pelo governo do presidente Rafael Correa. Segundo a SIP, a lei tem sido usada “para perseguir as empresas jornalísticas independentes e o jornalismo crítico”.
A SIP está composta por mais de 1.300 publicações do hemisfério ocidental e tem por objetivo a defesa e promoção da liberdade de imprensa e expressão no continente.
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.