O poder Executivo aparece como o mais influente em situações desfavoráveis à liberdade expressão e de imprensa nas Américas em comparação com o Legislativo e o Judiciário. É o que mostra o livro Índice Chapultepec de Libertad de Expresión y Prensa, lançado nesta terça-feira, dia 28 de junho, pela Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) e a Universidad Católica Andrés Bello (UCAB), da Venezuela.
O livro analisa a liberdade de imprensa em 22 países do continente americano. Em 15 deles, o poder Executivo, exercido por presidentes, primeiro-ministros e seus gabinetes, representam a o maior impacto negativo na liberdade das atividades jornalísticas. Em seis países, o Legislativo é o poder que mais ameaça a liberdade de imprensa. O Judiciário aparece como maior risco em apenas um país.
O levantamento faz parte do Índice Chapultepec, que anualmente monitora, mede, compara e avalia os progressos e as práticas negativas dos poderes Executivo, Legislativo e Judicial em relação a quatro dimensões ou variáveis: cidadania informada; o exercício do jornalismo; o controle dos meios de comunicação social; e a violência e a impunidade.
“É interessante ver como as mudanças políticas e, em alguns casos, o reposicionamento dos governos já no cargo, se traduzem de um ano para o outro em processos acelerados de deterioração ou melhoria do clima de liberdade de imprensa. ... Também é alarmante ver como algumas das melhorias que foram detectadas mais tarde desmoronam quando os próprios governantes enfrentam as primeiras crises e manifestam seu descontentamento à imprensa, ao mensageiro e à mídia,” disse Carlos Jornet, presidente da Comissão de Liberdade de Imprensa da SIP e diretor de jornalismo de La Voz del Interior, da Argentina.
A Venezuela é o país onde há o menor nível de liberdade de imprensa e expressão nas Américas, segundo o Índice Chapultepec. De parte do Executivo, a Comissão Nacional de Telecomunicações (CNT) é o principal órgão responsável pelo fechamento e sanção de veículos de comunicação. A CNT também supervisiona linhas editoriais e tem poder para outorgar e retirar concessões.
Um relatório da alta comissária de direitos humanos das Nações Unidas, Michele Bachelet, informa que a CNT fechou pelo menos uma estação de rádio e confiscou o seu equipamento no último ano. Além disso, seis emissoras foram suspensas e três programas, retirados do ar -- todos críticos ao governo do presidente Nicolás Maduro.
Os poderes Legislativo e Judiciário também desempenham um papel relevante nas restrições à liberdade de expressão e imprensa no país, seja com sentenças contra comunicadores ou com leis que legitimam a censura.
"No processo político atual na Venezuela não há independência dos poderes públicos. O relatório sobre a Venezuela, de ambos os períodos, detalha as situações contextuais que nos permitem visualizar as ações. Denúncias contra jornalistas e mídia que têm sido feitas por altos funcionários do Executivo, levaram a sentenças desfavoráveis para comunicadores e mídia, entre outros que demonstram o alinhamento dos poderes do Estado", disse à LatAm Journalism Review (LJR) León Hernández, coordenador e co-autor do livro.
Cuba e Nicarágua, países que junto com a Venezuela são classificados como sem liberdade de expressão no Índice Chapultepec, também possuem indicadores ruins quanto à influência dos poderes de estado nas atividades jornalísticas.
A Nicarágua, do presidente Daniel Ortega, é um dos países onde o Legislativo, e não o Executivo, exerce a maior influência negativa na liberdade de expressão e imprensa. O Congresso aprovou em 2020 a chamada lei de crime cibernéticos, que penaliza a publicação de informações falsas com até quatro anos de prisão.
O país também tem o pior indicador quanto ao poder Judiciário: o sistema de Justiça do país tem agido para perseguir e intimidar a imprensa como nenhum outro no continente. Em uma das ações mais agressivas contra a imprensa independente, o procurador público do país intimou, como testemunhas ou investigados, pelo menos 16 jornalistas em um suposto caso de lavagem de dinheiro.
“Os especialistas consultados atribuíram um impacto desfavorável maior na liberdade de imprensa e de expressão no poder Legislativo, mas a diferença no alto impacto negativo entre os dois órgãos institucionais não é muito decisiva, com ambos os ramos demonstrando uma forte influência em ações desfavoráveis. Em geral, esta é uma nação que experimentou uma deterioração de suas liberdades, com ações restritivas em todos os ramos do poder público, incluindo a criação de leis controversas,” disse Hernández.
Em Cuba, embora o poder Executivo seja o mais associado com medidas contrárioas à liberdade de imprensa, o Legislativo têm contribuído à altura, como na aprovação do Decreto-Lei 370/2018, que limita o acesso a portais de informação hospedados em outros países.
O livro Índice Chapultepec de Libertad de Expresión y Prensa tem mais de 600 páginas e traz estudos de caso detalhados de cada um dos 22 países analisados, e apresenta um comparativo entre os dados obtidos em 2019/2021 e 2020/2021. Está disponível para download gratuito aqui (em espanhol).
"Os resultados anuais do índice [Chapultepec], para além de se tornarem uma referência para a informação jornalística, apontam para áreas em que devemos promover reformas das políticas públicas na procura de reforçar a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão. Estamos confiantes que este importante instrumento de defesa das liberdades e de apoio à democracia continuará activo, refinado e enriquecido ano após ano. Este é o nosso compromisso,” disse Jorge Canahuati, presidente da SIP e presidente executivo do Grupo Opsa, de Honduras.