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Em seu terceiro ano, Coda.Br democratiza discussão sobre jornalismo de dados no Brasil

Integrantes da crescente comunidade de jornalismo de dados no Brasil se reuniram nos dias 10 e 11 de novembro para a terceira edição da Conferência Brasileira de Jornalismo de Dados e Métodos Digitais, Coda.Br, em São Paulo.

O evento contou com mais de 40 horas de oficinas de treinamento – havia opções para aprofundar o conhecimento de usuários experientes em programação e visualização de dados e também para apresentar a neófitos técnicas simples de planilhas e limpeza de databases.

O Coda.Br foi realizado pela Escola de Dados, programa da Open Knowledge Brasil, em parceria com o Google News Initiative. A conferência conta com o apoio do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, (Abraji) da agência Volt Data, do Instituto Serrapilheira, da Python Foundation e do Nic.Br.

Fernanda Viegas, pesquisadora-sênior de inteligência artificial no Google Brain, fala sobre democratizar acesso à visualização de dados. (Alessandra Monnerat/Knight Center)

Fernanda Viegas, pesquisadora-sênior de inteligência artificial no Google Brain, fala sobre democratizar acesso à visualização de dados. (Alessandra Monnerat/Knight Center)

Vários destes workshops foram ministrados por instrutores de cursos do Centro Knight, como o professor da Universidade de Miami Alberto Cairo, o editor de dados do Jota, Guilherme Jardim Duarte, e a curadora de dados no Google News Lab, Keila Guimarães.

Este leque de opções permitiu que o público do Coda.Br se ampliasse para mais de 360 pessoas este ano, segundo Natália Mazotte, diretora da Open Knowledge Brasil.

“Temos conseguido falar cada vez mais com um público diferente. Os jornalistas têm sentido necessidade de incorporar conhecimento multidisciplinar. Há um movimento de tornar o jornalismo de dados mainstream, e por isso o Coda se tornou mais abrangente”, disse Mazotte.

O jornalista Michel Silva, que atua como comunicador na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, participou do Coda.Br pela primeira vez. Ele foi um dos 30 comunicadores bolsistas selecionados em uma iniciativa da Escola de Dados para democratizar o acesso ao evento deste ano.

“Conheci algumas ferramentas que vou incorporar ao meu repertório de trabalho, e espero que eu possa produzir mais reportagens sobre favelas usando esse conhecimento”, disse. “Nas favelas do Rio há uma deficiência muito grande na produção de dados. Acho importante ter mais gente da periferia em espaços como o do Coda”.

Uma das ferramentas que ele pretende usar é o QGIS, de criação de mapas. “Chamou mais a minha atenção porque já tinha feito um mapa cultural da Rocinha usando lista do Google Maps, mas o QGIS tem muito mais funcionalidades”, disse.

Também participaram do congresso profissionais que não atuam em redações, como o pesquisador ligado à Universidade Federal do Rio Grande do Sul Gabriel Hoewell. “Nas oficinas pensei em levar ferramentas novas para a sala de aula, principalmente as gratuitas e open source de jornalismo investigativo”, disse ele.

Um dos principais objetivos do Coda.Br este ano era estimular o fortalecimento da comunidade dos profissionais que trabalham com dados no Brasil. Novidades desta edição foram sessões de mentoria, em que jornalistas se organizavam livremente para trocar experiências sobre Lei de Acesso à Informação e tirar dúvidas sobre linguagens de programação. No Twitter, usuários compartilharam links das apresentações das oficinas que participaram com a hashtag #CodaBR18.

Oficina do Coda.Br com Marco Túlio Pires, líder do Google News Lab no Brasil (Alessandra Monnerat/Knight Center)

Oficina do Coda.Br com Marco Túlio Pires, líder do Google News Lab no Brasil (Alessandra Monnerat/Knight Center)

“Vamos sempre tentando trazer novas ideias para uma conferência mais aberta e mais colaborativa. Queremos que as pessoas voltem ao Coda no ano que vem conhecendo melhor umas às outras”, disse Mazotte.

Embora a maior parte da programação da conferência estivesse voltada para oficinas práticas, paineis de discussão ofereceram espaços para repensar as principais questões que jornalistas de dados brasileiros enfrentaram em um ano de eleições gerais.

Alberto Cairo e Fernanda Viegas, pesquisadora sênior em inteligência artificial do Google Brain, debateram sobre como democratizar o acesso à visualização de dados. Enquanto Cairo sublinhou a importância de ampliar a utilização de ferramentas gratuitas de Dataviz em pequenas redações, Viegas destacou a necessidade de fazer gráficos compreensíveis ao público em geral. "Temos que pegar na mão do usuário e explicar cada elemento do material gráfico produzido", disse ela.

Na mesa “E quando o dado não está disponível?”, Sarah Cohen, ex-editora da equipe de dados do The New York Times, Jeremy Merrill, desenvolvedor da ProPublica, e Steffen Kühne, desenvolvedor da emissora alemã Bayerischer Rundfunk, compartilharam suas experiências com projetos em que suas redações tiveram que produzir os próprios dados com iniciativas de crowdsourcing.

Kühne mostrou como sua equipe usou automatização para mandar mais de 20 mil e-mails a imobiliárias alemãs sob nomes de diferentes origens étnicas. O resultado foi a reportagem “Hannah and Ismail”, em que eles descobriram que nomes de origens árabes ou turcas sofriam discriminação e recebiam menos respostas com informações sobre apartamentos.

Prêmio Cláudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados

A conferência também serviu como plataforma para lançar o Prêmio Cláudio Weber Abramo de Jornalismo de Dados, o primeiro do tipo no país, organizado pela Abraji e pela Open Knowledge Brasil. A premiação vai celebrar os trabalhos publicados entre 1º de outubro de 2018 e 1º de outubro de 2019 nas categorias investigação guiada por dados, visualização, dados abertos e inovação.

Natalia Mazotte apresenta o Prêmio Cláudio Weber Abramo. (Alessandra Monnerat/Knight Center)

Natalia Mazotte apresenta o Prêmio Cláudio Weber Abramo. (Alessandra Monnerat/Knight Center)

As inscrições começam em 26 de junho de 2019. Os seguinte jurados vão avaliar os concorrentes: Alberto Cairo, professor da Universidade de Miami; Carol Rozendo, designer no MIT Media Lab; Fabiano Angélico, consultor da Transparência Internacional; Flor Coelho, editora do La Nación Data; José Roberto de Toledo, editor da revista piauí; Juan Torres, gerente da Escola de Dados; Marco Túlio Pires, líder da Google News Lab no Brasil; Mariana Santos, CEO da Chicas Poderosas; e Tiago Mali, coordenador de cursos da Abraji.

O nome do prêmio é uma homenagem ao jornalista defensor da transparência Cláudio Weber Abramo, que morreu em agosto deste ano. “Ele foi o pioneiro no jornalismo de dados no Brasil”, ressaltou o presidente da Abraji, Daniel Bramatti. “O que mais projeta minha admiração é o que o motivava: a associação da busca pelos dados com o espírito público. Ele sempre tinha em mente o interesse público e isso compartilhamos com ele”.

Mazotte opina que a comunidade de jornalistas de dados terá cada vez mais protagonismo na luta por transparência e abertura de dados. “Esse grupo tem um poder de pressão e influência que ajuda a evitar retrocessos. Os jornalistas de dados vão ter um papel fundamental em um contexto em que as evidências são questionadas e que a opinião ganha mais relevância”.

 

*Nota: Natália Mazotte também é colaboradora do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas.

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