texas-moody

Editores latino-americanos estão menos preparados para se adaptar aos próximos desafios da IA, mas estão cientes da ameaça: Nic Newman, pesquisador do Reuters Institute

Em 2024, a mídia e os jornalistas terão que repensar urgentemente seu papel e propósito. A mídia na América Latina enfrentará o poder disruptivo da inteligência artificial (IA) e terá que lidar com um “superano eleitoral”, com eleições presidenciais em seis países.

Isso de acordo com o recente relatório "Jornalismo, mídia e tecnologia: tendências e previsões para 2024". O relatório, elaborado pelo jornalista e pesquisador Nic Newman e publicado pelo Reuters Institute for the Study of Journalism (RISJ), dá indícios do que o setor global pode esperar em 2024.

As descobertas se baseiam em uma pesquisa com 314 líderes de mídia (CEOs, editores, publishers, diretores digitais e de inovação, entre outros) de 56 países, realizada em novembro e dezembro de 2023.

Jornalistas de países latino-americanos como Equador, Costa Rica, Nicarágua, Uruguai, México, Brasil e Colômbia foram incluídos na amostra.

"É justo dizer que a grande maioria [dos entrevistados] é do eixo Europa/EUA. Tentamos aumentar e melhorar a representação a cada ano", disse Newman à LatAm Journalism Review (LJR).

"Em geral, o que observamos (também a partir dos dados de nossos relatórios sobre jornalismo digital) é que os países latino-americanos são mais dependentes de plataformas sociais, obviamente, e têm conexões diretas mais fracas com marcas de notícias. Em parte como consequência, as notícias pagas são menos desenvolvidas... e a América Latina está geralmente atrás dos EUA e de partes da Europa em termos de adoção de tendências de IA", acrescentou Newman.

LJR resume os destaques do relatório global abaixo.

Outro ano difícil para o jornalismo

As pressões exercidas sobre a mídia pelas guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, as mudanças climáticas, as consequências da pandemia e a recessão econômica continuarão em 2024.

De acordo com a pesquisa, apenas metade dos líderes do setor de mídia (47%) está confiante quanto às perspectivas para o jornalismo este ano; cerca de quatro em cada dez (41%) não estão seguros e um décimo (12%) expressa baixa confiança.

Embora haja eleições cruciais em mais de 40 democracias em todo o mundo neste ano, incluindo seis eleições presidenciais na América Latina, o que, em muitos casos, significa maior consumo de notícias e aumento do tráfego, há temores de que "a divisão e a polarização política corroam ainda mais a confiança nas notícias".

De acordo com o autor do relatório, para sobreviver, as empresas de mídia terão que adotar o digital e, ao mesmo tempo, continuar a recolher receita dos canais tradicionais.

"Este ano, a assinatura digital e a associação (80%) aumentaram sua vantagem sobre a publicidade (72%) e a maioria das empresas de mídia está procurando combinar três ou quatro fluxos de receita", diz o relatório.

Os líderes de mídia também estão menos esperançosos de obter dinheiro adicional das grandes empresas de tecnologia. A Meta cortou suas contribuições financeiras para organizações de notícias e não se sabe ao certo como serão as contribuições das empresas de IA.

Newsletters e podcasts pagos parecem ser uma solução na busca pela diversificação da receita.

A IA está ganhando terreno

De acordo com o relatório, se 2023 foi o ano da adoção da IA generativa, 2024 será o ano da incorporação total dessas tecnologias nos fluxos de trabalho.

Além disso, os meios de comunicação esperam uma redução em seu tráfego devido à integração da IA nos mecanismos de pesquisa e em outras ferramentas.

"Empresas como a Google e a Microsoft estão explorando novas maneiras de exibir conteúdo, conhecidas como experiências de buscas com IA generativa (GSE), que fornecem respostas diretas a consultas em vez de uma lista de links para sites", diz o relatório.

Devido à proliferação da IA, espere batalhas legais sobre direitos autorais e impedimentos para que grandes plataformas de IA acessem o conteúdo. De acordo com uma pesquisa do Reuters Institute, menos de 20% das organizações de notícias no México negam acesso ao seu conteúdo.

"Os editores latino-americanos têm sido mais lentos na adaptação e muitos ainda não se adaptaram totalmente ao trabalho digital ou multiplataforma, portanto, estão menos preparados para lidar com a disrupção da IA que está por vir, embora os que responderam à nossa pesquisa estejam bem cientes da ameaça", disse Newman à LJR.

Há também o temor de que, durante os processos eleitorais previstos para este ano na América Latina e em todo o mundo, políticos e ativistas usem a IA para influenciar os resultados.

Isso já foi visto na recente campanha eleitoral argentina, em que imagens geradas por IA foram usadas para prejudicar a imagem de dois dos principais candidatos.

"O vencedor foi retratado como uma entidade maligna sedenta de sangue, enquanto seu rival apareceu em um vídeo falso cambaleando nas trincheiras como o protagonista do filme 1917, sobre a Primeira Guerra Mundial", explica o relatório.

Mais interesse no Whatsapp

O Reuters Institute aponta para um declínio das redes sociais "tradicionais", como Facebook e X (ex-Twitter). A pesquisa mostra que os líderes de mídia darão mais atenção em 2024 ao TikTok e ao YouTube.

Como também previsto no ano passado, em 2024 a mídia planeja produzir mais vídeos, mais podcasts e mais newsletters, mas não deve aumentar a produção de artigos de texto.

"A mídia também vê oportunidades de obter mais tráfego de serviços de mensagens, como o WhatsApp (+61), de outras redes, como o LinkedIn (+41), e de fontes relativamente novas, como o Google Discover", diz o relatório.

Essa decisão da mídia de colocar mais energia no WhatsApp vem na esteira do lançamento de um novo recurso que permite que marcas e celebridades criem canais de transmissão. Não é a mesma coisa que os grupos do WhatsApp, nesse caso o usuário pode se inscrever, reagir às postagens, mas não pode fazer comentários.

"O lançamento dos canais do WhatsApp é super relevante na América Latina por causa do uso extremamente difundido para notícias (diferentemente da Europa)", explicou Newman.

Os canais do WhatsApp estão disponíveis, desde setembro de 2023, em mais de 150 países. O Instagram tem funcionalidade semelhante.

Em conclusão, para o Reuters Institute, a tecnologia está avançando em um ritmo acelerado, além da capacidade humana. Portanto, as organizações de mídia devem aceitar as mudanças e interferências e encontrar maneiras de coexistir com as máquinas de forma produtiva.

Traduzido por Carolina de Assis
Regras para republicação

Artigos Recentes