Jornalistas locais estão em contato direto com os fatos e as fontes, o que pode ser uma faca de dois gumes. Por um lado, a proximidade permite uma maior compreensão e a criação de reportagens mais alinhadas com a realidade, mas, por outro lado, maiores riscos físicos e econômicos são assumidos.
Existe atualmente uma tendência no jornalismo de recuperar a proximidade e a relação emocional com a sociedade, voltando-se para o local e o hiperlocal, como consequência da crise de credibilidade sofrida pela mídia de massa devido à falta de empatia e negligência de seu público, como expressa a jornalista Olga Lucía Lozano no livro "Inovação e jornalismo local na América Latina", desenvolvido pela Fundação Gabo e pela Google News Initiative.
Devido a esta crise, inúmeros meios locais e novas iniciativas independentes destinadas a nichos específicos têm surgido nos últimos anos na América Latina. No entanto, jornalistas que neles trabalham enfrentam desafios diários muito diferentes dos de seus colegas nas capitais.
A LatAm Journalism Review (LJR) consultou jornalistas em toda a América Latina, que fazem parte tanto da mídia tradicional local quanto de empreendimentos digitais hiperlocais, para descobrir os prós e os contras que eles enfrentam ao praticar jornalismo longe das grandes cidades.
Contato direto com as fontes
Uma das vantagens do jornalismo local é a proximidade e o fácil acesso às fontes. A jornalista colombiana e fundadora da Contratopedia Caribe, Tatiana Velásquez, exerce sua função em Barranquilla (localizada a mais de mil quilômetros de Bogotá, capital da Colômbia).
"A coisa mais maravilhosa de fazer jornalismo regional é estar em contato direto com os fatos, sem a intermediação que pode acontecer quando se reporta de Bogotá", disse Velasquez à LJR. "Por exemplo, se você está em Bogotá e precisa entender porque há um problema alimentar em uma determinada comunidade, você tem que fazer toda a logística adicional para viajar e contatar fontes para ajudá-lo a entender o fato. Quando você está nas regiões, cobrindo os fatos como parte de sua rotina de trabalho, não apenas terá contato direto com as fontes, mas será mais fácil entender o fio narrativo e informativo da história", explicou a jornalista.
Sobre este ponto, o jornalista Adrián Pino, co-fundador da Datos Concepción, um projeto local no norte da Argentina que promove o jornalismo e os dados abertos, concorda.
"As vantagens do jornalismo local são o fácil acesso à fonte, a disponibilidade de informações e ter uma percepção dos problemas cotidianos com mais facilidade", disse Pino à LJR.
O acesso a certas fontes, desde o nível local, também melhorou como resultado da pandemia. Agora é mais fácil para jornalistas locais fazer histórias com foco nacional ou contatar fontes especializadas, não importa onde elas estejam. "A pandemia ajudou no contato com fontes que antes só podiam ser contatadas pessoalmente. Agora muito pode ser feito por Zoom ou por telefone", disse à LJR Alejandra Padilla, jornalista baseada em Puebla, México, e co-fundadora do meio digital Serendipia.
Agenda diferente
Padilla começou sua carreira jornalística na Cidade do México, sempre com um enfoque nacional. Quando ela se mudou para um local menor, ela começou a ver outras formas de trabalhar na profissão. "A vantagem de trabalhar fora da capital é que você conhece outra agenda, você se abre para outros temas e outras formas de fazer as coisas", disse ela.
Esta proximidade com o entorno e a comunidade que o jornalismo local tem pode ajudar a aproximar questões complexas que parecem distantes ou estranhas às grandes cidades. "As regiões nos dão a história local que serve como radiografia de todo o país", disse a jornalista venezuelana María Ramírez Cabello, que trabalha no sul de seu país, à LJR.
"A diferença, e nós a vemos há anos na Venezuela, é que nas regiões as crises são vividas com antecedência, portanto são mais profundas. Fazer jornalismo neste contexto de proximidade com a realidade é uma vantagem. Os jornalistas não chegam na região, cobrem-na e partem. Os jornalistas vivem o que está acontecendo, eles o experimentam e as histórias emergem de seu próprio ambiente", acrescentou Ramírez.
Maiores riscos
Há um ditado que diz "pequena cidade, grande inferno", que indica que em cidades pequenas, ou em lugares pequenos, onde todos se conhecem, as informações negativas circulam mais rapidamente. Isto também se aplica ao jornalismo.
"No jornalismo local, algumas fontes podem não querer falar porque há muita proximidade, muito parentesco e em geral as pessoas se conhecem. Especialmente quando se faz jornalismo investigativo, torna-se complicado obter testemunhos ou denúncias", explicou Pino. Jornalistas locais e suas fontes estão expostos a riscos que podem incluir intimidação política, ameaças de grupos criminosos ou à margem da lei, etc.
"Quando você cobre certos temas, você está mais exposto, em termos de segurança. O risco é maior quando você está no mesmo território do que se você se apresentar por alguns dias e for para Bogotá ou outra cidade. Quando se vive na mesma região onde se trabalha, especialmente em um país como a Colômbia, existem grandes riscos", disse Velásquez, listando os aspectos negativos do jornalismo local. "Na Colômbia, que durante décadas tem sido um território inseguro para o jornalismo, qualquer ameaça, por mais simples que pareça, não deve ser tomada de ânimo leve", acrescentou ela.
Para minimizar os riscos, os jornalistas consultados recomendam treinamento em como realizar coberturas em ambientes hostis, usando aplicações de geolocalização ao fazer trabalho de campo, limpando equipamentos eletrônicos (telefones, laptops, etc.) regularmente, usando aplicativos criptografados para mensagens ou comunicação por email, e seguindo práticas jornalísticas responsáveis, entre outras.
Dificuldades no acesso ao financiamento
Outra dificuldade para fazer jornalismo local e hiperlocal é o acesso ao financiamento. O mercado publicitário e comercial é pequeno e as oportunidades de apoio financeiro não são constantes.
A jornalista Raquel Zapien, diretora e fundadora da Son Playas, um meio de comunicação de jornalismo ambiental em Mazatlán (México), explica como pode ser difícil criar e manter um meio de comunicação hiperlocal. "Na Son Playas, eu não tenho uma equipe ou financiamento. Eu produzo a maior parte do conteúdo e trabalho em uma agência de marketing para cobrir as despesas geradas pelo portal. Atualmente estou tentando implementar um modelo de negócios para que o projeto sobreviva. Também tenho um grupo de colaboradores que participam com artigos de opinião sem qualquer remuneração", disse ela à LJR.
Neste sentido, os jornalistas entrevistados para esta reportagem concordam que as alianças com outros meios e organizações são fundamentais para superar as dificuldades financeiras.
"Uma maneira de evitar a asfixia econômica é colaborar e compreender que os problemas locais estão conectados globalmente. A corrupção a nível local tem características muito semelhantes ao que acontece a nível regional, nacional ou mesmo global", explicou Pino.
Acesso deficiente às informações públicas
Outra desvantagem apontada pelos jornalistas consultados é o atraso de algumas entidades governamentais locais em termos de transparência e acesso aos dados públicos. Este não é apenas o caso em países com claras deficiências em termos de acesso à informação pública, como Venezuela ou Nicarágua. Também acontece em México, Colômbia, Argentina, entre outros.
"A nível local na Argentina, a disponibilidade de dados é quase nula. Há muito pouca informação digitalizada e os pedidos de informação não são uma prática frequente, os governos não respondem ou nem mesmo têm os dados. Particularmente na Datos Concepción, temos trabalhado muito com o governo local precisamente disponibilizando dados de compras públicas para facilitar o trabalho dos jornalistas", disse Pino.
O problema de acesso à informação pública parece ser estrutural e pode afetar tanto os jornalistas locais quanto os nacionais. As pequenas entidades governamentais geralmente não têm as informações nos formatos solicitados. "A questão do acesso à informação pública é muitas vezes difícil, mas eu diria que está mais ligada à entidade territorial local do que ao fato de que é uma pessoa local que está pedindo por ela. Há também problemas de resposta oportuna se o jornalista for de Bogotá", disse Velásquez. "Obter os dados é em parte o que é mais difícil para um jornalista local, e é preciso lutar o tempo todo para obter as informações de forma oportuna.”