texas-moody

Jornalistas são um dos grupos mais afetados na “grave crise de direitos humanos” do México, diz relatório da CIDH

O México atravessa uma “grave crise de direitos humanos” segundo o recente relatório ‘Situação dos direitos humanos no México’ da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). De acordo com a organização, os altos índices de desaparecimentos, a tortura, a insegurança, o limitado acesso à Justiça e a impunidade geram especial preocupação.

Os jornalistas fazem parte de um dos “grupos populacionais especialmente afetados” por esta violência, a tal ponto que, na última década, o México se tornou um dos países mais perigosos para o exercício do jornalismo, adverte o relatório.

Segundo dados da Comissão Nacional de Direitos Humanos do México (CNDH), já foram registrados no país 107 assassinatos de jornalistas entre o ano 2000 e setembro de 2015, diz o relatório em seu capítulo destinado à situação dos defensores de direitos humanos, dos jornalistas e da liberdade de expressão.

A violência contra defensores e jornalistas “é exercida com objetivo de silenciar as denúncias e os pedidos de verdade e Justiça, e perpetuar a impunidade para as graves violações de direitos humanos”, assegura.

Precisamente, a maioria destas vítimas eram repórteres que informavam sobre casos de corrupção administrativa, narcotráfico, crime organizado ou segurança pública. A situação é mais grave nos lugares onde o crime organizado tem grande controle, às vezes em cumplicidade com agentes do Estado.

Veracruz, Tamaulipas, Guerrero, Chihuahua e Oaxaca são os estados com maior número de homicídios de jornalistas entre 2000 e agosto de 2015, segundo o informe. Quase seis de cada dez assassinatos ocorreram em algum desses estados.

A CIDH também chamou a atenção sobre o alto número de desaparecimentos forçados no país; números que incluem jornalistas. Segundo a CNDH, desde 2005 até setembro de 2015, havia 20 jornalistas desaparecidos. Em 2015, a Comissão tomou conhecimento de três casos de sequestro.

Sobre esse assunto, em fevereiro de 2015, a organização Artigo 19 México publicou um relatório em que assegura que o México é o país com mais jornalistas desaparecidos no mundo. Segundo esta organização, de 2003 a 2015 desapareceram uma média de dois jornalistas por ano, totalizando 23 repórteres sumidos.

A Comissão também expressou  preocupação por outros tipos de agressões contra a imprensa, como ameaças de morte, intimidações, perseguições, ataques à infraestrutura dos meios, ataques cibernéticos e casos de invasão a casas de repórteres e roubo material jornalístico.

Impunidade: falhas de investigação e do mecanismo de proteção
Os crimes contra jornalistas não escapam da impunidade generalizada no país. Em 2013, a CNDH já falava de cerca de 89% de índice de impunidade nos crimes que incluem homicídios, desaparecimentos e atentados a meios de comunicação, diz o informe.

O Comitê para Proteção dos Jornalistas (CPJ, na sigla em inglês) colocou o México em oitavo lugar no Índice Global de Impunidade 2015, uma lista que inclui os “países onde se assassinam jornalistas e os responsáveis permanecem livres.”

Para a Comissão e seu Relatório Especial para a Liberdade de Expressão, uma das causas da impunidade nesses casos é a “cooptação dos órgãos judiciais e policiais por parte das organizações criminais, que fazem pressões ilegais para desviar o curso das investigações.”

O informe lembrou o “efeito amedrontador” que as agressões contra jornalistas, especialmente os assassinatos, causam não somente sobre os colegas, mas sobre a cidadania em geral. Para a CIDH, essas agressões “transmitem a errônea mensagem da inexistência de sanções para quem agride a imprensa, deixando desprotegidos jornalistas e comunicadores.”

Além da impunidade, o relatório também aborda as falhas do mecanismo de proteção para jornalistas e defensores de direitos humanos que têm 463 beneficiários, dos quais 190 são jornalistas.

Apesar de ter sido o segundo país da região a estabelecer um mecanismo deste tipo, a falta de recursos para seu funcionamento, a pouca colaboração entre agências governamentais e a desconfiança gerada pelas agressões contra quem está sob sua proteção seguem sendo problemas.

Há, por exemplo, o caso do fotojornalista Rubén Espinosa que saiu de Veracruz buscando refúgio na Cidade do México devido às ameaças que havia recebido. Ele foi assassinado em agosto de 2015, sem ter recorrido ao mecanismo por desconfiança.

Também há o caso de Moisés Sánchez Cerezo, sequestrado em 2 de janeiro em sua casa em Veracruz, e cujo corpo foi encontrado 22 dias depois. A CIDH criticou o fato de que a Promotoria Especial para Delitos cometidos contra a Liberdade de Expressão (FEADLE), criada pelo mecanismo de proteção precisamente para investigar estes crimes, não tenha entrado no caso apesar dos “indícios” que demostram vínculo entre o assassinato e o exercício jornalístico.

“A Comissão vê com preocupação o fato de que a própria entidade investigativa, usando diferentes argumentos, coloque obstáculos a si mesma para assumir a investigação. Isso pode acabar afetando o resultado da investigação, em especial em relação à vinculação de autores intelectuais”, assinala o relatório.

Sobre o caso de Sánchez Cerezo, de fevereiro passado, uma juíza federal ordenou que a Procuradoria Geral da República investigasse seu assassinato por meio da FEADLE.

Além das falhas da FEADLE em assumir casos, a Comissão também criticou a falta de protocolos especiais para investigar crimes contra jornalistas que estabeleçam o trabalho jornalístico como primeira linha de investigação.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

Artigos Recentes