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Relator da liberdade de expressão da OEA se reúne em evento com ONGs para discutir concentração de meios

O Relator Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Edison Lanza, participou em uma conferencia em Bogotá, Colômbia, para dialogar com representantes de diferentes organizações internacionais preocupadas com a concentração de meios nas Américas.

O diálogo, feito durante a Conferência Internacional “Meios livres e independentes em sistemas midiáticos plurais e diversos”, convocada pela Relatoria Especial da CIDH e a Unesco, baseou-se no rascunho do relatório sobre diversidade, pluralismo e concentração de meios no hemisfério. O documento foi elaborado pela Relatoria e para ele se realizou uma consulta pública, dirigida tanto a sociedade civil como a Estados-membros da OEA.

A presença de monopólios ou oligopólios nos meios de comunicação foi uma preocupação para a Relatoria Especial desde sua criação, pelo impacto negativo que tem nas democracias, afirmou Lanza durante sua apresentação em Bogotá.

Nesse sentido, além de analisar a atual situação de cada país do hemisfério, a Relatoria busca criar uma série de padrões interamericanos que permita tanto a Estados como a sociedade civil saber como seria uma boa regulação nesta matéria.

“Não é uma má regulação per se, mas feita com outros interesses, está proibida porque gera discriminação por razões políticas”, disse Lanza ao recordar a recente decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) no caso do canal RCTV da Venezuela.

Lanza ressaltou que nesta decisão a Corte não condenou a existência de um marco regulatório para garantir o pluralismo, mas o fato de que ele foi utilizado por um Governo para fechar um meio por não estar de acordo com sua linha editorial. Acrescentou que é por esta razão que as regulações para prevenir a concentração de meios não podem se tornar mecanismos de censura indireta ou de discriminação.

Até omomento, a Relatoria encontrou duas tendências na América Latina e no Caribe no que diz respeito à concentração de meios: a existência de poucos grupos privados em países definidos como grandes e diversos, e uma preponderância de meios governamentais em outros países. Nestes últimos, os meios devem escolher entre continuar com sua missão vigilante dos governos ou renunciar a ela para garantir sua existência.

Gustavo Gómez, da ONG ​Observacom do Uruguai, destacou que é importante que o relatório faça referência à concentração de meios sem importar a tecnologia que utilizem. Para Gómez, a discussão sobre concentração se centra no espectro radioelétrico, mas esquece, por exemplo, da concentração de meios impressos, um problema de muitos países da região.

Também destacou que se deve incluir a concentração no ambiente digital, e não esquecer o tema dos conglomerados: donos de rádios, canais de televisão e meios impressos ao mesmo tempo.

Acrescentou que é necessário abordar o tema do pluralismo interno, ou seja, as obrigações dos meios de refletirem uma sociedade plural e diversa em seus programas.

Finalmente, para Gómez é importante olhar a relação dos meios com outros poderes. Por exemplo, com políticos como presidentes e senadores (que definem as leis), assim como com bancos, entre outros.

“É preciso aprofundar as medidas. Não se trata de pensar leis ideais ou modelos que possamos fazer entre todos porque não estamos falando de um país que vai ser criado”, concluiu Gómez. “Estamos falando de como desconcentrar, que é o principal problema da região. Não estamos falando em ideais, e quais são os aspectos que deveriam estar em uma lei, mas quais são as decisões políticas que devem ser tomadas para evitar os processos de concentração que já estão instalados em nossos países. Não só é o poder midiático, é o poder econômico e o poder político os que vão resistir a qualquer iniciativa que busque garantir a pluralidade e a diversidade”.

Por sua vez, Darío Ramírez, do escritório da Artigo 19 para o México e a América Central, observou que a maior preocupação é que a responsabilidade de fomentar esta diversidade e pluralismo está nas mãos dos Estados que em muitas ocasiões são os menos interessados em que isso ocorra.

Para Ramírez, o problema recai na vontade política inexistente, e na facultade dos governos para ‘comprar’ os espaços que vão criando.

Recordou o caso do México, onde por muito tempo se pediu uma terceira. Agora que ela finalmente existe, mantém “o mesmo corte editorial” das outras duas, assegurou.

“Então vão à CIDH e dizem ‘estamos abrindo, dando espaços, temos tantos meios’, mas ao final a linha editorial é comprada com a publicidade oficial”, afirmou Ramírez. “Me parece que dar essa capacidade e obrigação ao Estado para que existam mais vozes é um problema que temos que tentar resolver porque não está acontecendo”.

De acordo com Ramírez, o relatório apontar que a região mantém uma tendência de concentração é sinal de que algo está mal.

O representante de Repórteres Sem Fronteiras para a região, Emmanuel Colombié, apontou como um problema a falta de transparência e a falta de informação pública sobre os donos dos meios em todo o hemisfério.

Para Colombié, um exemplo observado no estudo realizado junto a Fecolper sobre concentração de meios na Colômbia é que três grupos concentram 57% da audiência.

Acrescentou que na região se vê uma concentração “mais perigosa”, que é a pública. Segundo o representante da RSF, em países como Cuba, Honduras, Venezuela e Equador os governos concentram a maioria dos meios de comunicação.

“Estes países também são os piores da América Latina para a liberdade de expressão e os mais perigosos para os jornalistas”, disse Colombié. “Ali está proibido todo tipo de imprensa independente e os jornalistas são limitados a ser meros transmissores sociais de suas mensagens. Aqui ser um jornalista fora do sistema oficial é ser um herói. Tentar dar uma notícia objetiva é uma pista de obstáculos, é por sua vida em perigo”.

O representante da Associação Internacional de Radiodifusão (AIR), José Luis Sacá – que era a voz dos meios privados – declarou que estes estão contra os monopólios, mas acrescentou que não acreditam que devam ser feitas leis exclusivas para sua regulação.

"Quando se fecha a RCTV, a desculpa do Governo é que isso permitiria a democratização dos meios de rádio e televisão, e a pluralidade das mensagens”, ressaltou Sacá. “Vemos os perigos quando tentam impor leis específicas para os meios de comunicação”.

Mencionou a sentença da Corte IDH sobre a necessidade que esta regulação não seja feita para castigar ou premiar uma linha editorial, o que requer um ente regulador independente do governo de turno.

Para Sacá deve-se seguir o exemplo de países onde as leis gerais de regulação do mercado serviram para impedir a concentração midiática, como Estados Unidos, onde se dissolveu uma aliança entre dois grandes empresas de comunicação seguindo as leis de concorrência.

Sem dúvida, este foi precisamente o ponto de maior debate entre os participantes da conferência: a necessidade ou não de leis exclusivas de regulação para os meios de comunicação.

O princípio 12 da Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão da CIDH, estabelece que não deveriam ser exclusivas.

Contudo, nem todos compartilharam o estipulado no evento. Para algumas pessoas, os meios não podem ser tratados como qualquer outro setor do mercado precisamente porque têm em suas mãos um direito humano que garante outros direitos humanos, a liberdade de expressão. Porém os que se opõem a esta ideia sustentam que com medidas exclusivas para eles, os Estados poderiam utilizá-las para atacar os meios mais críticos.

O debate está longe de terminar, mas na região pelo menos está acontecendo.

Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog Jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.

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