O veículo digital Efecto Cocuyo se preparou durante meses para as próximas eleições presidenciais na Venezuela.
Foram feitas reportagens especiais, entrevistas no YouTube com candidatos e especialistas, um chatbot que ajuda a verificar conteúdos virais, cursos sobre cobertura eleitoral e desinformação. Eles também participam em 10 diferentes alianças com meios dentro e fora do país.
Agora, a apenas dois dias de uma eleição que pode trazer mudanças drásticas para o país sul-americano, estão prontos.
“Estamos trabalhando para dar a melhor cobertura e nos preparando para um dia de mais de 24 horas”, disse à LatAm Journalism Review (LJR) Luz Mely Reyes, diretora e cofundadora do Efecto Cocuyo. “O anúncio do resultado pode ser complicado devido às expectativas que existem”.
A Venezuela realiza eleições presidenciais e, pela primeira vez em 25 anos, meios nacionais e internacionais falam sobre a possibilidade de uma transição de governo.
Para se prepararem para a longa jornada que os espera, os meios digitais venezuelanos tiveram que recorrer à colaboração com colegas dentro e fora do país, assim como a tecnologias inovadoras, para alcançar os eleitores e combater a desinformação e as restrições à imprensa.
“No passado, quando existiam as grandes redações, não precisávamos pular de um meio para outro para ter uma visão completa”, disse à LJR Carmen Riera, diretora do meio digital independente Runrun.es. “Os meios nativos digitais são todos muito pequenos. Por isso temos que nos aliar, para dar o nosso melhor e ter uma cobertura muito mais completa”.
Adrián González, diretor do Cazadores de Fake News, afirmou que a quantidade de desinformação que está sendo disseminada no contexto destas eleições não tem precedentes: “É algo extraordinário”.
“A cada três ou quatro horas surge um boato diferente que devemos conter, desmontar ou desmentir”, disse González à LJR.
Há alguns dias, o Cazadores de Fake News denunciou o uso de contas falsas publicando conteúdos de ódio e se passando por opositores. De acordo com a investigação, essa rede de contas estava vinculada ao ministro de Comunicação da Venezuela, Freddy Ñáñez.
A partir desta publicação, a organização noticiou uma tentativa coordenada de estigmatização ao seu trabalho de verificação. Os ataques partiram de mais de 20 contas falsas no X, e também de perfis reais.
A equipe do Cazadores de Fake News está colaborando com o Efecto Cocuyo e outros meios de comunicação nestas eleições com a intenção de unir forças para que nenhuma notícia falsa fique sem verificação. Os meios compartilham entre si as verificações para cobrir a maior quantidade de notícias falsas e, ao mesmo tempo, expandir o seu público.
O trabalho enfrentou desafios. O domínio web do Cazadores de Fake News foi bloqueado no país em 4 de julho, dia em que foi iniciada a campanha eleitoral para os pleitos presidenciais, segundo reportou a organização venezuelana de defesa dos direitos digitais VE sin Filtro.
Isso, em parte, os motivou a priorizar as publicações nas redes sociais em vez de em seu próprio site. Nos dias que antecedem a eleição, a equipe decidiu publicar as suas denúncias e os desmentidos de notícias falsas por meio de redes sociais, concentrando no site apenas o mais relevante.
“Queremos responder mais rapidamente, com maior agilidade e talvez não com tanta profundidade como normalmente fazemos”, explicou González. “Queremos que seja de forma oportuna, porque neste momento de nada adianta desmentir um boato dois dias depois. Temos que levar no máximo umas duas horas para publicar um desmentido”.
O Cazadores de Fake News não é o único portal bloqueado na Venezuela.
Meios como Efecto Cocuyo, Tal Cual, El Estímulo, Runrun.es e Analítica estão bloqueados pelas principais operadoras de internet do país, segundo o VE sin Filtro. Outros sites de verificação de fatos como Es Paja e o Observatório Venezuelano de Notícias Falsas, assim como os sites das organizações de liberdade de imprensa Espacio Público, o Instituto Prensa y Sociedad e até mesmo a própria VE sin Filtro, também estão bloqueados.
“Trata-se de uma grave investida contra o espaço cívico que compromete as condições e garantias para participar de forma livre e informada nas eleições”, afirmou o VE sin Filtro em seus relatórios.
A única forma de os usuários contornarem os bloqueios é por meio de VPNs (Redes Privadas Virtuais). No entanto, seu uso pode se tornar complicado para alguns usuários.
Por isso, os meios de comunicação independentes bloqueados estão incentivando o download do Notícias Sin Filtro, um aplicativo móvel criado pela organização Conexión Segura y Libre e lançado no final de junho deste ano.
O Notícias Sin Filtro utiliza tecnologias de VPNs para contornar a censura. Após baixar o aplicativo, os usuários podem acessar sites bloqueados sem ter que usar diretamente uma VPN.
Os usuários do Notícias Sin Filtro podem até mesmo ouvir a programas de rádio e podcasts afetados pela censura.
“É super fácil de usar, não requer criar usuário, nem ter senhas. Nada disso”, disse em um vídeo promocional Andres Azpurua, diretor executivo da organização Venezuela Inteligente, criadora do aplicativo. “No Notícias Sin Filtro estão os principais meios independentes do país em um só lugar e sem censura”.
Apesar da colaboração dentro do país e da tecnologia que funciona para driblar os bloqueios de sites, os jornalistas na Venezuela estão preocupados com um possível apagão informativo antes, durante e depois das eleições.
Por isso, alianças de meios nacionais e internacionais se uniram com a intenção de reproduzir informação real, oportuna e verificada, disse Riera, do Runrun.es.
Dentro do país, p Runrun.es estará trabalhando em parceria com a operação Venezuela Vota do El Pitazo, na qual participam mais de 70 jornalistas independentes, 20 membros do Programa de Formação de Novos Jornalistas e 20 cidadãos-jornalistas do veículo distribuídos em 96 municípios-chave da Venezuela.
Além disso, para dar mais visibilidade a notícias fora da capital, o Runrun.es está colaborando com os meios regionais Diario La Nación de Táchira,;Yaracuy al día; La Mañana de Falcón; El Impulso, de Barquisimeto; El Tiempo, de Puerto de la Cruz; e Correo del Caroní, de Ciudad Guayana.
A nível regional, há a aliança La Hora de Venezuela, liderada pela plataforma jornalística latino-americana Connectas. Meios participantes da região incluem El Espectador, da Colômbia; Aristegui Noticias, d; México; e La Prensa Gráfica, do Panamá, entre otros.
Como parte dessa aliança, os meios de comunicação fora da Venezuela estão publicando suas próprias matérias e, ao mesmo tempo, republicando informações dos meios venezuelanos. Essas são compartilhadas em plataformas de redes sociais utilizando a hashtag #LaHoraDeVenezuela com o objetivo de dar mais alcance a informações rigorosas sobre o que está acontecendo na campanha presidencial venezuelana.
“Com essa aliança, buscamos que esses meios sejam replicadores na América Latina das informações que estamos produzindo aqui dentro”, explicou Riera. “Se por acaso ocorrer um apagão informativo, eles poderão continuar divulgando a informação que nós não podemos”, acrescentou.