Três ex-oficiais militares salvadorenhos de alta patente foram condenados a 15 anos de prisão pelo assassinato de quatro jornalistas holandeses em 1982. O juiz também responsabilizou o governo de El Salvador pela demora da Justiça e ordenou que o Comandante das Forças Armadas se desculpasse com as vítimas em nome do Estado.
Panfletos distribuídos do lado de fora do tribunal exigem justiça para os quatro jornalistas holandeses assassinados (Foto: David Ramírez / Fundación Comunicándonos)
O ex-ministro da Defesa José Guillermo García, o ex-diretor da Polícia do Tesouro [um tipo de polícia de inteligência], Francisco Antonio Morán, e o ex-coronel Mario A. Reyes Mena, comandante da Quarta Brigada de Infantaria, foram considerados culpados de homicídio e perderam os seus direitos civis.
“A luta contra a impunidade foi longa, mas saímos vitoriosos. Os Países Baixos se sentem fortalecidos para continuar essa luta”, declarou Arjen van den Berg, embaixador do Reino dos Países Baixos na Costa Rica para a América Central, em declarações feitas a jornalistas que aguardavam do lado de fora do tribunal. O embaixador manifestou a sua alegria pelas famílias dos jornalistas, pois “elas podem finalmente encerrar um capítulo difícil de suas vidas”.
Jan Kuiper, Koos Koster, Joop Willemsen e Hans ter Laag faziam parte da emissora de televisão holandesa IKON e foram a El Salvador para produzir um documentário que mostrasse o contraste entre a vida em San Salvador e nas áreas rurais, onde ocorria o conflito entre as Forças Armadas do país e o grupo insurgente FMLN.
De acordo com o relatório da Comissão da Verdade, Koster, o jornalista que liderava a equipe, era visto pelas autoridades salvadorenhas como um apoiador da guerrilha da FMLN. Isso aconteceu após ele ter feito uma reportagem sobre os esquadrões da morte no país.
Por esse motivo, segundo a Comissão, a equipe de jornalistas foi seguida pela polícia de inteligência desde o momento em que chegou ao país. Finalmente, os policiais coordenaram uma emboscada realizada por forças estatais, na qual os quatro jornalistas foram mortos, junto com alguns guerrilheiros que serviam de guias para os repórteres enquanto estes eram conduzidos às áreas mais conflituosas, conclui o relatório.
Após 43 anos de impunidade, este é o primeiro crime contra a humanidade registrado no relatório da Comissão da Verdade das Nações Unidas sobre El Salvador que chegou a ser julgado – e que, agora, obtém uma sentença, segundo a Fundação Comunicándonos, que, junto com a Associação Salvadorenha de Direitos Humanos (Asdehu), representa as famílias dos jornalistas no país.
Oscar Pérez, da Fundación Comunicándonos, e o advogado Pedro Cruz falam com membros da imprensa do lado de fora do tribunal. (Foto: David Ramírez / Fundación Comunicándonos)
“Hoje, a verdade e a justiça estão do lado das vítimas, não dos culpados”, afirmou Óscar Antonio Pérez, diretor da fundação.
O julgamento, realizado em 3 de junho e fechado ao público, ocorreu no Centro Judicial de Chalatenango, sem a presença dos três agora condenados. García e Morán estão em prisão preventiva há dois anos, embora cumpram pena em um hospital, alegando problemas de saúde.
Pedro Cruz, da Asdehu e advogado do caso, acrescentou que a condenação possibilitará o pedido de extradição de Reyes Mena, que atualmente se encontra na Virgínia, Estados Unidos. “Não há nenhum obstáculo legal ou pretexto para sua extradição”, afirmou o advogado.
As famílias dos jornalistas também não estiveram presentes no julgamento, já que este foi remarcado e elas não puderam mais viajar para El Salvador.
“É uma alegria imensa; a verdade e a justiça prevaleceram em El Salvador. Estamos derrotando a impunidade, a impunidade do passado”, declarou Pérez.
“A justiça foi feita esta noite aqui em Chalatenango”, disse Cruz. O advogado explicou que a pena, solicitada pelo Ministério Público e concedida pelo juiz, foi a mínima, considerando o estado de saúde e a idade dos condenados.
Cruz acrescentou que a condenação ativará o pedido de extradição de Reyes Mena, que atualmente está na Virgínia. “Não há nenhum obstáculo legal ou pretexto para sua extradição”, reiterou o advogado.
Oscar Pérez fala com jornalistas do lado de fora do Centro Judicial de Chalatenango. (Foto: David Ramírez / Fundación Comunicándonos)
Nos Estados Unidos, a família de Jan Kuiper também está entrando com uma ação civil contra Reyes Mena.
Em declarações anteriores à LJR, por meio de seu advogado nos Estados Unidos, Gert Kuiper, irmão de Jan, disse que o objetivo desses processos não era obter sentenças longas, mas criar precedentes.
“Quando o processo criminal for finalmente consolidado em El Salvador, será possível construir jurisprudência para que mais de 200 casos de assassinatos relacionados à referida guerra possam ser trazidos à tona”, afirmou.