Por Giovana Sanchez
O Ministério da Justiça brasileiro começou a investigar a General Motors do Brasil após uma reportagem mostrar casos de explosões em carros. Uma nova empresa de mídia lançou seu site na Venezuela, oferecendo uma nova fonte de informação independente para os cidadãos daquele país. Na Argentina, uma organização de checagem de informação pode cobrar políticos e outras figuras públicas ao comparando as suas declarações com a realidade dos fatos.
Estas iniciativas poderiam não ter sido lançadas se não tivessem tido a ajuda do financiamento coletivo - ou crowdfunding. A ferramenta tem sido usada cada vez mais no mundo e tem permitido a viabilização de mais projetos jornalísticos, segundo uma pesquisa publicada em janeiro pelo Pew Research Center.
De acordo com os dados analisados pelo Pew, na plataforma Kickstarter, 17 projetos jornalísticos receberam aporte em 2009, número quase triplicado no ano seguinte, quando a plataforma teve 64 iniciativas bancadas pelo público. O aumento continuou, com 168 projetos financiados em 2014, e 173 nos nove primeiros meses de 2015.
Ainda de acordo com a pesquisa, o número de pessoas que apoiaram essas iniciativas também aumentou – de 792 em 2009 para 25,6 mil em 2015. A maioria dos projetos jornalísticos do período era independente (71%), sem ligação com uma empresa de mídia específica.
Na América Latina, projetos de mídia independente têm usado a estratégia de financiamento coletivo para obter apoio de leitores e conseguir realizar projetos específicos de reportagem.
Dos 111 projetos listados com a classificação ‘jornalismo’ no site brasileiro de crowdfunding Catarse, 57 foram completamente financiados – a maioria postada nos últimos dois anos.
Para Natalia Viana, codiretora da brasileira Agência Pública, o financiamento coletivo é uma estratégia “essencial”. O veículo fez a primeira campanha em 2013, e colocou os doadores no conselho editorial, ou seja, eles participaram da definição das pautas. A segunda campanha, em 2015, arrecadou mais dinheiro e está ainda publicando as reportagens financiadas.
“É um terreno que está crescendo no Brasil e é muito promissor. O crowdfunding tem a vantagem que não é uma ‘compra’ de um produto. É um apoio coletivo a uma causa - no nosso caso, o jornalismo investigativo”, disse ela em entrevista ao Centro Knight para o Jornalismo nas Américas.
“É uma campanha, mesmo, precisa engajar centenas de pessoas, fazer um planejamento meticuloso. A principal vantagem é que ela não é só uma estrategia de financiamento: é uma maneira de engajar pessoas na sua organização e com o jornalismo que você produz.”
Outro projeto que usou a ferramenta de financiamento coletivo é o Efecto Cucuyo. Criado pela jornalista Luz Mely Reyes para viabilizar o jornalismo independente na Venezuela, o Efecto Cucuyo realizou uma campanha no começo de 2015, juntando 35% do objetivo final em dólares.
Mas, com a valorização do dólar nos meses seguintes, o valor quase dobrou na moeda local. “O que deu certo foi a visibilidade da proposta nacional e internacionalmente. Também tivemos investimento de venezuelanos em outros países e aqui […] A conexão dos doadores com a causa também é muito importante. O custo da aprendizagem é que fizemos toda a campanha internamente, com o pouco conhecimento que tínhamos e, portanto, não empregamos todas as ferramentas que poderiam ter gerado maior impacto”, disse Luz Mely em entrevista ao Centro Knight.
Já os argentinos do projeto de checagem de informações Chequeado estão mais confortáveis com a estratégia de crowdfunding, depois de terem passado por três campanhas bem sucedidas. O grupo não depende do financiamento coletivo para se sustentar – eles contam com aportes de empresas, com cooperação internacional e vendem ainda notícias a veículos de comunicação.
“A estratégia é boa porque permite ser autônomo. E se alguém um dia para de lhe apoiar, não significa o fim do meio. Também o crowdfunding implica trabalho. Na Argentina não há muita cultura de apoio. Muitas vezes o resultado não é imediato. Implica uma estratégia de comunicação, contatos com aliados, etc”, explica Laura Zommer, diretora executiva em entrevista ao Centro Knight.
Conselhos para uma campanha de sucesso A Agência Pública listou em um texto publicado em 2014 os aprendizados com as campanhas de financiamento coletivo e dicas para ter o projeto bem sucedido. Uma delas é ser honesto e “transparente em relação a metas, intenções e uso do dinheiro.”
Laura Zommer recomenda que se defina claramente a mensagem a ser comunicada. “É preciso que fique claro o porquê de estarem pedindo dinheiro e é importante que haja transparência com os fundos, que mostrem a equipe e as pessoas que estão trabalhando. Uma outra recomendação é que não se imponham projetos hiperambiciosos, mas sim objetivos modestos que permitam o êxito.”
Luz Mely diz que é importante “investir na criação de uma narrativa que permita a possíveis doadores conhecer a história e as razões da iniciativa”. Depois, ela recomenda localizar um público chave, organizar uma carta ou vídeo de apresentação e buscar apoio não apenas financeiro. “Muito de nossa repercussão foi devido a colegas, amigos e pessoas que nem nos conheciam nos ajudaram a divulgar a proposta de maneira gratuita”.
Por fim, Luz Mely diz que “é preciso estar preparado para falar, contar, contatar e voltar a falar, contar e contatar.”
Nota do editor: Essa história foi publicada originalmente no blog de jornalismo nas Américas do Centro Knight, o predecessor do LatAm Journalism Review.