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5º Colóquio Iberoamericano de Jornalismo Digital debate desafios tecnólogicos nas redações

Pelo quinto ano consecutivo, jornalistas, executivos de mídia e pesquisadores universitários da América Latina, Espanha e Portugal se reuniram em Austin no domingo, dia 22 de abril, no Colóquio Iberoamericano de Jornalismo Digital, organizado pelo Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, após o Simpósio Internacional de Jornalismo Online.

Os desafios tecnológicos para adaptar as redações de meios tradicionais à era digital foram um dos temas mais importantes discutidos durante o colóquio. O subdiretor do jornal El Pais, da Espanha, e os jornalistas brasileiros Daniela Bertocchi, da Editora Abril, e Pedro Dória, de O Globo, explicaram os esforços de suas empresas para melhorar a integração das operações tradicionais com as plataformas digitais.

A importância das redes sociais nas áreas mais afetadas pela violência e a proliferação de blogs politicos no México; o jornalismo investigativo e sem fins de lucro no Peru; o grande apetite por treinamento em mídia digital entre jornalistas latino-americanos; a função social dos sites de notícias; e o uso de jornalismo de dados para forçar a transparência dos governos foram outros temas do colóquio.

O dia começou com a apresentação da pesquisa acadêmica de Daniela Bertocchi, jornalista da Editoria Abril e doutoranda da Universidade de São Paulo (USP), e sua professora Dra. Elizabeth Saad Corrêa. O trabalho é sobre a plataforma de integração de conteúdo Alexandria, que está sendo implantada na Abril, a maior editora de revistas da América Latina.

Para Bertocchi e Saad, o maior desafio é reunir todos os diferentes sistemas das mais de 50 revistas da editora numa única plataforma "inteligente", baseada em princípios de "web semântica". Para que o sistema funcione, é preciso que o jornalista "marque" cada conteúdo que produz, mas isso geralmente esbarra na falta de uma cultura jornalística para compreender o software e exercer essa função.

Borja Echevarria, do jornal espanhol El Pais, falou sobre a necessidade de integração no trabalho entre jornalistas e técnicos. Ele contou sua experiência no projeto do inovador site Soitu, que durou apenas dois anos por causa da falta de investimento, mas foi bem sucedido, alcançando um milhão de usuários em apenas um ano e ganhando prêmios internacionais.

Echevarria e outros da equipe de Soitu, liderada por Gumersindo Lafuente, foram contratados pelo El Pais. "Nós encontramos uma redação dividida" (entre impresso e online), disse Echevarria, ao explicar a criação de um sistema de integração "radical", que mudou o design, a organização interna e o CMS (sistema gerenciador de conteúdo) do jornal. "Estou muito surpreso que não tenha sido traumático para a redação", disse Echevarria, "mas a crise ajuda muito - o nível de resistência lá dentro é muito pequeno". O jornalista observou que o jornalismo impresso se tornou apenas mais uma saída para o jornal, e que é preciso desmistificar esse meio.

Echevarria falou ainda sobre o interesse do El Pais na América Latina, contando que já existe uma pequena redação do jornal na Cidade do México, que cuida de toda a edição da Internet quando é madrugada na Espanha, aproveitando a diferença do fuso horário. Este é o primeiro passo de um plano para o jornal se estender pela América Latina. Os jornalistas foram enviados da sede do jornal em Madri para a Cidade do México. "O El Pais tem essa vocação global", disse Echevarria.

O presidente do jornal Al Día da Filadélfia, Hernán Guaracao, chamou a atenção para o crescimento da comunidade hispânica nos Estados Unidos e sua relevância cultural, social e política. Ele acha que por causa desse fenômeno demográfico, o centro do universo hispânico global será nos Estados Unidos.

"Nós estamos nos tornando uma nação bilíngue, estamos vivendo uma integração total", disse Guaracao. Os hispânicos movimentam nos EUA uma economia de um trilhão de dólares e possuem meios de comunicação que movimentam seis bilhões de dólares em publicidade -- o que é maior do que a publicidade do México, maior país hispânico da América Latina. Ele falou também sobre o Prêmio Nacional Varela de Jornalismo em questões latinas nos EUA, que criou para tentar promover maior reconhecimento dos latinos no país.

O colóquio seguiu com uma discussão sobre o jornalismo digital Mexicano. A professora da Universidade Iberoamericana Gabriela Warkentin falou sobre a proliferacão de sites políticos no México, tanto a nível local como nacional, neste ano de eleição presidencial. "É muito impressionante a quantidade de portais de análise e informação na cobertura política", disse Warkentin.

Alejandro Cardenas é jornalista de um destes novos sites, Aristegui Notícias, fundado há apenas uma semana pela jornalista Carmen Aristegui. Ele explicou que o portal não deseja competir diretamente com os jornais tradicionais, mas lançar um novo estilo de cobertura jornalística, capitalizando a experiência e a fama de Carmen Aristegui.

Jornalistas mexicanos falaram das dificuldades que estão enfrentando em várias partes do país, mas principalmente na região da fronteira com os Estados Unidos, onde muitos repórteres foram vítimas da onda de violência gerada pela guerra ao tráfico de drogas. Os jornais estão censurados pelos traficantes em certas áreas. Em Nuevo Laredo, por exemplo, quando houve um grande tiroteio nas ruas da cidade recentemente, a imprensa ameaçada não pode informar. Quem denunciou a situação foi o consulado dos EUA, que em seu site tentava alertar os cidadãos americanos, mas acabou informando também os mexicanos.

Os jornalistas mexicanos falaram também da importância das redes sociais, que são usadas frequentemente por cidadãos (e por jornalistas anônimos), que substituem a imprensa silenciada pelo terrorismo praticado pelos traficantes de drogas, e informam a cidade. Um jornalista disse que a participação em redes sociais diminuiu em Novo Laredo depois de assassinatos de usuários de redes sociais e amaeaças dos traficantes. "Toda a comunidade está seqüestrada, não é mais um problema somente de jornalistas", disse ele.

Ainda sobre jornalismo no México, Margarita Torres apresentou a organização Periodistas de a Pie, que tem como objetivo promover treinamento de jornalistas em várias áreas, inclusive em questões de segurança e promoção dos direitos humanos. Neste ano, a organização ofereceu dois cursos em parceria com Centro Knight e o Instituto Internacional de Seguranca de Jornalistas (INSI).

O jornalista brasileiro Gilberto Dimenstein, fundador do Catraca Livre, deu detalhes sobre o inovador modelo de negócios adotado por seu site. O Catraca Livre produz conteúdo que seus patrocinadores podem utilizar em suas redes sociais, mas mantém sua independência editorial e a fidelidade à sua missão social. "Não tem dinheiro em publicidade", disse Dimenstein, ao explicar seu modelo. "Temos que buscar dinheiro com a cabeça de um capitalista e o coração de uma ONG", disse ele.

Pedro Doria, editor de plataformas digitais do jornal O Globo, explicou a integração impresso-online em sua redação. Vencidas as resistências iniciais, o processo começou com uma integração hierárquica, com os principais editores do jornal começando a atuar em todas as plataformas, e depois chegou a todos os jornalistas da empresa. Até uma determinada hora do dia, a prioridade é para plataformas digitais, e mais tarde o foco se volta para o papel.

Angelica Peralta Ramos, do jornal argentino La Nación, apresentou o que ela chamou de "um novo tipo de jornalismo, o jornalismo de dados". Ela mostrou exemplos de criação de sofisticadas bases de dados que seu jornal tem feito, facilitando a transparência da informação da administração pública na Argentina, apesar de o país não ter ainda uma lei de acesso.

O colóquio terminou com a jornalista peruana Cindy Villegas, do ClasesdePeriodismo.com, um site com informação útil para jornalistas, e do diário Peru21. Ela descreveu o ambiente de jornalismo online no Peru, destacando não só a imprensa tradicional como os blogs e sites independentes, citando IDL Reporteros, completamente dedicado ao jornalismo investigativo e sem fins de lucro. Ela disse que vários casos de investigações exclusivas de IDL Reporteros têm depois ganhado destaque na mídia tradicional. Outro fênomeno peruano comentado foi o La Mula, que começou como uma plataforma para blogs e hoje faz jornalismo investigativo e produz programas em vídeo ao vivo pela internet.

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